Não há troca de ações, assinatura de cheque, nem um novo CNPJ. Mas o aperto de mãos de Willian Sawa, CEO da paranaense Latina Seeds, e Leandro Lemos, dono da goiana Sementes Santa Fé, tem ambições bilionárias.
As duas empresas atuam em frentes distintas do mercado de sementes e estão entre as cinco maiores do País em suas respectivas áreas. A partir desta semana passam a atuar juntas, em uma “joint venture operacional” para se colocarem na dianteira de um dos segmentos com maior potencial de crescimento no agronegócio brasileiro nos últimos anos: a cultura do sorgo.
“Pode escrever aí: Latina e Santa Fé juntam forças para explorar mercado de R$ 3 bilhões”, disse Sawa ao antecipar a AgFeed a parceria. A cifra, entretanto, já parece defasada e reflete apenas parte do universo que as duas empresas, juntas, esperam conquistar.
Primeiro porque o valor citado refere-se à safra encerrada – e o próprio Sawa estima que ele pode saltar para até R$ 4 bilhões no próximo ciclo.
Segundo porque, além dos grãos – que nos últimos anos têm caído no gosto de produtores por terem demanda cada vez maior das indústrias de rações e biocombustíveis –, eles miram também os pecuaristas, com a introdução de variedades de sorgo forrageiro, que pode ser usado de forma consorciada com pastagens para a produção de silagem.
“Nosso segmento gira em torno de R$ 9 bilhões de faturamentos”, estimou Lemos, referindo-se ao mercado de sementes para pastagens, em que a empresa, fundada por seu pai, atua há quase 30 anos. Os parceiros querem fazer do sorgo uma parte relevante desse bolo, que tende a crescer.
“Ainda não há dados sobre o sorgo forrageiro nesse mercado”, afirmou Sawa. Mas ele e Lemos enxergam grandes áreas sendo ocupadas pela cultura, aproveitando o incentivo à renovação de áreas de pastagens degradadas – o programa recém-lançado pelo governo federal prevê renovar 40 milhões de hectares nos próximos anos.
Na joint venture, a complementariedade fica bem clara: a Latina tem como ponto forte o desenvolvimento genético de sementes, atuando principalmente com milho e sorgo e com presença maior no Sul e no Sudeste; a Santa Fé, por sua vez, é nome forte do mercado de sementes para pastagens, tem expertise comercial e atua sobretudo no Centro-Norte do País.
Pegando a especialidade de cada um, o acordo a que chegaram foi concentrar na Latina justamente a o melhoramento genético das variedades nas diferentes culturas, o sorgo á frente. À Santa Fé caberá as operações de produção, armazenagem, distribuição e assistência técnica comercial, usando sua força de vendas espalhada por cerca de 500 pontos de venda, sobretudo nos estados do Centro oeste e Matopiba.
“O formato que a gente buscava não é somente de um distribuidor”, disse Sawa. “A gente viu que o melhor seria fazer uma joint venture operacional. A gente não está inventando um CNPJ, a gente está inventando a operação”.
O formato acordo foi desenhado nos últimos 60 dias e fechado agora, mas o relacionamento entre as empresas já vem de alguns anos, com parcerias pontuais. “Tem cinco anos que a gente vem namorando e agora a gente enxergou o jeito de conectar mesmo”, contou Lemos.
“As nossas culturas são muito semelhantes e somos amigos. A gente entende que tem empresas de dono, quer continuar dono e se enxerga junto. Somos muito complementares em termos de empresa, em termos de negócios e em termos de perfis de pessoas”.
O ouro vermelho
E, pelo que declaram, também em visão de mercado. Sawa já havia declarado ao AgFeed, em entrevista concedida em fevereiro passado, que buscava um sócio potencial para ampliar a presença da Latina Seeds no sorgo, sua principal aposta para os próximos anos.
A cultura demorou a ganhar espaço nas lavouras brasileiras. Há cerca de dez anos, houve uma primeira tentativa de implantá-la em maior escala, mas que acabou não prosperando por falta de compradores para a produção.
O quadro hoje mudou e o potencial de crescimento parece infinito, com a popularidade do grão vermelho subindo em paralelo com os investimentos em novas usinas para a produção de biocombustíveis.
O sorgo avança de carona com o etanol de milho. Muitas das novas biorrefinarias já contemplam o uso dos dois grãos, inclusive com tendência, segundo Sawa, de favorecer o sorgo.
“Um quilo de grão de milho e um quilo de grão de sorgo geram a mesma quantidade de etanol, a mesma quantidade de DDG. Só que o sorgo custa 80% do valor do milho”, disse.
