Três franceses e um objetivo: criar algo inovador na agricultura, que ajudasse o produtor a enfrentar as mudanças climáticas. Foi assim que surgiu a Elicit Plant, na França, em 2017, empresa de bioinsumos que começa a dar passos mais firmes também no Brasil.

O perfil de cada um era bem distinto: Jean François Dechant era da área de cibersegurança e alavancou startups do Vale do Silício, nos EUA, Olivier Goulay, que trabalhava com games e montou um laboratório de inovação e Aymeric Moulin aí sim, diretamente conectado ao agro, um típico produtor rural francês.

O fato é que eles apostaram em uma tecnologia que cada vez está fazendo mais sentido na agricultura mundial: substâncias capazes de fortalecer as plantas para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas e os chamados estresses abióticos, situações como altas temperaturas, falta de luminosidade, déficit hídrico ou mesmo excesso de chuvas, que causam perdas na produção.

A base dos produtos são os fitoesteróis, lipídios (compostos gordurosos) obtidos nas plantas que, ao passar por um processo de modulação, podem estimular as defesas naturais.

A Elicit Plant chegou ao Brasil em 2021 e já no ano seguinte contratou Felipe Sulzbach, um ex-executivo de multinacionais como Bayer e Ihara, para liderar o negócio no País.

“Eu me interessei muito porque se tratava de uma tecnologia realmente nova, com matéria-prima 100% natural, sustentável, e eles começaram com um trabalho forte de pesquisa e desenvolvimento, para validar a tecnologia e só depois acessar o agricultor”, contou Sulzbach, ao AgFeed, hoje Country Head Brazil da Elicit Plant.

A empresa extrai o fitoesterol das plantas e chegou a um tipo de formulação que depois é aplicada nas lavouras, via foliar. Na Europa o produto é registrado como biofertilizante. Já no Brasil ainda há divergências sobre a regulamentação destes produtos, que ainda são mais conhecidos como bioestimulantes.

“As plantas produzem mais de 200 tipos diferentes de fitoesteróis. Eles são estudados há mais de 40 anos, mas a Elicit chegou nesta formulação totalmente nova”, explica o executivo.

Atualmente, a empresa diz ter parceria estabelecida com 35 instituições de pesquisa no Brasil. Os dois primeiros anos foram mais focados nestes experimentos, que buscaram “tropicalizar” a tecnologia que já estava trazendo resultados na Europa. Segundo a Elicit, já são seis famílias de patentes aprovadas, globalmente, sendo duas no Brasil.

Em 2023, os produtos foram aplicados em 120 lavouras comerciais de soja e milho e, na última metade do ano, começaram as vendas para valer.

“Nós estimamos que nesta safra 2023/2024 a tecnologia da Elicit já tenha sido aplicada em 100 mil hectares, já na safra seguinte chegaremos a 250 mil hectares”, afirmou Felipe SulzBach.

A solução vem se beneficiando dos extremos climáticos cada vez mais frequentes na agricultura, especialmente no Brasil, onde o Rio Grande do Sul, por exemplo, viveu três safras seguidas de perdas pela seca e nesta temporada enfrentou excesso de chuvas.

“Essa tecnologia tem uma ação dentro da planta, é uma autorregulação, que não deixa ela perder a capacidade de continuar produzindo e se desenvolvendo, mesmo em condições adversas”, diz ele.
Segundo Sulzbach, há produtos no mercado que também prometem proteger a planta contra os estresses abióticos, mas nenhum a base de fitoesterois.

“Identificamos quais são os genes da planta que modulam este perfil metabólico. Aí nascem os elicitores, que dão nome a empresa. Os fitoesteróis ajudam o agricultor tanto na seca quanto na chuva. Eles minimizam os impactos”.

A Elicit Plant apresentou seu projeto formalmente ao presidente francês Emmanuel Macron em dezembro. A empresa foi uma das sete selecionadas entre 3,2 mil projetos para integrar o plano de investimento chamado France 2030 com foco em inovações que ajudem a enfrentar as mudanças climáticas.

