Sorocaba (SP) - Jardins bem cuidados e o logotipo dos seis grupos controladores na parede são as evidências “japonesas” para quem chega a sede da fabricante de defensivos agrícolas Ihara, em Sorocaba, no interior de São Paulo.
O AgFeed participou de uma visita às principais áreas da indústria, incluindo um centro de pesquisas com trabalhos em campo, para depois conversar, com exclusividade, com o diretor executivo da Ihara, André Nannetti, sobre os planos da companhia.
“Já temos níveis menores de estoque, com cenário mais positivo para 2024/2025, acredito que os preços devem se manter por um período mais estáveis e já pode haver alguma recuperação”, avaliou o executivo.
André Nannetti se refere à esperada retomada no setor de defensivos agrícolas, que vem sofrendo uma retração desde o ano passado. Ele lembra que os preços no setor tiveram queda de 30% em dólares. “Um mercado que era de US$ 20 bilhões caiu para US$ 15 bilhões”, ressaltou.
Foi o cenário pós-pandemia, período de pânico do agricultor, altos estoques nas industrias e distribuidores, que levou a queda de preço. “Foi um medo de falta de produto, o que não ocorreu”.
A boa notícia é que, no caso da Ihara, que hoje já está em oitavo lugar do ranking entre as maiores indústrias de defensivos, a situação já começa a melhorar.
“Estamos muito próximos do nível normal (de estoques) para o nosso giro, enquanto no ano passado tínhamos um estoque bastante elevado”, afirmou o diretor. Foi o maior estoque dos últimos anos, ele admite, mas que já volta à normalidade.
“O agricultor vai continuar plantando e investindo, mas talvez um pouco menos, devido aos preços de soja e milho, que não estão nos níveis que ele gostaria. Mas a partir da safra que vem, acredito em uma retomada, afinal o mundo demanda proteína”, disse Nannetti.
Neste cenário, a Ihara espera que o faturamento de US$ 800 milhões de 2023, este ano possa registrar aumento de “dois dígitos”, na visão do executivo. Porém, ainda não voltará aos US$ 1,2 bilhão registrados em 2022.
“Acredito que vamos crescer em receita, não pelo valor dos produtos e sim por aumento de volume e participação de mercado. Temos muitos lançamentos e inovações e estamos avançando numa curva ascendente nesses produtos, com mais inovações pra lançar este ano”, ressaltou.
Um dos produtos bastante consumidos na agricultura brasileira, que faz parte do portfólio da Ihara, o glifosato, caiu de US$ 12 na pandemia, para US$ 3, no ano passado. Portanto, mesmo que o volume de vendas aumente, o patamar de preços ainda é obstáculo para as empresas.
Um desafio este ano para as empresas é a logística, já que o ritmo de venda de insumos nos primeiros meses do ano foi o mais lento da história.
André Nannetti disse ao AgFeed que desde o fim de maio houve uma aceleração nos pedidos, principalmente com a leve melhora, impulsionada pela alta do dólar, nos preços de algumas commodities.
“Alguns itens específicos já começam a ter falta e uma certa dificuldade logística. O produtor não estava motivado a tomar decisão. Agora está tomando muito em cima da safra e, para alguns produtos, já temos dificuldade de atender em espaço curto, devido ao período de importação, formulação e entrega ao agricultor”, contou ele. Estão na lista destes produtos os herbicidas usados na soja, principalmente.
Nova planta para atender pastagens
Os controladores da Ihara são Nippon Soda, Mitsubishi Corporation, Kumiai Chemical, Mitsui Chemicals Crop, Nissan Chemical e Sumitomo Corporation. Já foram 7 japoneses, agora são 6, já que, recentemente, a Sumitomo Chemical, por decisões estratégicas, decidiu sair do negócio.
O crescimento da Ihara nos últimos anos foi suportado não apenas pelo bom momento do mercado, mas pela disposição em investir, expandindo os negócios no Brasil.
Em 2023, por exemplo, foram investidos R$ 180 milhões, englobando expansões de capacidade na fábrica – hoje todas as linhas de produtos da Ihara ficam na unidade de Sorocaba, que tem mais de 200 hectares – e aquisição de áreas para construir centros de pesquisa, no Paraná e Mato Grosso.
A empresa prevê investir em 2024 um total de R$ 90 milhões, principalmente em pesquisa e desenvolvimento. Nesse montante, também estão R$ 20 milhões aplicados na construção de uma planta de formulação especializada em herbicidas usados no cultivo de pastagens.
Com a tendência de conversão crescente de pastagens degradadas, como política alternativa à abertura de novas áreas, a Ihara também ficou atenta a esse filão de mercado, em que passou a atuar há apenas dois anos. “Agora temos uma equipe dedicada para isso”.
A planta acaba de ficar pronta, dentro do complexo de Sorocaba, e começa a produzir as formulações ainda este ano, já para comercialização de produtos na safra 2024/2025.
A capacidade instalada, que foi ampliada recentemente, na opinião de Nannetti é suficiente para o crescimento por até cinco anos, apenas com ajustes pontuais, se necessário.
