A Cooxupé, Cooperativa Regional dos Cafeicultores de Guaxupé, no sul de Minas Gerais, é responsável por quase 15% da produção de café do Brasil, país que lidera o ranking mundial dos exportadores do grão. Com mais de 90 anos de história e, atualmente, 19 mil agricultores cooperados, pode ser considerada um dos grandes cases de sucesso do agronegócio.

Sua fórmula combina tradição, confiança entre produtor e cooperativa e uma busca constante por inovação. Há muitos conselheiros e dirigentes de cabelos brancos, é verdade, mas que marcam presença desde os encontros de startups até grandes eventos do agro. E montam equipes para desenhar os próximos passos de crescimento.

O AgFeed esteve em Guaxupé, durante a Femagri, uma feira de tecnologia agrícola promovida pela Cooxupé para mostrar o que há de novo para os cafeicultores.

Entre um compromisso e outro, em meio ao evento, o presidente da Cooxupé, Carlos Augusto Rodrigues de Melo, parou para uma entrevista exclusiva, em que contou o próximo grande passo da cooperativa: atuar no mercado de soja e milho.

“Nós vimos que existe um potencial muito grande em grãos na área que a Cooxupé atua. Já vendemos muitos insumos para soja e milho, mas precisamos ter os outros pilares, como armazenagem, logística e comercialização”, afirmou o dirigente.

Segundo a cooperativa, na safra 2023/2024 as vendas de adubos e defensivos para grãos representaram 7% do faturamento com insumos da Cooxupé.

A meta é chegar em 15% na safra 2024/2025, o que pode significar R$ 250 milhões em faturamento, somente com a venda de insumos para “outras culturas”, em que não se considera o café.

Os números finais da Cooxupé referentes a 2023 serão divulgados nos próximos dias, após a realização da Assembleia Geral de Cooperados, mas Carlos Augusto de Melo adiantou que a receita deve ficar em R$ 6,4 bilhões, abaixo dos R$ 10 bilhões registrados em 2022.

Nas vendas de insumos que já vem sendo realizadas, alguns produtores fazem operação de troca, com a entrega dos grãos. Mas como ainda não possui um negócio neste segmento a Cooxupé vinha operando com parceiros, como por exemplo, o Grupo Castelli, que tem a Agrobom, que faz armazenagem, beneficiamento e exportação de grãos.

O AgFeed apurou junto a fontes próximas à cooperativa que o departamento de grãos deve ser estruturado nos próximos meses, com a contratação de especialistas na área, para que o quanto antes se viabilize a comercialização da soja e do milho que será entregue quando os produtores comprarem os insumos.

Acordos com tradings não estão descartados, mas é possível que, futuramente, a Cooxupé opte por construir sua próxima esmagadora, um investimento com potencial bilionário, pelo que disse uma das fontes.

Um dado que está sendo levado em conta pelos dirigentes da cooperativa é que, segundo o levantamento do IBGE, na área de abrangência da Cooxupé estão sendo cultivados 1 milhão de hectares de grãos.

A área tem crescido entre os próprios produtores de café ligados a cooperativa, na tentativa de diversificar a renda.

Carlos Augusto de Melo evitou dar mais detalhes sobre o projeto, que ainda está em fase de definição. Mas destacou números positivos da safra de café e uma expectativa otimista para os resultados da cooperativa em 2024.

A Femagri, que terminou na última sexta-feira, teve como um dos destaques a maior procura pelo barter nas operações de café. Foram 34,7 mil visitantes em três dias de evento e 10 mil orçamentos realizados para a compra de maquinários e outros insumos via operações de troca.

Confira os principais trechos da entrevista do presidente da Cooxupé ao AgFeed.

Como avalia o atual momento da cafeicultura?
O café vive um momento bom. Esta feira mostra a expectativa muito positiva, não só em negócios, mas principalmente em evolução tecnológica. Quando me refiro a isso, não é só tecnologia de máquinas e implementos, mas sim uma evolução de conhecimento com o uso de ferramentas que hoje são oferecidas ao agro, e em especial a cafeicultura, para que se possa crescer, de forma condizente com a pujança da cafeicultura brasileira.

