Não-Me-Toque (RS) - A Stara é mais conhecida (e reconhecida) como uma das maiores fabricantes de máquinas e implementos agrícolas do Brasil, exportando produtos para 35 países. O que nem todos sabem é que a companhia também financia seus equipamentos para os produtores rurais através de uma financeira e, agora, está prestes a criar um banco.

A informação foi antecipada ao AgFeed por Gilson Lari Trennepohl, presidente do conselho da companhia, durante a Expodireto Cotrijal, evento da cooperativa de Não-Me-Toque, que também é a cidade-sede da Stara.

A Stara Financeira, que opera desde 2013, hoje oferece opções de financiamento para produtores e concessionárias e também crédito consignado.

A companhia aguarda agora autorização do Banco Central para transformar a instituição financeira em um banco, de acordo com Trennepohl.

“O banco nos auxilia muito para a gente poder criar um ambiente mais propício para negócios”, analisa o presidente do conselho da Stara.

Nos dados mais recentes divulgados pela Stara Financeira, com informações até junho de 2024, a carteira de crédito da instituição era de R$ 597,2 milhões, sendo que R$ 433,3 milhões eram de clientes pessoa física e R$ 163,9 milhões correspondiam a clientes pessoas jurídicas. A maior parte das operações correspondem a financiamentos.

“Hoje, nós temos uma carteira bem razoável e a gente pensa em crescer, estendendo outras atividades para o banco, além de financiar as máquinas.”

A ideia, segundo Trennepohl, é criar linhas de crédito de crédito para os fornecedores e os produtores-clientes que compram as máquinas da Stara, que correspondem a boa parte da carteira da financeira.

“O cara que fornece para a gente, às vezes quer comprar uma máquina e a gente pode financiar, criar um agente que possa estruturar uma operação para eles”, afirma o presidente do conselho da companhia.

Essa é mais uma empreitada do empresário Gilson Lari Trennepohl, que não veio à Não-Me-Toque, berço dos imigrantes holandeses no Rio Grande do Sul, a perder.

Quando chegou à Stara, aos 24 anos de idade, em 1986, encontrou uma empresa que tinha 20 funcionários, já contava 10 meses de salários atrasados a seus colaboradores e não tinha mais crédito nos bancos.

Quatro décadas depois, a realidade é completamente diferente: a Stara emprega cerca de 4,5 mil funcionários, tem seis unidades de fabricação e tecnologia dentro e fora do Brasil, fatura em torno de R$ 4 bilhões por ano e está prestes a fincar a sua bandeira laranja no continente africano.

Tudo isso para chegar na pretensão declarada de Trennepohl de tornar a Stara uma gigante mundial em algum momento.

“Hoje nós já somos a maior indústria de máquinas agrícolas da América Latina. Estamos entre as 20 maiores empresas do mundo e queremos estar entre as dez maiores fabricantes de máquinas agrícolas do planeta”, afirma Trennepohl, em entrevista ao AgFeed, durante a Expodireto Cotrijal, evento realizado ao longo desta semana no Rio Grande do Sul.

Até lá, no entanto, há muito trabalho a fazer. Assim como todo o setor de máquinas agrícolas, que somente em 2024 teve um recuo de 19,8%, segundo dados da Anfavea, a Stara também sofreu com queda de comercialização nos últimos anos.

No ano passado, ao contrário dos costumeiros R$ 4 bilhões, a companhia faturou cerca de R$ 3 bilhões. “Já tínhamos tido uma pequena queda em 2023 e, no ano passado, isso se consolidou. Foram dois anos de queda, chegando a 25%”, afirma Trennepohl.

A maior parte da produção da Stara fica no mercado nacional de máquinas, responsável por 85% das vendas da empresa. Os maiores mercados são Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Goiás e Bahia.

A ideia da Stara, no entanto, é expandir o volume de exportação, que hoje corresponde a 15% do total – um percentual que Trennepohl considera até grande para o mercado da companhia.

“O que anda dentro da terra às vezes serve no Brasil e não serve em nenhum outro lugar do planeta. O tipo de máquina da Austrália, por exemplo, não tem nada a ver com as nossas máquinas”, analisa Trennepohl.

Hoje, a Stara tem presença forte na América Latina, mas também está no Leste Europeu, Ásia, Oceania e África.

