Os últimos meses foram de incomum intensidade na sede da Grano Alimentos, empresa com sede em Serafina Correia, município da Serra Gaúcha.
Desde o início do ano, a companhia especializada na produção de alimentos vegetais congelados atravessou duas diferentes auditorias. E, quando elas estavam em seu final, ainda acompanhou de perto o sofrimento de muitos de seus fornecedores em função da catástrofe climática que abalou todo o Rio Grande do Sul nas últimas semanas.
“Quase toda a nossa cadeia foi, de certa forma, afetadac pelas chuvas”, afirma Michele Lopes do Nascimento, diretora de Sustentabilidade da empresa. “As perdas variam muito, a maioria em termos de produtividade, mas para alguns foram lotes inteiros levados pela enxurrada”.
O fim de junho, entretanto, marca um período de volta da normalidade e das boas notícias por lá. Aprovada em ambos os processos de verificação por que passou – um do mercado financeiro, outro de uma empresa especializada na verificação de práticas de sustentabilidade – a Grano completou um processo de captação de recursos que marca sua estreia no mercado de capitais.
Foram R$ 70 milhões levantados com a emissão de um CRA Social, que traz em seu escopo, além da capacidade financeira de honrar com os recebíveis negociados, o compromisso de que os recursos serão utilizados em investimentos em práticas sustentáveis.
No caso da Grano, eles servirão para fomentar a produção de cerca de 120 famílias que fornecem vegetais para processamento pela companhia.
“Fizemos um levantamento e verificamos que 93% de nossos fornecedores se enquadram como agricultura familiar”, diz Michele. “Isso abriu as portas para que nossa operação fosse classificada como social”.
Assim, mesmo que indiretamente e não programado para isso, o efeito social da captação será até mais relevante que o previsto. Se inicialmente o capital serviria para reforçar o apoio em assistência técnica aos fornecedores, agora ajudará também a custear ações de auxílio aos produtores, como a postergação de dívidas e um apoio para um reforço de plantio no segundo semestre, como forma de compensar o que foi perdido no primeiro.
O momento delicado não apagou, na empresa, a sensação de que a operação foi mais um marco na trajetória construída desde a sua fundação, no ano 2000, pelo ex-contador da Perdigão Edi Luiz Deitos.
Em 2015, o controle da companhia foi adquirido pelo fundo americano de private equity Arlon Group e, desde então, vem crescendo em ritmo acelerado. Segundo Wilrobson Bassiano, CFO da companhia, a média anual de elevação de receita chega aos de 30%. Em 2023, a Grano faturou R$ 350 milhões.
Coordenada pelo Itaú BBA, a emissão com o selo social permitiu à companhia obter recursos a um custo inferior à média do mercado. O CFO estima que essa classificação resultou em uma redução de 1,5 ponto percentual nas taxas, se comparadas a uma emissão regular.
“Essa operação coroa o nosso trabalho e demonstra como uma empresa de porte médio pode acessar com sucesso o mercado de capitais”, afirma Bassiano. Segundo ele, a companhia possui 42% de participação no mercado nacional de vegetais congelados.
Toda a produção vem de uma cadeia de fornecedores localizados a um raio de 350 quilômetros da fábrica da empresa. A distribuição é feita a partir de uma base em Farroupilha, no RS, e outra em São Paulo.
“Somos os maiores compradores de brócolis do Brasil”, afirma Michele, referindo-se ao produto que é carro-chefe da empresa, ao lado da couve-flor – os dois produtos representam cerca de 50% das receitas. Hoje, as lavouras que fornecem à empresa ocupam, segundo ele, uma área total de 2,5 mil hectares.
O modelo de produção nessas culturas é semi-integrado. A Grano fornece mudas para os produtores e faz todo o acompanhamento técnico, até que esse produto seja colhido.
A expansão tem sido feita de forma orgânica, com ampliação na própria planta, que teve uma segunda linha inaugurada durante a pandemia. Nos últimos dois anos, entretanto, a Grano fez duas aquisições, das empresas paulistas Mr. Veggy e Gerônimo, que diversificaram sua atuação para a área de produtos plant based.
“É como se fossem uma startup”, afirma Bassiano sobre as empresas adquiridas, que hoje representam cerca de 10% do faturamento da Grano.