Enquanto governos nem sempre concordam, em busca da descarbonização do planeta, grandes companhias globais seguem tentando acelerar projetos para garantir a redução das emissões de gases de efeito estufa ao longo da cadeia produtiva. Para isso, trabalhar em conjunto, pode fazer a diferença.

A norueguesa Yara, de fertilizantes, está anunciando mais um passo na parceria que já tinha com gigante global de alimentos PepsiCo. As duas empresas estão iniciando um projeto piloto de produção de batatas com menor pegada de carbono no Brasil.

Em julho do ano passado, a Yara e a PepsiCo lançaram para o Reino Unido e União Europeia um programa para fornecer produtos e orientações de nutrição de plantas, além de ferramentas digitais de agricultura de precisão, para os produtores de batata.

O foco era aumentar a eficiência do uso de nutrientes, melhorar a produtividade e reduzir a pegada de carbono das lavouras. A Yara, líder em nutrição de plantas na Europa, será responsável pelo fornecimento dos produtos e serviços à PepsiCo.

Agora, a iniciativa chega ao Brasil a partir de um projeto piloto, que envolve 120 hectares de plantação de batata na região Sul. Serão beneficiados, inicialmente, seis agricultores do Paraná que fornecem o produto para a PepsiCo.

A empresa conta, ao todo, com 23 produtores de batata, em seis estados brasileiros. E todos eles vêm sendo envolvidos, de alguma forma, num programa chamado PepsiCo Positive, que tem como um dos pilares o incentivo a práticas de agricultura regenerativa. São trabalhados temas como maior uso de cultivos de cobertura, para fortalecer a saúde do solo, a adoção de mais biológicos no manejo de pragas e doenças e questões relacionadas à nutrição.

“Estamos expandindo essas práticas, hoje usando já em mais de 90% da área. Essa parceria com a Yara vem para somar nessa agenda”, afirmou Felipe Carvalho, diretor de Agronegócio da PepsiCo do Brasil, em entrevista ao AgFeed, ao lado do CEO da Yara Brasil, Marcelo Altieri.

Como os fertilizantes nitrogenados sempre foram apontados como responsáveis por boa parte das emissões na agricultura, o uso de um produto especial da Yara, de menor pegada de carbono, é o principal diferencial do projeto.

“A linha que nós estamos posicionando de nutrição junto com o PepsiCo, hoje para agricultores de batata, a nossa Yara Climate Choice, é uma linha de fertilizantes que são produzidos com energia renovável. Nesse caso, são produzidos à base de biometano”, explicou Altieri.

Segundo o CEO da Yara, em função das características desse fertilizante já possível afirmar que há um potencial de reduzir em 40% as emissões de carbono na produção das batatas.

O plantio das áreas que fazem parte do projeto piloto começou em agosto e a colheita da primeira safra de “batata de baixo carbono” está prevista para o primeiro semestre do ano que vem. A previsão é obter uma produção entre 3,5 mil e 4 mil toneladas de batata.

No Brasil, a Yara já desenvolve um projeto semelhante com produtores de café. Em parceria com a Cooxupé, a maior cooperativa do setor, já foram colhidos os grãos com menor pegada de carbono e há a expectativa de comercializar o café com preços melhores, em função disso.

“Temos o potencial de ampliar para todas as culturas onde o PepsiCo hoje é ativa”, destacou Altieri.

O diretor da multinacional de alimentos também está otimista em relação à expansão do projeto. “A gente vai convidar todos os nossos agricultores para conhecer o projeto agora (nas fazendas demonstrativas) e a ideia é que no próximo ano a gente expanda para mais agricultores e consiga avançar relativamente”, disse Carvalho.

A pegada de carbono na produção de batatas será medida por uma ferramenta chamada Cool Farm Tool, que fornece métricas padronizadas para quantificação dos gases de efeito estufa, biodiversidade, uso de água, e perda e desperdício de alimentos. O sistema faz a rastreabilidade do processo, de ponta a ponta.

Ambos os executivos ressaltam que o projeto não se restringe ao uso do fertilizante diferente. As outras práticas também devem influenciar nos resultados, por isso a redução pode até ficar acima dos 40%.

“A gente traz nessa parceria toda a expertise da Yara em uso eficiente de nutrientes. Então a Yara tem uma equipe agronômica super especialista que está ajudando esses agricultores a usar da melhor maneira, no tempo correto, na quantidade correta, realmente fazer fertilização de precisão”, acrescentou Felipe.

O foco seria também alcançar ganho de produtividade por hectare, gerando mais rentabilidade ao agricultor.

“Além de baixar as emissões na produção de um fertilizante, conseguimos também adicionar mais rendimento, mais produtividade para o agricultor e conseguimos também melhorar a qualidade das batatas, melhorar o açúcar, a matéria seca, todos os fatores e elementos que a PepsiCo precisa para ter uma batata de qualidade em seu produto final”, disse Altieri.

Nesse sentido, a PepsiCo também pretende usar os atributos alcançados no programa, como apelo de marketing.

“Hoje a gente fala das nossas batatas, tanto de Lays, clássica, de Ruffles original, que são além da excelência em qualidade. É um produto que tem somente batata, óleo e sal. Agora a gente vai poder falar que tem batata, óleo e sal somente e ainda é eficiente em carbono”, destacou Carvalho.

