A semana começou com o desenrolar de mais um capítulo da guerra comercial entre Estados Unidos e China. Desta vez o tom é de trégua: os dois países anunciaram nesta segunda-feira, dia 12 de maio, um acordo temporário sobre o tarifaço mútuo que haviam estabelecido nos últimos meses.

A notícia trouxe um primeiro sinal de alívio ao longo do dia para os mercados globais, que reagiram positivamente, inclusive na Bolsa de Chicago.

Representantes dos dois países passaram o fim de semana reunidos em Genebra, na Suíça, e chegaram a uma decisão: as tarifas americanas sobre as importações chinesas cairão de 145% para 30%, enquanto que as taxas da China sobre os produtos dos Estados Unidos, por sua vez, serão reduzidas de 125% para 10%.

"Ambos os países representaram muito bem seus interesses nacionais", disse o secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, em um comunicado oficial. “Temos um interesse comum em um comércio equilibrado e os Estados Unidos continuarão caminhando nessa direção”, acrescentou.

Depois de meses empenhado em botar de pé seu grande tarifaço, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deu indícios de ter diminuído seu poder de fogo – ao menos, por enquanto. Em entrevistas a repórteres na Casa Branca, disse que a tarifa não deve voltar aos 145%, ainda que possa atingir níveis elevados.

Os mercados reagiram bem a mais um capítulo da novela do tarifaço ao longo de todo o dia. No fim de tarde desta terça-feira, os principais índices do mercado americano estavam em alta: Nasdaq registrava alta de 4,35%, S&P 500 subia 3,26%, e Dow Jones tinha ganhos de 2,81%.

Na bolsa americana de Chicago, os contratos futuros de soja dos próximos meses registraram ganhos entre 1% a pouco mais de 2% ao longo do dia, com destaque para a alta de 2,39% dos contratos com vencimento em setembro, cotados a US$ 10,5250 o bushel.

A valorização da soja em Chicago ocorre em função da expectativa de que a demanda pela soja americana, por parte da China, o país que mais importa o produto no mundo, poderá voltar, mas o cenário ainda é incerto.

Para Raphael Bulascoschi, analista de grãos da StoneX, a redução temporária das tarifas sobre produtos agrícolas pode gerar efeitos mistos no mercado de grãos brasileiro e mundial.

“Uma tarifa de 10% ainda é uma tarifa relativamente alta, não necessariamente alta, mas é uma tarifa que tende a tirar um pouco de competitividade ainda da soja norte-americana”, afirmou o analista em entrevista ao AgFeed. “Mas, claro, a gente espera então que a China possa encontrar os Estados Unidos como uma fonte de suas importações de soja ao longo do ano.”

Bulascoschi destaca que, em um primeiro momento, a reaproximação entre China e Estados Unidos tende a fortalecer as cotações da soja na bolsa de Chicago, mas também enfraquecer os prêmios pagos pela soja brasileira. “A entrada dos Estados Unidos no mercado exportador com menos tarifas cria um ambiente mais competitivo, pressionando os prêmios no Brasil”, afirma.

Apesar da queda nos prêmios, a alta das cotações em Chicago pesou mais e o preço da soja em reais nos portos brasileiros ainda teve leve valorização, o que viabilizou negócios entre produtores e tradings, nesta segunda-feira.

A expectativa do analista é de que exista um fortalecimento dos prêmios no segundo semestre. “Mesmo com a safra recorde neste ano, temos tudo para ver esses prêmios mais fortes até o final do ano, principalmente porque a China seguirá comprando soja brasileira no curto prazo.”

Essa dinâmica já tem se mostrado clara no mercado. "O prêmio chegou a bater 100 pontos acima e agora já caiu para 30, praticamente devolvendo toda a alta recente. Já caiu praticamente 70 pontos", diz Guilherme Kummer, diretor de originação e operações industriais da Fiagril, empresa de insumos e grãos de Mato Grosso.

A empresa movimenta cerca de 1,65 milhão de toneladas de grãos por ano. O foco da companhia está no mercado interno, mas a empresa exporta cerca de 10% desse volume. Apesar de controlada pelo grupo chinês Pengdu Agriculture, não há compromisso exclusivo com a China.

Kummer lembra que, embora o mercado do país dos controladores seja relevante, a empresa também abastece destinos como a América Central e a Europa. "Nos últimos meses, nossa participação nas exportações aumentou acima das projeções, principalmente entre fevereiro e abril", afirma o diretor da Fiagril ao AgFeed, ressaltando que a companhia buscou aproveitar as oportunidades surgidas durante a escalada dos prêmios.

"Nos últimos meses, nossa participação nas exportações aumentou acima das projeções, principalmente fevereiro, março e abril", comenta Kummer.

Apesar do momento positivo para vendas, Kummer alerta para os riscos inflacionários no médio prazo. "Por um primeiro momento, pode ser bom para o produtor, que pode ganhar dinheiro, ou até já ganhou. Mas no segundo momento, talvez essa tarifa, todo esse negócio volte com relação à inflação, aos custos maiores internos do Brasil, com aumento da ração, consequente aumento do preço da carne, aumento do combustível, que acaba ferindo diretamente também em nós como sociedade e o próprio produtor nesse ambiente”, explicou.

Como exemplo, Kummer cita o caso recente da molécula do herbicida cletodin, que é importada da China para o Brasil e cujo preço subiu 54% em apenas um mês devido às pressões internacionais.

A estratégia da Fiagril, segundo o diretor, tem sido orientar os produtores a aproveitarem os momentos favoráveis através de ferramentas de proteção de preços, como barter e derivativos.

O analista da StoneX lembra para o fato de que o momento atual, historicamente, é um período de menor importação de soja americana pela China. “Os Estados Unidos estão plantando a sua nova safra. E é justamente após a colheita da safra 2025/2026, que acontece a partir de setembro, que a gente deve ver os Estados Unidos mais ativos de novo no mercado de exportação de soja.”

Além disso, o analista lembra que a China já está com estoques cheios de soja brasileira. “A China tem menos motivos para sair comprando soja americana nesse momento. Ao longo de abril, a China fez compras de volumes muito expressivos de soja brasileira, justamente após o Brasil ter colhido uma safra que deve se consolidar como recorde”, avalia.

A pecuária também deve ser impactada pelo acordo temporário entre China e Estados Unidos, grandes parceiros comerciais do setor de bovinos, aves e suínos. A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) recebeu de forma positiva o anúncio do acordo entre Estados Unidos e China. O entendimento é de que a trégua nas tarifas, firmada após semanas de tensões, contribui para um ambiente mais favorável ao comércio internacional.

Para a entidade, o avanço das negociações entre os dois países traz estabilidade ao mercado global de proteínas, “ainda que temporária”, nas palavras da associação. “Uma guerra tarifária não gera benefícios a nenhuma nação”, finalizou a ABPA.

Resumo

  • Estados Unidos e China anunciaram nesta segunda-feira um acordo temporário sobre tarifas mútuas que os dois países haviam estabelecido entre si nos últimos meses
  • Tarifas americanas sobre importações chinesas cairão de 145% para 30%; taxas da China sobre produtos dos Estados Unidos serão reduzidas de 125% para 10%
  • Contratos futuros da soja reagiram bem à notícia ao longo do dia, registrando ganhos entre 1% a 2%