Um dos destaques na feira foi um espaço chamado “fazendinha sustentável”. O tema ESG é uma prioridade?
Sim, essa é uma grande cooperativa de café, mas o Brasil representa com muito orgulho o que há de melhor de café no mundo, apesar das contestações as vezes atribuídas aos cafeicultores nas questões de legislação e demandas de café com sustentabilidade. Na questão ESG, estou com 71 anos e posso dizer que nunca o cooperativismo deixou de ser sustentável, sempre esteve buscando os três pilares. Às vezes com o econômico ficou a desejar, mas o produtor é responsável sim. Não podemos aceitar generalizações de que os produtores sejam irresponsáveis.

A Cooxupé trabalha para que sejam adotadas as melhores práticas possíveis dentro do nosso negócio, procurando levar a melhor qualidade, com todos os processos, atendendo a essas demandas, ao consumidor final. Me refiro internamente e externamente, visto a importância que tem a Cooxupé perante o mundo do café. Esse é o nosso objetivo. Temos essa cultura já implantada há muitos anos.

Se as regras da UE (de restrições quanto a origem dos produtos do ponto de vista ambiental) entrassem em vigor imediatamente, o café estaria preparado?
É muito cedo para falar dessa legislação, porque ainda não estão firmados o compromisso, as datas e até o mesmo a inclusão do café na lista dos produtos. O que posso dizer é que nosso país, com muito orgulho, representa o que há de melhor no tocante a obediência dessa legislação frente ao mundo, em relação aos nossos concorrentes. Respeitamos muito, mas acreditamos que estamos um pouco a frente.

A Cooxupé tem algumas iniciativas na questão de ESG e descarbonização. Quais as principais?
São vários projetos. Um deles é a parceria com a Yara para o uso de fertilizante verde, um nitrogênio neutro, que está bastante avançado. Há três grandes projetos na questão de mensuração de carbono. Estamos avançando bastante nos três. Um deles é uma parceria com o Cecafé e Esalq/USP em que se avalia em campo as emissões. Já constataram que, com métodos convencionais, o café é carbono neutro. E se forem adotadas outras práticas, é possível melhorar em dez vezes o balanço de carbono.

Quais os outros?
Temos várias parcerias. Tem um com CNC e outros parceiros que trata da conservação de solo, buscando maior infiltração de água, o que vai melhorar o estoque de carbono. Há outro em parceria com o professor Eduardo Assad, aposentado da Embrapa, que está criando o GHG protocol para o café, algo inédito. O importante é que façamos a mensuração e a premiação aos produtores que estão neutralizando. É algo técnico, mais difícil de explicar em detalhes. Mas todos avançam bem. Felizmente, dentro das culturas do agro, o café é privilegiado, ele se encontra numa situação confortável na questão do carbono, enquanto outras culturas tem mais dificuldade.

O objetivo é gerar crédito de carbono?
Sim, gerar crédito, que venha para o produtor. Cuidamos do meio ambiente, muito melhor do que pessoas que moram no ambiente urbano, mas isso tem um custo e por isso precisa ser premiado. Vamos ter carbono neutro, vamos sim, mas para isso é preciso ter uma adaptação para aqueles que estão na cafeicultura e isso tem um custo.

Já nos encontramos em eventos de hubs de inovação, com startups do agro. Qual sua visão sobre esta área?
Tenho que buscar acompanhar a inovação dos mais jovens. Eu os acompanho para não ficar distante e trazer isso para nossa organização, que é a Cooxupé. As vezes não tenho o conhecimento devido, mas eu vou nestes eventos e aplaudo. E posso dizer que tenho aqui na Cooxupé uma equipe fantástica nesta área de profissionais. Conhecimento é palavra-chave, uma busca incessante.

Como está o investimento em startups?
Nós temos uma busca de startups com seleção. A Agroven participa conosco e elencamos algumas que achamos que faz sentido. Há dois exemplos. Uma é na área financeira, a Vect.Ag, em que a Cooxupé acabou se tornando sócia. Ela busca recursos financeiros para o produtor, trazendo facilidade para que o financiamento chegue mais rápido ao produtor. Trouxemos também uma corretora para assegurar esse produtor que vai tomar crédito, para ele não correr risco. E investimos ainda em uma empresa da área de torrefação, a Master Expresso, que representa a verticalização dos negócios da cooperativa. A Master Expresso destina máquinas de café para empresas, lojas e restaurantes.

