A primeira fábrica da Tello, indústria de fertilizantes organominerais criada há pouco mais de dois meses por grandes grupos do agro como Amaggi, Coopercitrus e Tecnobeef, ainda não saiu do papel.

Localizada no município de Altair, no interior de São Paulo, receberá investimentos de R$ 120 milhões e deverá ter as obras iniciadas nos próximos dias, assim que a companhia obtiver as licenças ambientais necessárias.

A expansão do empreendimento, entretanto, já está definida. Uma segunda planta está prevista para ser erguida em Diamantino, no Mato Grosso. E terá como parceiro outro grande nome da agropecuária nacional: o Grupo Locks, com sede em Cuiabá.

O acordo está firmado desde antes do anúncio da criação da Tello, mas ainda não havia sido revelado pelos cinco sócios da companhia – além das três empresas, também participam a Viola Participações, do ex-CEO da UPL Carlos Pellicer, que hoje comanda a Tello, e a Souza e Lucas Participações, da mesma família que controla a empresa de fertilizantes AgroCP.

A intenção do grupo é replicar em Diamantino o mesmo modelo idealizado para o interior de São Paulo, onde a primeira fábrica – que terá capacidade de produção de 200 mil toneladas de fertilizantes por ano – será instalada próxima ao megaconfinamento do Grupo Campanelli, controlador da Tecnobeef, que fornecerá seus resíduos como matéria-prima para a indústria.

No Mato Grosso, os resíduos virão de um novo confinamento que está sendo instalado pelo Grupo Locks. “Uma fábrica de briofertilizantes sem matéria orgânica é uma indústria sem lastro”, afirma Victor Campanelli, sócio do grupo Campanelli, ao AgFeed.

“A produção do Locks vai lastrear a fábrica de Diamantino, assim como a da Campanelli fará aqui em São Paulo”, diz.

Os planos da Tello são ambiciosos. No anúncio da criação da companhia, em abril passado, os sócios apontaram que pretendem atingir a marca de R$ 500 milhões em receita em dois anos.

É esse o prazo estimado agora por Campanelli para a operação plena da primeira fábrica. “Estamos com pá e cimento na mão, apenas esperando a aprovação da licença ambiental”, afirma.

Segundo Campanelli, só a partir da conclusão da primeira planta é que a Tello passará a trabalhar com o projeto da segunda. Assim, em um primeiro momento, a companhia focará seus esforços comerciais também nos mercados mais próximos de Altair.

Enquanto a primeira fábrica estiver em construção, a produção da Tello virá da unidade da AgroCP em Três Pontas, Minas Gerais.

“A nossa estratégia foi começar a vender desde já, sem esperar a fábrica ficar pronta para, então, começar do zero”, afirma. “A AgroCP já tem know how, competência para a produção de organominerais. Nossa fábrica, inclusive, será uma réplica da que eles têm em Três Pontas”.

Dessa forma, a Tello aproveita ao máximo a complementaridade entre os sócios. Se Campanelli entra com a matéria-prima, a AgroCP com a tecnologia de produção, Pellicer usará sua experiência executiva na construção de negócios e Coopercitrus e Amaggi com a capacidade de acesso a mercados.

Com mais de 40 mil associados, a cooperativa paulista será o principal canal de distribuição da companhia. Segundo Campanelli, através dela a Tello já comercializou, em dois meses, cerca de 8 mil toneladas de fertilizantes.

Nessa primeira fase, os alvos prioritários são os produtores de café, cana e laranja no centro sul do País. “A gente estudou bastante esse mercado”, afirma. “A cultura que mais adota hoje organomineral é o café, já faz parte da caixinha de ferramentas do cafeicultor”.

Na cana-de-açúcar, ele diz, a curva de adoção é “bem crescente”, com muitas usinas já usando a vinhaça e a torta de filtro. “A turma sabe do benefício do orgânico em terra em terras de baixa fertilidade”.

E na laranja, Campanelli acredita que o potencial existe, mas há mais trabalho para convencer os produtores a utilizarem os produtos.

Rumo ao Centro-Oeste

Já as culturas de grãos, no Centro-Oeste, têm níveis de adoção baixo, mas que podem mudar a partir do momento em que grandes grupos como o Amaggi e o Locks apresentarem bons resultados com o uso de biofertilizantes.

As duas empresas dividem a mesma origem. O Grupo Locks foi fundado em 2006 por Samuel Maggi Locks e seu pai, Itamar Locks, genro de André Maggi, o criador da Amaggi.

Casado com Vera, uma das quatro irmãs do ex-governador e ex-ministro Blairo Maggi, Itamar foi, por muitos anos, o braço direito de André Maggi e presidiu a divisão Agro do grupo Amaggi.

Ele iniciou seu negócio próprio cultivando pouco mais de 1,4 mil hectares de soja no município de Sapezal, no Mato Grosso, o mesmo onde a Amaggi nasceu.

Foi Samuel Locks, entretanto, quem deu impulso e expandiu o negócio, que hoje soma seis propriedades no estado – além de Sapezal (MT) e Diamantino, produz em Nortelândia, Cuiabá e Confresa – e uma em Tocantins.

No total, o Locks cultiva hoje 112 mil hectares, a grande maioria (62 mil hectares) com soja, 20 mil com milho e 24 mil com algodão. Formado em Agronomia e com MBS em gestão estratégica, Samuel foi também o responsável pela introdução da pecuária na empresa, em ciclo completo e com modelo semi-intensivo, que combina integração com lavoura com a terminação em confinamento.

O primeiro confinamento dos Locks foi montado na Fazenda Globo, em Sapezal, onde 3,3 mil hectares são reservados a pastagens. Com capacidade para 12 mil bovinos, a instalação permitiu a Samuel dar o próximo passo em seu projeto de tornar a propriedade em um modelo de práticas sustentáveis.

Assim, o grupo Locks já opera, em Sapezal, projeto semelhante, embora em menor escala, ao que a Tello planeja montar em Diamantino, tendo a Locks como fornecedora de matéria prima.

Na fazenda Globo, os resíduos da pecuária são processados para produção de 11 mil toneladas de biofertilizantes, suficientes para adubar mais de 17 mil hectares nas lavouras próprias de soja e algodão. Com isso, conseguiu, segundo o site da empresa, consumior menos 4 mil toneladas de fertilizantes químicos.

Em 2022, a operação integrada da Globo foi um dos fatores ressaltados pelo fundo Agri3, reconhecido por investimentos em projetos de sustentabilidade, a apoiar um financiamento verde de US$ 20 milhões do Rabobank ao grupo Locks, destinado a investimentos na transição da empresa para modelos de agricultura regenerativa.

No mesmo ano, a fazenda esteve entre as primeiras a ser certificada para receber créditos de couro sustentável em um projeto piloto liderado pela Textile Exchange, entidade que reúne alguma das principais grifes de moda do mundo, e pela Produzindo Certo, empresa goiana especializada na estruturação de projetos de agricultura regenerativa.

O novo confinamento, em Diamantino, deve ser maior que o de Sapezal, mas os detalhes são mantidos em reserva pelo grupo. Reservado, Samuel Locks não costuma dar entrevistas – procurado pelo AgFeed, ele não quis comentar o projeto.