Todo produto agrícola, mesmo o pé de feijão crescido num copinho de plástico com algodão molhado, traz em si as características de seu ambiente. Mas algumas condições geográficas e tradições regionais proporcionam qualidade superior.

Nesses casos, os produtores investem no reconhecimento oficial da procedência (conhecido no mercado como Indicação Geográfica), a fim de poder cobrar pela exclusividade.

No caso do arroz brasileiro, o reconhecimento de um produto cultivado em condições especiais aconteceu. O retorno, até agora, veio com reconhecimento em alguns mercados. O financeiro, ainda não.

Nas gôndolas de supermercado, o único arroz nacional com selo de Denominação de Origem é o Palmares Gold DO. O preço está equivalente ao de outras linhas de produtos da marca.

“A gente busca uma valorização de 10% a 15%, mas, dentro de um mercado sempre acirrado, nem sempre se consegue”, afirma Virgilio Ruschel Braz, diretor executivo da Associação dos Produtores de Arroz do Litoral Norte Gaúcho (Aproarroz) e diretor administrativo da Cooperativa Arrozeira Palmares.

“O grande resultado desse trabalho hoje é na fidelização do consumidor. Na parte financeira, ainda não se conseguiu grande retorno.”

O arroz produzido no norte do Litoral Gaúcho é valorizado, diz Braz, mas independentemente do selo. “Estamos vendendo a saca de 50 kg in natura por R$ 130, enquanto a média do estado está em R$ 120”.

Além de esperar pela recuperação do valor do arroz, a Cooperativa Palmares procura projeção internacional para o seu produto com Denominação de Origem.

“A cooperativa tem trabalhado com prospecção de países. Nos aproximamos do Peru, que é um mercado exigente, e estamos buscando alguma negociação em Portugal”, afirma Braz.

Ter a fidelidade do consumidor, mas sem conseguir converter a preferência em um acréscimo de preço, é um retorno modesto para um empenho que começou em 2005.

Naquele ano, a Aproarroz, em parceria com Embrapa e UFRGS, desenvolveu um trabalho de padronização de processos produtivos e reconhecimento de condições ambientais. Em 2010, obteve no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) o registro da denominação Litoral Norte Gaúcho.

A Denominação de Origem é dada ao arroz dos tipos Pampa e Pampeira cultivado em uma área de 130 quilômetros quadrados, no Rio Grande do Sul, entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico.

“Essa faixa de terra tem umidade constante e, graças aos ventos, baixa amplitude térmica. São as condições ideais para o enchimento do grão de arroz”, conta.

Segundo Braz, o arroz com Denominação de Origem tem grãos mais brancos, menos perda no beneficiamento e menos falhas.

“Conseguimos 66% de grãos inteiros, enquanto as demais regiões do estado e o Brasil, como um todo, trabalha com uma taxa de 62%”, afirmou. “Ao cozinhar, você vê que ele cresce mais na panela e tem outros atributos de sabor”.

Cultivar nos tais 130 quilômetros quadrados do Litoral Gaúcho é ponto de partida para receber o selo, mas não basta. O produtor precisa ser associado à Aproarroz e seguir padrões de preparo da terra, cultivo, seleção de grãos (deixando fora os manchados, quebrados ou menos translúcidos) e repouso de pelo menos seis meses.

O Brasil tem 118 Indicações Geográficas nacionais registradas no INPI: 90 delas são Indicações de Procedência (relacionadas à tradição de uma região) e 28 Denominações de Origem (mais específicas, ligadas a uma área geográfica).

Segundo o Sebrae, um selo desses pode valorizar o produto de uma pequena empresa em até 300%. O número de registros em 2023 (109) foi 60% maior do que em 2019.

O grande exemplo de sucesso das Indicações Geográficas é a Europa. Oficializados em 1992, hoje esses selos acrescentam 75 bilhões de euros em vendas, por ano, aos produtos que os estampam.

Segundo a Comissão Europeia, os mais de 3,2 mil artigos reconhecidos conseguem cobrar um valor adicional médio de 2,85x (no caso de vinhos) ou 1,5x (alimentos em geral).