Custo x benefício

O trabalho da empresa tem sido convencer os agricultores sobre importância de adotar mais essa tecnologia na lavoura. Felipe brinca que um produtor chegou a apelidar o produto de “climaticida”, ou seja, além de tratar de pragas e doenças, agora é necessário também proteger as plantas quanto aos efeitos do clima.

Os melhores resultados foram obtidos na cultura do milho, segundo a empresa. Na safra de verão o uso da tecnologia em lavouras de produtores rurais trouxe ganho de 12% na produtividade, de acordo com o executivo.

Como o produtor sempre questiona sobre o preço – quer não somente produtividade, mas também manter a rentabilidade da lavoura – o estudo também foi feito em relação ao custo x benefício.

“O incremento de produtividade no milho foi de 13,1 sacos a mais por hectare, na área dos agricultores, mas nas lavouras de pesquisa o ganhou foi superior a 17 sacas”, revelou o executivo da Elicit.

Enquanto isso, segundo ele, a adoção do produto significou um aumento de custo equivalente a 3,3 sacas por hectare, ou seja, o retorno ainda fica positivo em 9 sacas. “Podemos dizer que no milho o custo benefício é mais ou menos de 3 para 1, já na soja é de 2 para 1”, admitiu.

Novidades para a soja

Por enquanto o produto comercializado pela Elicit Plant no Brasil é o BOM-a Fit. Foi esse o fertilizante foliar aplicado nas lavouras e na maior parte das áreas de pesquisa.

Na cultura da soja, o incremento de produtividade foi de 7,5%, abaixo dos resultados do milho.
Mas Felipe Sulzbach adiantou ao AgFeed que até o fim do ano a empresa lança um segundo produto no mercado brasileiro, desta vez desenvolvido aqui, em conjunto com a França. Trata-se de um fitoesterol concentrado com foco específico na cultura da soja, que deve trazer um ganho maior de produtividade e “ajustar mais o custo”.

“A adoção de biológicos no Brasil ocorre em ritmo bem mais acelerado do que em outros países, o agricultor está vendo as oportunidades e de outro lado tem a pressão da sociedade para que se reduza o uso de químicos, o que nos fez a empresa apostar no País”, reforçou.

O executivo afirma que há um pipeline de lançamentos até 2030. Em setembro, foi lançado na Europa um produto específico para cereais como trigo, cevada, centeio e aveia. Outro item foi lançado para o girassol.

“No Brasil já estamos trabalhando para outras culturas como algodão, cana e cereais. Vamos trazer para cá aos poucos, só precisa tropicalizar, o ajuste é necessário porque são variedades genéticas diferentes que temos aqui”, explicou Sulzbach.

Na cultura do trigo a pesquisa no Brasil começou na safra passada, “ mas os resultados estão sendo compilados”, segundo ele.

Rumo ao breakeven

A Elicit Plant até hoje não divulgou números globais de faturamento, nem mesmo por país. Segundo Felipe Sulzbach, “é a terceira safra mundialmente e a primeira de vendas no Brasil, mas em breve dados devem ser divulgados”.

Ele adiantou, no entanto, que a empresa triplicou de tamanho em 2023. “É um sucesso grande porque mesmo com a recessão global, conseguimos ter um início muito favorável, estamos otimistas, a empresa nasceu como startup, se posicionou como multinacional e já tem presença em vários países”, ressaltou.

Além do Brasil e da França, a empresa está presente também nos EUA, na Ucrânia e na Polônia. Na primeira rodada de investimentos, em 2021, a empresa captou 28 milhões de euros. A expectativa é de que na safra 2024/2025 já seja possível chegar ao breakeven, segundo o executivo.

No Brasil, Sulzback diz que foram investidos 1,3 milhão de euros no último ano, a maior parte em pesquisa e desenvolvimento. “Queremos crescer acima do mercado”, acrescenta.

Para distribuir seus produtos, a Elicit Plant conta com parcerios, especialmente revendas, nos três estados da região Sul, além de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e oeste da Bahia.

A extração dos fitoesterois das plantas é feita na França e depois trazido para o Brasil. Já a manufatura do fertilizante foliar ocorre no interior de São Paulo, ainda sem uma fábrica própria. “

Esse é um plano para o médio prazo”, admite o diretor, ao revelar que vem conversando com potenciais parceiros no Brasil para ampliar a produção.