Nas últimas semanas a agenda de Denis Arroyo, CEO da Grunner, esteve especialmente abarrotada. Boa parte dela foi preenchida com a preparação e, depois, a presença da empresa na Agrishow, maior evento do setor de máquinas agrícolas do País e palco dos principais lançamentos da marca.
Outra parte considerável foi tomada por reuniões e apresentações para o mercado financeiro. Seja na sede da empresa, em Lençois Paulista, na região Centro-Oeste do Estado de São Paulo, seja em bancos de investimento na Faria Lima, na capital do Estado, ele se desdobrou para atender a uma intensa agenda reuniões.
“Todo dia tem alguém querendo conhecer a Grunner, entender o que fazemos e por que estamos crescendo tanto”, contou Arroyo ao AgFeed.
Ao longo dos últimos meses, ele participou de dois road shows, que envolveram pelo menos 15 diferentes instituições financeiras.
As negociações avançaram com seis delas e um dos bancos chegou a acenar com R$ 60 milhões.
A expectativa da Grunner é captar, este ano, R$ 100 milhões no mercado de capitais, segundo Arroyo, que não detalhou, porém, qual o instrumento a ser utilizado.
A expectativa na empresa é anunciar algo nesse sentido já nas próximas semanas, segundo confirmou Arroyo ao AgFeed.
Também nos planos para os próximos 12 meses está uma operação com Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA).
Tamanha agitação se explica em números. Criada há apenas quatro anos a partir da necessidade de irmãos produtores rurais, a Grunner praticamente lançou uma nova categoria de máquinas agrícolas, despertou interesse da gigante Mercedes-Benz e deve fechar 2023 com faturamento superior a R$ 600 milhões.
“Talvez até um pouco mais, se continuarmos no ritmo que iniciamos este ano”, arrisca o executivo.
Manter a velocidade exige combustível financeiro. E é em torno dele que as conversas com o mercado financeiro têm girado.
Atualmente, o capital utilizado nos investimentos vem 30% dos próprios acionistas (a empresa é 100% controlada pelos irmãos Henrique, Mateus e Livia Belei) e 70% de recursos buscados no mercado.
Arroyo busca mudar o perfil dessa conta no curto prazo, mas não descarta também, no futuro, negociações em torno de participação acionária.
Inovação feita em casa
O executivo tem uma definição curiosa quando lhe perguntam sobre a empresa que dirige: “uma startup que nem teve tempo de ser startup”.
A velocidade dos negócios impressiona, principalmente quando se pensa como a empresa começou, com foco apenas nos canaviais próprios da família Belei, tradicionais fornecedores de cana para a indústria sucroenergética.
Foi pensando em como elevar a produtividade nas suas lavouras que os irmãos começaram a buscar soluções que não estavam no mercado. Incomodados com o pisoteio das máquinas no campo, perceberam que uma resposta estava nos equipamentos usados.
Não fazia muito sentindo, para eles, normalizar as perdas causadas pelo movimento dos tratores e suas caixas de transbordo, cujas rodas passavam sobre as linhas de cultivo e destruíam as plantas, causando prejuízos com o vai e vem do conjunto.
Queriam máquinas mais bem adaptadas às plantas e às necessidade da fazenda, não o contrário.
Nascia assim uma nova categoria que batizaram de smart machines para o campo, com inovação e muita tecnologia embarcada.
Com auxílio delas, os agricultores Belei alcançaram a tão almejada cana de 3 dígitos: mais de 100 toneladas por hectare.
Com o resultado, muita gente ficou curiosa para saber o que os irmãos estavam aplicando na cana.
Ficavam surpresos ao constatar que o segredo estava nas máquinas: caminhões adaptados e cheios de tecnologia que reduziam o pisoteio, ofereciam maior capacidade e eram praticamente autônomos.
Resultado: a empresa saltou do protótipo para a venda de 15 unidades a clientes externos já no primeiro ano.
Em 2022, foram 450 unidades. Já colocaram no mercado 1.000 unidades, e a meta, diz Arroyo, é chegar em 2028 com 1.000 máquinas/ano.
