Há um movimento em curso na citricultura brasileira – e ele acaba de receber um impulso de meio bilhão de reais. Com o greening – doença causada por uma bactéria, é transmitida da por um inseto e causa perdas severas nos laranjais em que se instala – se espalhando pelo interior de São Paulo, onde está concentrada 80% da produção nacional, as grandes empresas do setor buscam alternativas para produção em outras regiões, ainda não infectadas.
Várias experiências e conversas foram feitas nos últimos anos, mas na semana passada essa migração ganhou forma em um projeto de grandes proporções. Uma das maiores produtoras de suco de laranja do mundo, a Cutrale, com sede em Araraquara (SP), comunicou ao governo de Mato Grosso do Sul que investirá R$ 500 milhões na implantação de um pomar de 5 mil hectares no estado.
O investimento e alguns de seus detalhes foram confirmados ao AgFeed por Jaime Verruck, secretário de Desenvolvimento do MS. A Cutrale produzirá laranjas na Fazenda Aracoara, pertencente ao grupo, no município de Sidrolândia, vizinho à capital Campo Grande.
O plantio começa em agosto próximo e o manejo erá feito em sistema irrigado – o que confere maior controle das condições hídricas e, portanto, produtividades elevadas. Mais de 1,7 milhão de árvores devem compor o pomar da Cutrale.
A decisão de investir no estado é fruto de cerca de dois anos de trabalho conjunto entre a empresa e o governo local. Nesse período, a Cutrale realizou testes em uma área de 145 hectares, avaliando a adaptação e o desenvolvimento de variedades ao solo arenoso da região.
Nesse período, o governo estadual estabeleceu um plano de desenvolvimento da fruticultura, que deve ser lançado nos próximos 30 dias, dando maior ênfase ao potencial observado na citricultura.
“Identificamos que havia uma diminuição prevista na produção de laranjas nos estados de São Paulo e Paraná e que havia a possibilidade de que viesse para o Mato Grosso do Sul”, afirma Verruck.
Uma das medidas tomada pelo governador Eduardo Riedel foi a elaboração de um decreto de defesa vegetal, com vistas a evitar que o greening ingresse no estado. Além disso, espera contar com um acordo com o Fundecitrus, já em formatação, para o desenvolvimento da cadeia da citricultura no MS.
“O que é interessante nesse projeto é que ele já está vindo em cima da plataforma da defesa vegetal”, diz o secretário. “E há outros desafios, como a irrigação, que também já estão sendo superados”.
Verruk conta que o governo busca ferramentas disponíveis, como o Fundo Constitucional do Centro-Oeste, que tem a irrigação como uma das prioridades, para viabilizar projetos nessas áreas. O estado agilizou a outorga de água e a disponibilização de energia elétrica, através de negociações com a distribuidora Energisa.
Segundo Verruck, além do investimento da Cutrale, já há pelo menos mais uma empresa comprometida a iniciar, também em agosto, o plantio de outros mais de 1 mil hectares no município de Paranaíba, mais próximo da divisa com os estados de São Paulo e Minas Gerais, e Santa Rita do Rio Pardo, também a menor distância da divisa paulista.
“E temos ainda, na nossa plataforma de investimentos, a estimativa de outros 2 mil hectares envolvendo diferentes produtores”, afirma o secretário. “O custo de implantação dos pomares é elevado, mas com o sistema irrigado passa a ser viável”.
A conta das empresas deve considerar também o custo logístico. Sidrolândia, por exemplo, fica a mais de 800 quilômetros de Araraquara, onde está a principal planta de processamento da Cutrale.
Por esse motivo, uma expectativa que surge, junto com os pomares, é a de implantação de uma indústria de suco de laranja no estado. De acordo com Verruck, isso só deve acontecer quando a área de produção de laranjas atingir cerca de 30 mil hectares.
“Com 10 mil hectares já seria viável, mas em um primeiro momento entendemos que é importante aproveitar essa janela de ampliação da citricultura para outras regiões”, diz.
Segundo dados informados ao AgFeed, por Mauricio Mendes, membro do Grupo de Consultores em Citros e Produtores de Laranja (GCONCI), ao AgFeed, o cinturão citrícola de São Paulo perdeu mais de 18 mil fazendas produtoras nos últimos 30 anos – atualmente são cerca de 5 mil no estado.
Segundo o IBGE, a área cultivada com pomares de laranjas no território paulista caiu de 1 milhão para 369,2 mil hectares entre os anos 2000 e 2021.
Com reportagem de Alessandra Mello.