Todos os empresários e produtores ouvidos sobre os impactos da catástrofe ambiental no Rio Grande do Sul dizem que ainda é cedo para ter qualquer dado mais concreto sobre os danos, até porque a chuva continua no estado.

No entanto, já é possível perceber alguns efeitos preliminares. No caso do arroz, item que tem o Rio Grande do Sul como grande produtor nacional, a Camil, uma das principais comercializadoras de cereais do País, já relata um movimento de aumento de preços e dificuldades no transporte.

“Tudo ainda é muito preliminar. Mas vimos um aumento de 15% nos preços nestes 10 dias desde que as chuvas começaram. Há também um aumento dos custos logísticos, já que são 80 pontos de interdição em 40 rodovias no estado”, afirmou Luciano Quartiero, CEO da Camil, durante teleconferência com analistas para apresentar os resultados do quarto trimestre fiscal de 2023, encerrado em fevereiro deste ano.

O executivo afirma, entretanto, que não existe risco de desabastecimento, apesar de admitir alguns problemas de curto prazo, causados inclusive pelo comportamento do consumidor.

“Estamos vendo uma demanda muito parecida com aquela do início da pandemia de Covid-19. Temos informações que alguns clientes varejistas já estão limitando a compra por consumidor para tentar garantir que todos consigam comprar”.

Quartiero afirma que a Camil está procurando manter o abastecimento, inclusive porque não teve unidades afetadas pelas chuvas no estado, mas a dinâmica do mercado também pode trazer alguns impactos de curta duração.

“Os agentes costumam deixar o maior volume de compras de arroz para a parte final da safra. Acontece que, neste ano, vimos um plantio mais tardio pelos produtores e a colheita, que geralmente é feita entre fevereiro e março, foi esticada até o final de abril por conta do El Niño. Então, pode acabar faltando arroz para comprar por conta dessa quebra no Rio Grande do Sul”, conta o CEO da Camil.

O executivo chama atenção para a distribuição da colheita de arroz no estado. “Na região central, que foi bastante atingida pelas chuvas, o índice de colheita estava em 60%, ante a média de 80% do estado”.

Questionado sobre os possíveis impactos para a produção gaúcha de arroz na safra 2024/2025, Quartieri afirma que ainda é difícil estimar. “Em outros eventos catastróficos como esse, há um custo maior pela necessidade de recuperação do solo. Mas ainda é muito cedo para ter uma noção mais precisa”.

Ele projeta que o volume de arroz da Camil no primeiro trimestre fiscal de 2024, que se encerra em maio, pode ser “levemente inferior” devido aos eventos no Rio Grande do Sul. Uma leve queda, de 2%, já aconteceu no quarto trimestre em relação ao mesmo período do ano anterior, para pouco mais de 307 mil toneladas, no segmento chamado de Alto Giro, que inclui arroz e açúcar.

Em relação às ações tomadas para ajudar a população no Rio Grande do Sul, a Camil organizou a doação de 8 mil cestas básicas enviadas pela unidade da companhia localizada em Santa Catarina.

Números sólidos e expansão

Quanto aos números do último trimestre do ano fiscal de 2023, os analistas de mercado classificam os resultados como sólidos e a ação da Camil responde a essa análise, subindo quase 2% nesta sexta-feira, 10 de maio.

Enquanto teve queda no volume de produtos de Alto Giro, houve aumento superior a 8% nos produtos classificados como Alto Valor, como café, massas e biscoitos.

Como diz o nome, esses produtos de maior valor agregado permitiram um aumento de quase 7% na receita líquida, para R$ 2,7 bilhões, com o mesmo ritmo registrado tanto no mercado brasileiro quanto no internacional.

Assim, o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) cresceu quase 62% em um ano, para R$ 254 milhões. A margem Ebitda deu um salto de mais de três pontos percentuais, para 9,5%.

O lucro líquido cresceu mais de 6 vezes, passando de R$ 16 milhões no quarto trimestre do ano fiscal de 22 para R$ 106 milhões no último período de 23.

Mesmo nos produtos de alto giro, a Camil conseguiu um aumento significativo no preço líquido em um ano, passando de R$ 4,01 para R$ 5,04 por quilo, avanço superior a 25%.

Mas a grande aposta da companhia está nos itens mais processados. Depois da compra da Mabel, que segundo a carta da administração que acompanha o balanço, “trouxe resultados excelentes de forma rápida”, o investimento em biscoitos, massas e café tem aumentado.

Segundo Flavio Vargas, diretor Financeiro e de Relações com Investidores, a Camil está pronta para lançar sua marca de massas.

“Também vamos lançar em São Paulo a nossa linha de cápsulas com a marca União e de cafés gourmet. Esses produtos devem estar nas prateleiras em cerca de 60 dias”, conta Vargas.

A expansão geográfica é outra estratégia da Camil. Depois de lançar a marca Santa Amália em Minas Gerais com bons resultados, o executivo conta que está nos planos abrir uma unidade de empacotamento de arroz no estado, “até para contar com os benefícios fiscais desse movimento”.