Divulgam quanto já foi investido em startups?
Não tenho este número, acredito que na Vect.Ag, agora, tenha sido R$ 2 milhões. Mas temos projetos muito interessantes. Uma vez que o produtor esteja bem alinhado com a sustentabilidade, se ele conseguir produzir da maneira como se espera, ele recebe uma premiação. É o nosso Protocolo Gerações. No início da safra vamos distribuir cerca de R$ 500 mil para produtores que se enquadrarem nesse programa. Nas startups a intenção é seguir investindo, acho que é uma saída para a cooperativa, visto que temos alguns focos e é preciso trazer gente de fora.

Quais as outras prioridades em investimentos futuros?
Nós falamos que café é Cooxupé. Continuamos buscando crescimento no café. Do menor ao maior produtor ele não abre mão dessa parceria com a Cooxupé por alguns preceitos, como liquidez, credibilidade, armazenamento. Mas estamos sentindo que precisamos avançar em outras áreas. Falam que o setor de grãos está em crise, mas eu não acredito nisso, considero uma oportunidade.

Então o plano é investir em grãos?
Os nossos técnicos estão trabalhando nisso. É algo que se faz em cima de embasamento técnico. E vimos que existe um potencial muito grande em grãos na área que a Cooxupé atua, como sul de Minas e região do Cerrado Mineiro. É basicamente soja e milho. A única coisa que posso adiantar por enquanto é que vendemos muitos insumos para estas culturas. Mas precisamos dos outros pilares, como armazenagem, logística e comercialização.

É possível já comercializar soja e milho na safra 2024/2025?
Vontade nós temos, mas não posso afirmar ainda. Acho que já deixou de ser um sonho para virar o início de uma realidade, não tão forte como no café.

No caso do café, como está sendo o resultado da safra?
Em 2023, no primeiro semestre, era considerado um dos anos mais difíceis. Chegamos em agosto com preocupações extremas, mas pedimos para o produtor seguir acreditando na cooperativa, fomos a campo para dizer que nós daríamos o resultado. E eles acreditaram. A equipe, com muito trabalho, conseguiu reverter o resultado de 2023 para um ano melhor que 2022, quando não se imaginava isso em agosto. O que não se fez em oito meses, nós fizemos em quatro meses. Veio um resultado até surpreendente para nós diretores, que vai dar possibilidade de uma distribuição muito positiva.

E para 2024, qual a expectativa?
O clima neste início de ano tem sido favorável para o café. A chuva não é tão regular, mas chove, faz calor, tudo o que o café precisa. As lavouras estão muito bonitas. A colheita da safra será muito parecida do que foi, acredito que até um pouco maior. No sul de Minas está maior, em São Paulo igual, no Cerrado bem menor, e na região da mata é maior. Em função disso, é uma produção muito parecida com 2023. Porém, há uma expectativa positiva em relação ao mercado.

Qual é a expectativa?
No mercado internacional de café a oferta e a demanda estão muito justas, porque outros países estão com problemas climáticos. Somado a isso, tem os problemas logísticos, transporte marítimo encarecendo em função de guerra, problemas no Mar Vermelho. Neste cenário, acreditamos que o preço não deva cair muito na colheita. E aquele produtor que está participando do mercado neste momento, eu não tenho dúvida que ele está tendo ganho real. Eu sou otimista.

O resultado melhor ocorreu tanto na produção de café quanto na receita?
Em 2023 recebemos 5,3 milhões de sacas dos cooperados, mais 1,2 milhão de terceiros, totalizando 6,5 milhões. A meta para esse ano é ficar entre 6,5 milhões e 7 milhões de sacas, principalmente porque a cooperativa expande a área. A receita de 2023 deve ficar em R$ 6,4 bilhões, mas estou otimista de que podemos ter crescimento este ano.