Os parceiros já mapearam as principais regiões para crescimento das vendas de sementes de sorgo. No mapa de oportunidades estão, além de Goiás – estado líder na produção do grão –, o Mato Grosso do Sul, que, Sawa acredita, tem potencial para ser o segundo maior, e o trio Maranhão, Tocantins e Piaui.
“O Matopi pode surpreender. Já tem uma planta da Inpasa em Balsas (MA) que está comprando sorgo grão, compartilhando o preço público deles. Já estão fechando contrato futuro a R$ 47,00 para entregar em abrir de 2025, que é quando a fábrica vai começar a rodar etanol de sorgo”, disse.
Também as indústrias de ração “entraram comprando com força”, de olho no mesmo custo-benefício obtido no etanol. E há, ainda, a possibilidade de exportação, em que o Brasil já tem sinal verde para vender até mesmo para a China.
“Agora tem quem compre”, afirmou Lemos.
Do lado do agricultor, além do mercado melhor, os dois executivos afirmam haver uma série de benefícios com a adoção da cultura. Um deles é o custo de produção, que fica, segundo eles, em torno de 50% do gasto para plantar milho.
Outro, tão atrativo quanto, é a mitigação dos riscos climáticos. O sorgo é mais resistente a altas temperaturas e estresse hídrico, além de sofrer menor incidência de pragas.
“Na safrinha, que tem risco, vai virar muito sorgo”, prevê Sawa. E, mesmo na safra de verão, ele já detectou uma tendência de alguns agricultores optarem pelo grão para evitarem correr riscos maiores com as janelas de plantio da soja, incertas em função da falta de chuvas em algumas regiões.
“O sorgo aguenta desaforo. O ciclo do sorbo é mais rápido, diferente de outras culturas”, afirmou. Nas suas contas, isso adicionaria até 100 mil hectares plantados com o grão.
No total, a estimativa dos parceiros é que a área plantada com sorgo grão, que na safra anterior ficou em 1,5 milhão de hectares, supere os 2 milhões na safra 2024/2025, chegando talvez até a 2,2 milhões de hectares, um crescimento superior a 40%.
Quando olha para o potencial da joint venture, Sawa avalia poder bater esse índice. “Achamos que podemos bater 60% de crescimento nesse mercado”, disse.
O avanço na pecuária
Isso não inclui, entretanto, a outra frente imensa que a joint venture pretende dominar: o uso do sorgo forrageiro consorciado com pastagens na pecuária.
Para se posicionar definitivamente nesse mercado, as duas empresas prometem lançar em outubro próximo um novo sistema de produção baseado na utilização combinada das duas culturas, que foi alvo de testes nos últimos quatro anos e teve seus resultados apresentados recentemente no Congresso Brasileiro de Milho e Sorgo.
Desenvolvido pela Latina Seeds em parceria com a Embrapa Pecuária Oeste, com sede em Dourados (MS), o chamado Sistema Diamantino passou por validações técnicas, econômicas e científicas e mostrou-se eficiente na produção de silagem para o gado e também como modelo de recuperação de solos degradados.
“Com esse modelo, o pecuarista consegue fazer uma reforma no pasto consorciada de capim com sorgo. Ele colhe aquilo ali, guarda aquela comida e a forrageira está estabelecida na área. O investimento se paga. É como se fosse uma reforma a custo zero”, afirmou Sawa.
Com o carimbo da Embrapa e os dados que apontam sucesso na recuperação de solos, as duas empresas vislumbram tornarem o Sistema Diamantino como uma alternativa atraente dentro do Programa Nacional de Conversão de Pastagens, o ambicioso plano do governo brasileiro para, através da recuperação de solos degradados, ampliar a área produtiva sem a necessidade de novos desmatamentos no País.
“Ele se enquadra como uma das melhores soluções para o plano de conversão daqueles 40 milhões de hectares”, afirmou Lemos. “A gente precisa trazer inovação para o nosso negócio e o sorgo forrageiro traz algo diferente”.
Nesse novo mercado, as duas empresas avaliam ser possível obter, no primeiro ano de operação, cerca de 5% do mercado de sementes forrageiras.
Pelo protocolo a ser anunciado, só serão considerados como integrantes do Sistema Diamantino os produtores que adquirirem as sementes produzidas pela Latina e comercializadas pela Santa Fé.
“A gente tem que se preparar, operacionalmente, para suportar esse mercado crescente, que vai absorver o nosso material, que é diferenciado”, concluiu Sawa.