O fato de a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30) ser realizada no Brasil, em Belém (PA), daqui a um ano, dará ao agronegócio um protagonismo inédito no evento.
Mas, para isso, o setor precisa fazer a lição de casa, com a adoção e divulgação de medidas de sucesso, públicas e privadas, para e mitigação do aquecimento global por meio da cadeia agrícola e pecuária
A avaliação é de líderes do setor e da academia presentes no Carbon Science Talks, organizado pela Bayer, em Campinas (SP).
A primeira medida ambiciosa já foi apresentada pelo Brasil na COP29, este mês, no Azerbaijão. O País propôs a redução de emissões de 59% a 67% até 2035, com base em 2005.
Na prática, significará sair de uma emissão de 2,5 bilhões de toneladas de CO2 equivalente para entre 1,05 bilhão a 850 milhões de toneladas de CO2 equivalente anuais.
“As metas brasileiras foram bastante ambiciosas na COP29 e a COP 30 é oportunidade de colocar na agenda o que não foi de interesse das outras conferências”, disse Carlos Cerri, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) e diretor da CCarbon.
Ele criticou as declarações “mentirosas” de líderes durante o evento deste ano de que os alimentos são os maiores responsáveis pelo aquecimento global.
“Os dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas mostram que 82% das emissões são queima de combustíveis fósseis.”
Segundo Cerri, a agricultura será fundamental para o cumprimento dessa meta com ao menos quatro iniciativas. “A implantação do plano do clima, do plano nacional de conversão de pastagens degradadas e do projeto combustível do futuro, baseado em biocombustíveis se unem à ampliação do Plano ABC+ nesse desafio”, disse.
De acordo com Bruno Brasil, diretor de sustentabilidade, produção e irrigação do Ministério da Agricultura, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, da sigla em inglês), ou seja, a parte que cabe ao Brasil na redução de emissões, precisa ser liderada pelo Ministério da Fazenda.
“A agenda climática é fundamentalmente econômica que coloca requisitos ambientais dentro da agenda econômica do século 21. Política setorial do agro, adaptação à mudança do clima e plano mitigação são exemplos”, afirmou.
“Políticas climáticas, como o ABC+, vão receber cada vez mais incentivos do governo, que prepara outros programas de incentivo econômico, como o para manutenção de excedentes de reserva legal”, completou.
O CEO da Bayer no Brasil, Marcio Santos, considera que o agronegócio precisa ampliar o posicionamento como setor mitigador de emissões e não só como produtor de alimentos.
“O agro é o centro da transição energética e precisará se posicionar não só como ‘food’, mas também como ‘fuel’. O Brasil dentro do planeta está em posição favorável e é de onde a expansão virá com a transição energética”, afirmou o executivo.
Para o CEO da Bayer, o produtor brasileiro é sustentável graças à ciência aplicada há anos nas lavouras, o que precisa ser mostrado em fóruns de discussão sobre clima. “Eu já era otimista e, sem dúvida, tem muito o que a gente pode fazer a partir de iniciativas do agro”.
O Brasil deve iniciar 2025 como a 73ª nação com uma jurisdição para o mercado de carbono. Segundo o diretor presidente da Câmara do AgroCarbono do Ministério da Agricultura e do Instituto de Estudo do Agronegócio (IEAg), Eduardo Bastos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve sancionar, no próximo dia 12 de dezembro, a lei que regulamenta o mercado de carbono no País.
Apesar de o setor primário da agricultura e pecuária estar fora do escopo, a legislação impacta toda a cadeia fora da porteira, incluindo a agroindústria. A lei tem dois anos para ser regulamentada, mas Bastos acredita que a pressão ambiental deve encurtar esse tempo.
Pela lei, uma empresa que emitir até 10 mil toneladas de CO2 por ano não precisa reportar essa emissão, o que é obrigatório para as da faixa entre 10 mil toneladas e 25 mil toneladas anuais.
“Para as que emitem acima de 25 mil toneladas de CO2 por ano é necessário um report e a conciliação. Isso fomenta o mercado de carbono com as empresas que têm crédito”, explicou Bastos.
Iniciativas
De olho na COP30, uma das iniciativas apresentadas durante o Carbon Science Talks foi o primeiro modelo de cálculo de captura de carbono desenvolvido no Brasil para a agricultura brasileira e apresentado pelos pesquisadores Daniel Potma, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e Luís Barioni, da Embrapa Digital.
O modelo é considerado inovador por utilizar cálculos mais simples a partir da emissão e mitigação de carbono na produção agrícola e por definir por quanto tempo esse carbono fica “sequestrado” antes de ser transformado novamente em gás carbônico.
O evento apresentou também a primeira mensuração da pegada de carbono para a cultura do algodão no País. A pesquisa foi realizada a partir de dados primários na Footprint PRO Carbono, calculadora desenvolvida pela Bayer e Embrapa, com apoio da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa).
O cálculo foi feito com dados de produtores de soja de Mato Grosso já participantes do programa PRO Carbono Commodities e que também plantam algodão representando uma área de aproximadamente 77 mil hectares.]
A partir de dados primários dos cotonicultores parceiros a pegada de carbono mensurada pela Footprint PRO Carbono para a pluma do algodão é de 329 quilos de CO₂ por tonelada, com potencial de redução de até 32% no estado, baseado na performance de alguns dos talhões usados no cálculo, segundo os pesquisadores.
“Este é um ponto de partida para entendermos a dinâmica das emissões no cultivo do algodão, o impacto de intervenções e as particularidades entre regiões, contribuindo para estabelecer uma média nacional para a cultura. Junto a agricultores e parceiros, estamos desenvolvendo soluções para escalar a agricultura regenerativa”, afirmou Marina Menin, diretora do Negócio de Carbono da Bayer para a América Latina.