No continente africano, a companhia está se preparando para instalar uma unidade na África do Sul no segundo semestre deste ano.

“Já temos um mercado significativo por lá, mas agora essa unidade vai ficar mais perto do mercado africano, com as montagens e até alguma coisa de componentes que possa ser compartilhada conosco”, afirma Trennepohl.

Fora do Brasil, a Stara também tem uma fábrica na Argentina, localizada na cidade de Rosário, inaugurada em 2019.

A expectativa de Trennepohl é elevar o faturamento no país vizinho em dez vezes nos próximos anos. “A gente quer chegar em 2030 com 100 milhões de dólares no faturamento da Argentina. Hoje, é de 10 milhões de dólares”, afirma.

Trennepohl associa a possibilidade de expansão na Argentina à eleição do presidente argentino Javier Milei, que assumiu o cargo no fim de 2023.

“Com a entrada do Milei, voltamos novamente a ter oportunidade de exportarmos máquinas, porque antes não tinham nem como nos pagar, porque não tinha dólar no país”, afirma Trennepohl.

A companhia também estuda entrar no mercado americano, segundo Trennepohl. “E não é só sonho, é algo planejado já”, adianta o executivo.

A Stara participou pela primeira vez, no ano passado, da tradicional feira de máquinas Farm Progress Show, maior evento agrícola ao ar livre dos Estados Unidos.

“A gente já está fazendo um estudo de mercado e, é claro, um plano de investimento junto. Neste ano, vamos estar novamente na feira e acho que vamos, a partir de então, ter uma ideia se vamos ou não vamos para o mercado americano”, adianta Trennepohl.

A Stara chegou a abrir seu capital, mas o fechou em 2023, segundo Trennepohl. “A gente acha que o crescimento orgânico é mais salutar. A bolsa no Brasil é uma oportunidade de você capitalizar, mas a gente não tem um plano de aquisições, por exemplo”, diz o presidente do conselho da companhia.

Cinco executivos da companhia, entre eles Gilson Trennepohl, foram multados em R$ 982 mil pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em janeiro do ano passado, por não entregar o balanço de 2022 e não ter convocado a assembleia geral da companhia.

Máquinas expostas em estande da Stara na Expodireto Cotrijal

Sem política

A Stara e seu dono ficaram mais conhecidos nos últimos anos pelas posições políticas de Trennepohl, que apoiou abertamente o ex-presidente Jair Bolsonaro durante as eleições de 2022, inclusive com doações à campanha.

Em um comunicado a fornecedores logo após o primeiro turno do pleito, a Stara chegou a dizer que iria diminuir o orçamento do ano seguinte em 30% caso o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vencesse a disputa.

A empresa acabou sendo processada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por coação eleitoral e, em abril de 2023, fechou um acordo com o Judiciário, se comprometendo a pagar R$ 1,5 milhão em indenização por danos morais coletivos.

Filiado ao União Brasil, Trennepohl continua presente na política – acaba de se reeleger vice-prefeito de Não-Me-Toque na eleição municipal do ano passado –, mas não pretende alçar voo maior.

No passado, o dono da Stara já pensou em tentar a disputa por uma cadeira na Câmara dos Deputados ou no Senado, mas mudou de ideia.

“A política está ganhando os tribunais e essa perseguição que existe não é compatível para quem lida com o negócio. Acho que nem é salutar você ser um empresário e junto com isso ser um político, acho que não é o melhor”, diz Trennepohl.

O líder da Stara preferiu concentrar forças na administração da cidade-sede da companhia e no processo de transição familiar, com a empresa chegando à quarta geração da família Stapelbroek-Trennepohl.

Em 2020, Trennepohl passou o cargo de diretor-presidente ao filho, Átila Stapelbroek Trennepohl, e assumiu a presidência do conselho da companhia.

Toda a família está envolvida na operação. “Meu outro filho, mais velho, cuida da parte agrícola da família e minha filha é presidente do braço financeiro. A ideia é continuar com a família à frente”, afirma Trennepohl.

Todo o processo foi feito internamente, sem consultorias externas. “Somos autodidatas”, diz.

Aos 68 anos, Trennepohl não pensa em se aposentar. “Consigo tocar mais uns 20 anos. O meu trabalho já é muito pequeno, então, se eu for me aposentar, eu estou morto”, brinca o executivo.