Sorriso (MT) - Nos mais de 44 milhões de hectares plantados com soja no Brasil hoje, em aproximadamente 60% dessa área tem plantas daninhas resistentes a pelo menos um princípio ativo existente. O dado, apontado pela divisão de herbicidas da Bayer, é alarmante.
E tende a ficar ainda mais grave, segundo o gerente de herbicidas da Bayer para a América Latina, Matheus Palhano. “Em 2030, há a possibilidade dessa porcentagem ultrapassar 65% da área com a oleaginosa, com a tendência de haver mais de uma planta daninha resistente a múltiplos tipos de princípio ativo”, afirma.
Por conta disso, a empresa tem mobilizado esforços e já tem planejada uma série de lançamentos para os próximos anos. Esse pipeline foi apresentado na semana passada para um grupo de jornalistas convidados a conhecer a unidade de Sorriso, no Mato Grosso, de seu Clube de Inovação Soja.
É ali que a gigante alemã desenha seu portfolio da próxima década. A empresa trabalha em duas frentes principais. A primeira, ainda em estágio inicial, diz respeito à soja transgênica de quarta geração.
Com o passar dos anos, a soja tem perdido a resistência a alguns herbicidas utilizados na lavoura, como o glifosato e a dicamba. Além deles, novos produtos químicos entram na jogada todos os anos.
A ideia, segundo explicou Márcia José, diretora de Segurança de Produtos da Bayer para a América Latina, é que a nova geração seja tolerante a cinco herbicidas, além das lagartas. Além do dicamba e do glifosato, que já são protegidos na terceira geração de soja transgênica, o grão deve ser resistente ao 24D, o glufosinato e a mesotriona.
O desenvolvimento ainda está no começo e o lançamento no mercado está previsto para 2029 e 2030. Segundo Márcia José, o que “segura” os lançamentos, uma vez prontos, é a legislação em países importadores do grão nacional.
“A terceira geração, por exemplo, foi aprovada aqui em 2018, mas na China isso aconteceu só em 2020. Embora aprovado aqui, não podemos lançar pois existia um mercado importador expressivo que ainda não tinha aprovado”, afirmou a diretora.
“Atualmente, China e Europa competem para ver quem demora mais para aprovar”, brinca. A tecnologia de resistência completa deve ser um produto exclusivo no Brasil, pois tem foco em atender culturas tropicais. Em outros países o produto deve chegar com menos aspectos resistentes.
A primeira geração, conhecida como RR (Roundup Ready), foi criada em meados dos anos 2000, pela americana Monsanto – adquirida pela Bayer em 2018. Segundo a empresa, essa tecnologia passou a estar em mais 50% do mercado na safra 2006/07, quando a produtividade média da soja brasileira passou de um patamar de 40 sacas por hectare para 50. O RR foi responsável, na época, para deixar a soja resistente ao glifosato.
Passados os anos, o cultivo de soja foi impactado pela presença de lagartas, o que impulsionou o desenvolvimento da segunda geração, conhecida como Intacta. Além do gene resistente ao glifosato, o grão passou a suportar os pequenos insetos.
De acordo com a Bayer, essa variedade ganhou mais de 50% do mercado em 2016/17, aumentando em mais dez sacas a produtividade média. A terceira geração surgiu há alguns anos e ficou conhecida como Intacta 2 Xtend. Além das proteções prévias, tornava a soja resistente à molécula dicamba.
Segundo a empresa, esse produto já está em 15% do mercado, e a expectativa é chegar em 30% já na próxima safra (2024/25).
Nos herbicidas, a empresa conduz testes para lançar, em 2026, um novo herbicida para ser usado na fase de pré-emergência da soja. O produto usa a molécula icafolin, que combate o capim-amargoso e o capim-pé-de-galinha.
“Nossa aposta é combinar mais de uma molécula em uma mesma solução, dificultando o avanço da resistência das plantas daninhas aos princípios ativos”, afirmou Palhano.
No Clube de Inovação, uma área localizada na parte rural de Sorriso, a Bayer conduz experiências para testar a efetividade dos herbicidas em áreas de teste.
Em baias separadas, dispostas uma ao lado da outra no campo, a empresa mostrou aos jornalistas a diferença do solo com os produtos. Numa área sem uso de nenhum herbicida, é notável o avanço e altura das daninhas. Numa área que usa glifosato, a presença é mais tímida, mas ainda conta com certas espécies.
O cenário se repete com o uso apenas da molécula icafolin. Quando combinados, a presença é quase nula desses agentes que prejudicam o cultivo da soja.
O milho de baixa estatura
Fora da soja, a empresa também desenvolve novas soluções para o milho, segunda maior cultura nacional.
Nesse sentido, a aposta da Bayer está no desenvolvimento de um milho de baixa estatura, ou short corn.
Nas palavras de Mateus Torrezan, agrônomo que atua no desenvolvimento de mercado da Bayer para a região Cerrados, esse milho com estatura menor traz alguns benefícios frente à planta convencional.
Primeiro, a estatura menor acaba adensando as folhas, e isso confere uma proteção maior ao pé, que fica menos suscetível ao tombamento e quebramento. “Pelo seu tamanho reduzido, o ponto de equilíbrio, que geralmente está onde fica a espiga, está mais próximo do solo”, diz.
Outro ponto é o acesso. No cenário atual, a aplicação após o milho pendurar, ou seja, soltar sua inflorescência masculina, só é possível de ser feita via aviões agrícolas. Com a menor estatura, isso pode ser feito com menos custos, por meio de máquinas terrestres.
“O milho mais baixo tem uma altura que permite a aplicação de um defensivo, fungicida ou inseticida por um pulverizador”, afirmou o especialista.
A ideia, com isso, é aumentar o teto produtivo agregando uma maior população de milho. Na situação atual, a competição entre plantas faz o milho crescer mais, o que aumenta o risco de quebramento. “O número de folhas permanece igual, o ciclo da cultura também, bem como o tamanho da espiga e o pendoamento”.
Na prática, a facilidade de pulverização somada a resistência maior da planta podem trazer mais produtividade no fim das contas.
A expectativa, segundo Torrezan, é que as primeiras variedades cheguem ao mercado brasileiro e argentino entre 2026 e 2027. Atualmente, o México e os EUA já contam com algumas espécies de milho de baixa estatura comercializados pela Bayer.
A diferença é que essas espécies são oriundas de cruzamento genético com plantas locais, e não se tratam de processos biotecnológicos como o que foi mostrado. Dessa forma, o rito regulatório é inexistente.