“Mas podemos chegar antes. O planejamento dos 5 anos iniciais foi cumprido em 2 anos”, diz.
O embarque da Mercedes
A ideia nasceu rodando a fazenda. Os irmãos perceberam que se abrissem a bitola do eixo dos caminhões reduziram o impacto do pisoteio, garantindo mais colheita.
Melhor ainda se a caixa transbordo que recebe a cana colhida deixasse de ser puxada e fosse colocada sobre o caminhão. Estava criada uma solução que reduzia impacto nas plantas, diminuía os custos de operação, aumentava produtividade da área e da operação.
A tecnologia de georreferenciamento e algumas soluções mecânicas contaram com a ajuda da Mercedes-Benz. Nos primeiros testes da família Belei, os veículos chamaram a atenção dos técnicos da montadora alemã, fornecedora dos caminhões da fazenda.
A empresa logo provocou a parceria atenta aos novos usos dos veículos e da tecnologia embarcada, soluções que seus engenheiros também vinham trabalhando. O acordo, que não prevê troca acionária, tornou a fábrica alemã fornecedora exclusiva da Grunner.
Discussões sobre uma participação acionária da Mercedes na empresa chegaram a acontecer, mas não evoluíram. Segundo Arroyo, chegou a haver propostas formais nesse sentido, mas não houve entendimento que levasse à conclusão do negócio.
Máquinas autônomas
As máquinas Grunner, montadas sobre uma plataforma de caminhões Mercedes, têm autonomia nível 2, o máximo permitido para operações agrícolas.
Significa que um condutor, especialista em transbordo, acompanha a operação sem interferir. Ele fica responsável apenas pelas manobras iniciais e finais de alinhamento do caminhão com a colheitadeira. Todo o resto da operação, o veículo faz sozinho.
A Grunner é, na prática, uma montadora que recebe um chassi transformado da Mercedes e trabalha o alongamento do eixo, embarca o georreferenciamento, as bolsas de flutuação, pneus especiais. Tudo em uma linha de montagem própria na fábrica de Lençois Paulista.
Com olhar atento às soluções que impactam na produtividade e custos, os equipamentos da empresa estão conquistando novos usuários País afora.
Para o setor sucroenergético, depois dos equipamentos de transbordo de 20 e 30 toneladas, está chegando ao mercado lançadores de vinhaça de 22 e 32 mil litros, além de um aplicador de calcário de 30 toneladas, todos lançados na edição 2023 da Agrishow.
Um veículo custa cerca de R$ 1,8 milhão, a depender do modelo e tecnologia embarcada. “Mais do que uma montadora, somos uma empresa de máquinas agrícolas”, explica Arroyo, mostrando o diferencial que os move.
O investimento feito na compra das máquinas é compensado pela economia de escala. Além do impacto na produtividade e automação, outra vantagem é a economia de combustível.
O equipamento consome 45% menos diesel do que o conjunto trator-transbordo. Isso tem impacto direto no resultado da usina e no meio ambiente com redução de emissão de CO2, o que rende à indústria ou produtor um ganho extra em CBIOS, os créditos de descarbonização, que são negociados em bolsa.
Expansão para o Centro Oeste
De olho nas máquinas, os produtores de grãos, especialmente soja e milho, começaram a se interessar nos modelos, uma vez que os caminhões oferecem maior velocidade de operação e redução nos custos de manutenção, dois elementos chave na operação.
Quem foi à TecnoShow em Rio Verde (GO), em março passado, teve a oportunidade de conhecer novos equipamento pensados para cereais, como máquinas de distribuição de fertilizantes, corretivos e soluções para a colheita.
Outros dois setores que entram no portfólio da empresa são o florestal e a citricultura. Para esses, os equipamentos de aplicação de corretivos e os tanques para irrigação de mudas estão sendo adaptados e testados nos terrenos que têm condições distintos das áreas de cana e cereais.
*Com reportagem de Alessandra Mello e Carlos Raíces