Uma das polêmicas que marcou o ano de 2024 na agropecuária terá mais um capítulo nesta terça-feira, 17 de dezembro, quando o Ministério da Agricultura anuncia um plano nacional para a rastreabilidade do rebanho de bovinos no País, o Plano Nacional para Identificação de Bovinos e Búfalos.

Pressionado por algumas empresas do setor de carnes, o governo chegou a sinalizar, no ano passado, que poderia implementar de imediato um sistema de rastreabilidade obrigatória.

Com a notícia, sobraram críticas por parte de lideranças dos produtores rurais e até mesmo especialistas em pecuária. Um rebanho de mais de 200 milhões de cabeças e um País com dimensões continentais fazem parte do cenário desafiador.

Uma das razões é que, há mais de 20 anos, uma iniciativa semelhante ter praticamente fracassado no Brasil – na época foi criado o Sisbov, de rastreabilidade, para atender exigências da União Europeia. Não houve recompensa para o produtor que investisse em tecnologias para identificar seus animais e muitos acabaram preferindo fornecer a empresas que atendiam o mercado interno.

O fato de o Brasil ser o maior exportador mundial de carne bovina, ter um rebanho de mais de 200 milhões de cabeças, segundo o IBGE, e ser um País com dimensões continentais ajudam a entender porque é tão desafiadora a implementação da rastreabilidade total.

O sócio diretor da Athenagro, Mauricio Nogueira, destacou esse ano em sua coluna no AgFeed, o desafio que envolve mapear fornecedores diretos e indiretos dos frigoríficos.

“Nas últimas duas edições do Rally da Pecuária, os produtores que compram animais de outros fornecedores disseram se relacionar, em média, com 10 a 11 pecuaristas. Incluindo os diversos níveis de fornecedores indiretos, cada fornecedor de gado para abate se relaciona, em média, com 110 criadores e recriadores de bezerros. E quanto maior for a escala de abate, maior será a dependência de fornecedores indiretos de diversos níveis, salvo raras exceções”, dizia o texto.

O AgFeed apurou que o anúncio desta terça-feira deve atender, pelo menos parcialmente, anseios de produtores e de frigoríficos.

O objetivo de tornar obrigatória a rastreabilidade do rebanho foi mantido, disseram fontes ouvidas pelo AgFeed. Porém, será uma implementação gradual, que se estenderá até 2032.

O plano que será apresentado foi criado, principalmente, a partir de reuniões de um grupo de trabalho que se dedicou ao tema a partir de maio deste ano.

O programa terá início em janeiro de 2025 e, nos primeiros dois anos, será dedicado a criação de um sistema eletrônico de identificação, que precisa ficar apto à integração com os controles estaduais.

A partir daí, quando o sistema estiver pronto, qualquer pecuarista já poderá aderir de forma voluntária, se quiser.

No terceiro ano, já entraria a primeira “obrigação” para pecuaristas. Animais submetidos a vacinas estabelecidas pelo Mapa, como a imunização contra a brucelose obrigatória para fêmeas, ficam sujeitos à exigência de identificação com brincos (atualmente era feita apenas uma marcação por fogo, prática que também tende a ser extinta na pecuária, por questões de bem estar animal).

Já no sétimo ano do programa haverá a mudança mais expressiva. Todos os bezerros que tiverem algum tipo de movimentação, ou seja, transporte para o frigorífico ou comércio entre fazendas, precisarão estar identificados, individualmente.

A expectativa é que a partir de 2032, portanto, o Brasil já caminhe para um cenário onde seria possível rastrear 100% do rebanho.

Para os frigoríficos esta não foi a solução ideal. Muitas empresas esperam com essa identificação sanitária para basear os sistemas que visam fazer o rastreio das fazendas do ponto de vista ambiental, podendo comprovar, por exemplo, que determinado lote de carne bovina não tem qualquer relação com áreas onde houve desmatamento.

Por outro lado, dizem fontes do setor, os frigoríficos também admitem que uma obrigação de imediato poderia deixar a maior parte dos pecuaristas na ilegalidade, o que também não seria bom para a cadeia como um todo.

Entre as lideranças dos produtores, o sentimento é semelhante. “O ritmo que foi preconizado pode ser factível para o pecuarista”, disse um deles.

De qualquer forma, a expectativa é de que o real incentivo para que produtores façam a adesão ao programa ocorra quando a cadeia conseguir viabilizar um valor maior para o produto rastreado.