As duas empresas vão detalhar o projeto durante um painel na COP 30, no próximo dia 19 de novembro.

“É um excelente exemplo para levar para COP e mostrar que o Brasil está na vanguarda, mostrar como o Brasil trabalha. Primeiro no café, agora na batata, no futuro o cacau, assim como muitas outras oportunidades que podemos ter nessa parceria”, completou o CEO da Yara.

Sem mudança no preço

A estratégia do projeto não inclui pagar um preço diferenciado para a batata produzida com o fertilizante de menor pegada de carbono.

O projeto, porém, é “financiado” pelas empresas, especialmente pela PepsiCo, que está cobrindo a diferença de preço entre o fertilizante “verde”, da Yara, e o produto tradicional.

Nenhuma das companhias revela números sobre qual o valor investido para isso no Brasil, nem a meta do projeto no País. Os detalhes do acordo são conhecidos apenas em relação a outros mercados.

Na Europa, por exemplo, até 2030, a Yara fornecerá até 165 mil toneladas de fertilizantes por ano para a PepsiCo, cobrindo cerca de 25% de suas necessidades de fertilizantes para culturas na região. Considerando a parceria na Europa e no Reino Unido são aproximadamente 1 mil fazendas, totalizando cerca de 128 mil hectares.

Na América Latina, a parceria foi implementada inicialmente no México, Colômbia, Chile e Argentina. Anunciada em maio deste ano, prevê beneficiar mais de 20 agricultores, cobrindo aproximadamente 700 hectares de campos de batata.

O fato é que, no Brasil, além do custo do fertilizante mais caro, as empresas também gastam ao disponibilizar técnicos em campo que estão dando assistência aos produtores.

“Estamos fazendo que esse acordo não represente um custo a mais para o agricultor. Então, nós estamos assumindo todos os custos de pesquisa, treinamento do agricultor, técnica no campo. E o custo, basicamente, da transição energética, não vai para o agricultor, ele está pagando o mesmo valor que um fertilizante convencional”, reforçou Altieri.

A Yara não revela quanto mais caro é o fertilizante de baixo carbono, mas lembra que na matéria-prima, por exemplo, a fonte renovável pode custar 15 vezes mais.

“Um milhão de BTUs de gás fóssil no Golfo de México custa um dólar. Um milhão de BTUs de biometano, energia renovável, pode custar 15 vezes mais”, afirmou o CEO.

Altieri voltou a defender incentivos por parte dos governos para que a energia renovável, como o biometano, fique mais barata e acessível para toda a indústria.

Perguntado se há plano de pagar um prêmio no preço da batata, o diretor da PepsiCo disse que o suporte tem ocorrido de outra forma, especialmente no fomento aos agricultores que adotam as práticas regenerativas.

Ele defende que, no primeiro momento, a transição parece trazer um custo maior, mas na safra seguinte os produtores já pagam o investimento feito em função dos ganhos em produtividade e rentabilidade.

“Às vezes a gente ajuda, seja na adoção de plantas de cobertura, seja no investimento do sistema de irrigação. Nesse caso com a Yara, na diferença do custo de um fertilizante mais eficiente, para que produtor não assuma esse custo, a PepsiCo está entrando com uma participação, para que ele não seja impactado diretamente no custo”, citou Carvalho.

Metas de descarbonização

Ao desenvolver parcerias como essa, Yara e PepsiCo também seguem avançando para cumprir suas metas globais de descarbonização.

Marcelo Altieri explicou que a empresa norueguesa não está atuando no mercado de crédito de carbono, porém, com escopos 1 e 2, vem trabalhando no desenvolvimento dos fertilizantes de menor pegada, e outras ações, para reduzir suas emissões ao longo do processo produtivo.

“Nesse momento, a convicção da Yara e objetivo é ser carbono neutro em 2050. Já cortamos 30% de 2005 até hoje, vamos cortar outros 50% até 2030 “, disse.

Na PepsiCo, o diretor afirma que a situação é semelhante, com metas e relatórios globais divulgados anualmente.

“Estamos trabalhando não só na cadeia agrícola (que fornece a matéria-prima da indústria), mas também em transporte, manufatura, distribuição, tem iniciativas de diversas áreas”, pontuou.

As empresas destacam que a agropecuária seria responsável por 20% do total das emissões de GEE no mundo e que a produção e uso de fertilizantes correspondem a 11%, por isso a importância do acordo.

Resumo

  • Parceria global entre PepsiCo e Yara chega ao Brasil com projeto piloto de batata de baixo carbono em seis fazendas do Paraná
  • Fertilizante “verde” da Yara, feito com biometano, pode cortar até 40% das emissões de CO₂ no cultivo e elevar a produtividade
  • Projeto integra o programa PepsiCo Positive e será apresentado na COP 30 como exemplo de agricultura regenerativa no País.

Lavoura de batatas em propriedade de fornecedor da PepsiCo

Felipe Carvalho, diretor de Agronegócio da PepsiCo do Brasil

Marcelo Altieri, CEO da Yara Brasil