Clima hostil, preços e rendas em baixa no campo. Quem faz negócios no agro tem sentido efeitos de um cenário mais complexo e muitas das empresas do setor têm refletido isso, de forma negativa, em seus balanços.

Entre os grandes bancos brasileiros, entretanto, a aposta no crédito rural e em outros produtos e serviços voltados ao produtor tem sido recompensada, mesmo nesses períodos mais difíceis;

É o que demonstram os relatórios financeiros do segundo trimestre de duas das instituições com as maiores volume de negócios com o agro do País, o Banco do Brasil (BB) e o Bradesco, divulgados esta semana.

Os dois bancos viram suas carteiras de crédito - soma de todos os empréstimos e financiamentos que estão em andamento -, exibirem bons desempenhos no segmento rural.

No Bradesco, por exemplo, de abril a junho, o crédito rural, um dos componentes da carteira destinada a pessoas físicas, cresceu 40,4% na comparação com o mesmo período de 2023, exibindo o melhor desempenho percentual entre os diversos segmentos destacados no balanço.

Em relação ao primeiro trimestre, a alta foi de 5,5%, também a maior entre as diferentes áreas.

No período, a carteira de crédito do banco privado somou R$ 381,8 bilhões, aumento de 5,7% ante um ano antes. A participação do agronegócio nessa fatia ficou perto de R$ 35 bilhões, segundo o analista da Ativa Investimentos, Pedro Dietrich.

Já os empréstimos e financiamentos para pessoas jurídicas somaram R$ 530,3 bilhões no segundo trimestre, total 4,5% acima do visto há um ano. Novamente, o crédito rural registrou a maior alta percentual no comparativo anual, de 32,3%, com contribuição perto de R$ 13 bilhões, disse a Ativa.

No BB não é diferente. Responsável por abocanhar a maior parte dos recursos do Plano Safra, disponibilizados pelo governo federal, o banco tem uma carteira de crédito destinada apenas ao agronegócio. No trimestre encerrado em junho, tal carteira cresceu 16,6% na comparação ano a ano, somando R$ 374,9 bilhões.

A distribuição do montante foi dividida em 33,2% para títulos do agro, 26,6% para operações de custeio e 18,6% para investimentos. Desta forma, o agronegócio mostrou “forte exibição” nos resultados do banco, avaliou a equipe de análise do setor financeiro da XP.

O Banco do Brasil prevê ofertar quase 55% dos recursos anunciados pelo governo federal para o Plano Safra 2024/2025, de R$ 475,5 bilhões. Dos R$ 260 bilhões a que tem direito, a instituição financeira já emprestou R$ 20 bilhões até 5 de agosto.

O desempenho robusto do agronegócio ajudou a alavancar a carteira de crédito consolidada do BB, que cresceu 13,2% em um ano, alcançando R$ 1,183 trilhão no segundo trimestre.

Agro pouco inadimplente

A tradicional baixa inadimplência dos produtores rurais, além de anos seguidos de crescimento e da relevância do setor para a economia brasileira, têm impulsionado as estratégias dos dois bancos, assim como muitos de seus concorrentes, de reforçar seu relacionamento com o campo.

O mais recente relatório trimestral do BB até aponta uma tendência de elevação nas taxas de inadimplência nos últimos trimestres. O banco viu o dado sair de 0,58% no segundo trimestre de 2023 para 1,32% um ano depois, alta de 0,74 ponto percentual (p.p.).

O motivo, segundo a instituição financeira, foram “questões conjunturais que afetaram o fluxo de caixa do produtor rural que cultivam, principalmente, soja”. Ainda assim, a taxa está bem abaixo da inadimplência consolidada do BB, que foi de 3,0% de abril a junho, alta de 0,27 p.p. ante o ano anterior.

Em contrapartida, o Bradesco viu o índice recuar em um ano, de 5,7% para 4,3% ao fim de junho deste ano. Apesar de ter uma participação pequena nos resultados do banco privado, de 8% na carteira de crédito, o analista destaca a qualidade do agronegócio.

Segundo Dietrich, cada vez mais, o setor chama a atenção de bancos pelo fato de clientes serem “pouco inadimplentes”.

“O agro tem essa característica, que é muito boa. A expansão dessa linha (do crédito rural) ajuda a melhorar a qualidade de crédito de bancos como o Bradesco, que vem procurando essa melhora e tem apresentado queda relevante de inadimplência”, comentou.

O segundo trimestre, ele ressalta, traz uma característica cíclica para o mecado: o fim da safra e dos recursos disponibilizados pelo governo federal. Com isso, o analista da Ativa reforça a tendência de o produtor rural, principalmente pessoa física, buscar crédito em outras instituições, o que refletiu na maior demanda por crédito rural do Bradesco entre abril e junho.

O banco foi uma das 21 instituições financeiras autorizadas a operar os recursos do Plano Safra 2023/2024, encerrado em junho, disponibilizados pelo governo. O montante ofertado pelo banco é destinado a médios e grandes produtores, com taxas de juros equalizadas pelo Tesouro Nacional.

“A demanda por esses recursos esgota antes do fim da safra. Então, sempre há um espaço para conceder crédito sem concorrer tanto com o subsídio mais forte do governo”, acrescenta.

Ainda sobre a safra 2023/2024, o Banco do Brasil reporta que desembolsou R$ 201,9 bilhões no setor agropecuário, alta de 6,4% na comparação com a safra 2022/2023. Todavia, ainda há outros R$ 27,8 bilhões destinados às cadeias de valor do agro, somando R$ 229,7 bilhões em recursos.

Pedro Dietrich observou que, por mais que as taxas de financiamento para o agronegócio sejam menores, com recursos do Plano Safra, bancos como o Bradesco consideram a relação risco x retorno em uma concessão de crédito.

“O risco é menor. O agronegócio é um setor que os bancos estão olhando e tentando atacar, ainda mais com o BB dominando o market share (participação de mercado)”, comentou.

O analista observa que o Bradesco vem tentando ficar mais próximo de agricultores e pecuaristas não apenas para empréstimo de dinheiro, como também para a oferta de outros serviços, o que contribui para a geração de novas receitas.

“O banco também busca formar relacionamento com o cliente e servir de outras maneiras, com oferta de seguros, cartão de crédito, por exemplo”, acrescentou.

No próximo balanço financeiro, o Bradesco já deve apresentar resultados da safra 2024/2025, iniciada em julho, junto com o terceiro trimestre. Até o ano que vem, o banco terá recursos de R$ 796,2 milhões do Plano Safra disponíveis para a agricultura empresarial.

Clientes do banco poderão ter acesso ao recurso também pela plataforma E-agro, que fechou o primeiro semestre com a marca de R$ 1 bilhão em créditos concedidos desde o seu lançamento, em maio de 2023. A expectativa do Bradesco é, até dezembro, ter pelo menos 70% a mais do tamanho que encerrou junho.

Em entrevista ao AgFeed, no mês passado, a head do E-Agro, Nadege Saad, disse que o gatilho para tal otimismo é justamente o Plano Safra, no qual a plataforma do Bradesco participa pela primeira vez.

O Banco do Brasil, que divulgou os resultados financeiros de abril a junho nesta quarta-feira, 7 de agosto, revisou as estimativas para a carteira de negócios sustentáveis no ano, que tem linhas de financiamento para o agro. A estimativa é de crescimento de 9% a 13%, ante projeção anterior de crescimento de 5% a 9%.

Para a carteira de crédito do agronegócio, a projeção foi mantida no intervalo de 11% a 15%, enquanto a carteira consolidada do BB deve crescer entre 8% e 12% em 2024.