Enquanto isso, André Nannetti admitiu ao AgFeed que tem dedicado um certo tempo para avaliar possíveis aquisições.
“Estamos bastante atentos e avaliando algumas empresas”, afirmou. Ele ressalta que a origem japonesa reforça a característica da empresa de não perder o foco em momentos de turbulência.
“Se olhar para o mercado, vai ver que a Ihara é a empresa que tem a menor mudança de rumo por uma turbulência, tanto para expandir quanto pra retrair, estamos sempre mais conservadores e olhando o longo prazo”.
Entre as áreas interesse, inclusive para parcerias, estão as tendências tecnológicas na agricultura, como uso de inteligência artificial e drones, por exemplo. A Ihara é membro fundador da plataforma global Plug and Play no Brasil e diz que segue avaliando parcerias com agtechs.
Foco em inovação (e biológicos)
Uma das características marcantes da Ihara é o foco no desenvolvimento de novas soluções e tecnologias. Por esse motivo investiu em centros de pesquisa no Paraná e Mato Grosso.
“Para obter registro de novos produtos no Brasil é necessário testar em três biomas. Dessa forma, conseguimos acelerar o desenvolvimento e chegar com a solução mais rápida para o agricultor”, explica.
Para 2024, a empresa está lançando sete novos produtos, um a mais que no ano passado. Na lista está, por exemplo, um herbicida seletivo para o milho, chamado Apice.
“É uma cultura importante para nós, uma molécula nova, uma inovação que estamos trazendo pro mercado, para controlar as plantas daninhas na pós-emergência, tanto folha larga quanto estreita com grande seletividade ao milho”, detalhou o diretor, ressaltando que com isso espera avançar em market share.
Ainda este ano será lançado também um produto para a principal doença da maçã. “Este está em fase final de registro, será lançado no segundo semestre”.
A diversificação de culturas é outra característica do grupo. Seguindo a tradição japonesa, a companhia dá importância significativa ao chamado “HF”, segmento de hortaliças e frutas.
Ainda assim, Nannetti admite que as quatro principais culturas – soja, milho, algodão e cana – representam 75% do mercado de defensivos e nos negócios da empresa não é diferente.
Para 2024/2025, a Ihara espera que haja um crescimento de até 3% na área plantada com soja, o que seguirá mantendo a cultura como líder para o setor. “O ritmo de crescimento da soja diminuiu, mas ela segue crescendo e mesmo que não avance em área, cresce na adoção de tecnologia”.
O mercado de biológicos é outra aposta da Ihara. Por enquanto a empresa tem apenas dois produtos em comercialização, mas vem investindo em laboratórios próprios e parcerias. “Temos 8 projetos de biológicos para lançar nos próximos anos”, contou o executivo.
Ele diz que a Ihara iniciou o trabalho com biológicos há 10 anos e que não avançou mais rápido porque prefere desenvolver suas próprias soluções, que representem uma inovação no mercado.
O diretor informou que um produto próprio já está sendo submetido aos órgãos reguladores e que outros estão por vir. “É vertente estratégica nossa. Não acreditamos que químicos e biológicos sejam antagônicos”, disse.
Nannetti avalia que o mercado de biológicos, atualmente, represente 3% do total dos agroquímicos. “Acreditamos que esse mercado no Brasil chegará a 10% ou 15% ao longo de 10 anos. Não acreditamos que vai dominar, como outras companhias dizem”. Ele diz que, na Ihara, o objetivo é buscar essa mesma representatividade ao longo dos anos.
Na área de sustentabilidade, a empresa diz que uma de suas prioridades tem sido trazer ao mercado moléculas que causem menor impacto ambiental, substituindo as já existentes. Também optou por ter uma fábrica própria de embalagens, dentro do complexo de Sorocaba, onde utiliza 75% de material reciclado.
Mais market share, com finanças em dia
Com todas as estratégias que mencionou, André Nannetti disse ao AgFeed que a Ihara conta atualmente com 7% de market share, mas tem objetivo de alcançar 10% até a safra 2026/2027
“Estamos na oitava posição, mas ficamos cada vez mais próximo do grupo das maiores”, ressaltou. Para isso, além da ampliação constante do portfólio, confia no perfil financeiro mais conservador, que vem garantindo bons frutos, mesmo em períodos desafiadores como agora.
A empresa já ganhou mais de uma vez premiações que definem “melhores do agronegócio” a partir de índices financeiros.
Por isso, Nannetti garante que, apesar das recuperações judiciais preocuparem o setor como um todo, os critérios “bastante rígidos” de crédito, na Ihara, ajudam nessa hora.
Ele afirmou que, para a companhia, a opção de emitir títulos ou fundos, como CRAs e Fiagros, até hoje não fez sentido. “Como temos uma solidez financeira, conseguimos crédito bastante competitivo, nem todas empresas têm esse privilégio”, afirmou.
A Ihara diz que faz 30% de suas vendas de forma direta, mantém cerca de 30% via cooperativas e só o restante, 40%, seria por meio de revendas, mas sem atuar com as grandes plataformas do mercado, que têm sido mais afetadas pelos problemas de inadimplência.