A cada balanço de empresa do agronegócio um novo suspiro para concluir que a fase, definitivamente, é de muitos desafios. Para a Boa Safra Sementes, um dos maiores fenômenos da nova geração do agro na bolsa de valores, não foi diferente.
O balanço do terceiro trimestre de 2024 indicou que a companhia fechou com um lucro líquido de R$ 54 milhões, queda de 53,3% em relação aos R$ 115,6 milhões registrados no mesmo período do ano passado.
A receita líquida também caiu mais de 26%, fechando R$ 727,4 milhões. O Ebitda (lucro antes de impostos, juros e depreciação) atingiu R$ 78,7 milhões, recuo de 40%. Já o ebitda ajustado caiu ainda mais (45,5%), totalizando R$ 74 milhões.
A Boa Safra também reportou um lucro líquido ajustado – que deduz participação de minoritários e IR de anos anteriores a 2023 – de R$ 35 milhões, representando uma queda de 65,4%.
Em entrevista ao AgFeed, o CEO da Boa Safra, Marino Colpo, apontou dois pontos principais que contribuíram para o pior resultado no trimestre.
O primeiro deles foi a produção de sementes abaixo do esperado. Em função do excesso de chuva na colheita, um volume significativo de soja colhida em Goiás não foi considerada nos padrões de excelência para virar semente.
Felipe Marques, CFO da Boa Safra, lembrou que a empresa havia ampliado a capacidade instalada de 200 mil big bags para 240 mil big bags esse ano. Além disso, aumentaram os campos de sementes em mais de 50%. O clima, porém, não ajudou.
“A gente tinha se programado para o aumento de produção da companhia, mas ele acabou ocorrendo de forma muito marginal. A expectativa era que tivéssemos 240 mil big bags de produção, mas a gente acabou produzindo 206 mil, um volume muito próximo do ano passado”, disse Marques.
Esse, seria, portanto, um dos motivos para a queda na receita, “menos matéria-prima para vender”.
O CFO também citou o efeito das chuvas mais tardias para o plantio da safra de soja 2024/2025. “Houve um deslocamento do nosso faturamento de sementes saindo do terceiro tri e indo mais para o quarto trimestre desse ano”.
O segundo motivo está bastante relacionado ao cenário adverso que vive o agronegócio em 2023. Com recuperações judiciais em alta no campo e o endividamento nas revendas, fazer negócios no setor ficou mais arriscado.
“Depois dos recentes acontecimentos que estão ocorrendo no setor, a gente repassou todo o nosso crivo de crédito, acabamos levantando a barra. A gente tinha alguns pedidos em carteira, feitos com grandes revendas e muitos acabaram não se concretizando porque o pessoal não conseguiu aportar as garantias necessárias”, explicou o CEO, Marino Colpo.
O executivo evitou citar nomes, mas é fato que eventos como a recuperação judicial da gigante de insumos Agrogalaxy estariam entre os problemas que desafiaram os negócios.
“A gente tem um bom respeito por todas as empresas, por todos os nossos clientes mas achamos que o nível de endividamento do setor concentrado nas grandes revendas está muito alto”, admitiu Marino.
Nesse cenário, a Boa Safra diz que “um pouco dessa semente voltou para o estoque”. A estratégia agora é reforçar as vendas no quarto trimestre com foco em pequenas e médias revendas, principalmente.
“Ficamos com um pouco mais de medo do setor, do que está ocorrendo, e a gente decidiu andar mais devagar, digamos assim, do que forçar a mão, ter um excelente terceiro trimestre e depois ter uma surpresa”, ressaltou.
A boa notícia, segundo Colpo, é que dos R$ 450 milhões concedidos em crédito pela empresa apenas R$ 8 milhões estariam inadimplentes. A companhia diz que tinha índice de inadimplência próximo de zero e que agora está em 1,7%.
Para manter o foco – e a política de menor risco e exposição limitada às grandes revendas – Marino Colpo disse ao AgFeed que tem estratégias para o curto e longo prazo.
“No curto prazo estamos fazendo uma força tarefa com a equipe que a gente tem para tentar atender mais pequenas e médias revendas, para atender essa demanda que existe no mercado e que não está sendo suprida”.
A carteira de pedidos da companhia, por exemplo, alcançou R$ 699 milhões, apontando para oportunidades significativas nos próximos meses.
Por isso, já para o próximo ano o executivo diz que haverá um reforço do time comercial. “Nós estamos trazendo mais 10 vendedores, reforçando o time para que a gente consiga vender mais pulverizado, diminuir o risco e a concentração de risco”, reforçou.
A Boa Safra informou que atualmente o volume comercializado via grandes revendas está em cerca de 20%, em função dos ajustes feitos. Em 2021 esse índice teria chegado a 40%.
Projeções otimistas
O CEO da Boa Safra já disse ao AgFeed no passado que a empresa tinha apetite para fazer “uma aquisição por ano”.
Perguntado sobre a demora para um novo anúncio esse ano – a última aquisição foi de 50% da Dasoja, em 2023 – Marino Colpo respondeu: “ainda tem chance”, mas sem demonstrar muita convicção.
“Essa é uma oportunidade, tem aparecido muita coisa, muita coisa mesmo, mas a gente tem que estar bem diligente porque o custo do dinheiro aumentou no Brasil”, afirmou.
A expectativa de Colpo é de completar “um bom ano” em 2024, mas admite que “dificilmente vai repetir o resultado do ano passado”.
Apesar disso, ele garante que os planos de investimento e de expansão estão mantidos. Para 2025, a previsão é produzir 280 mil big bags, conforme havia sido anunciado. “Em tudo dando certo a gente pode crescer 40% no ano que vem”, afirmou, já considerando que em 2024 a produção ficou abaixo do esperando, em pouco mais de 200 mil big bags.
A empresa já conta com 254 mil hectares contratados de campos de produção e projeta para o ano que vem também o lançamento da marca Avra Sementes, de sementes com alta qualidade e tecnologia avançada.
Outra aposta futura na Boa Safra é o crescimento da venda de sementes de outras culturas, como milho e trigo, áreas que a empresa já está investindo.
“Elas (outras culturas) estão crescendo muito rápido, o milho já representa entre 5% e 8% da receita, mas devem crescer muito nos próximos 3 anos”, disse Marino.
Na visão dele, as demais culturas “tem potencial para responder por 50% do faturamento da empresa, lá por 2030 talvez”, sinalizando que a Boa Safra tende a ser no futuro bem mais diversificada.
A expectativa é baseada em dados de pesquisas que, segundo ele, indicam que já, hoje em dia, o mercado de sementes de soja seja de R$ 26 bilhões, enquanto as outras culturas somadas correspondem a R$ 31 bilhões.
“Elas crescem mais rápido que a soja. Pelos dados que temos visto, a soja deve chegar a R$ 40 bilhões no máximo até 2030 e as outras culturas podem chegar a R$ 60 bilhões se o sorgo crescer e o milho continuar crescendo”, destacou.
“É tudo muito embrionário o que a gente tem, mas se a gente acertar nesses materiais, pode crescer rápido nessas culturas”.