Redes sociais e grupos de mensagens ligados a vários setores do agronegócio estão agitados desde a tarde do último domingo, 5 de novembro. O tom é de reprovação em relação a pelo menos duas questões incluídas na prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que trazem como referência textos críticos à produção agropecuária no Brasil, considerados como “ideológicos” por produtores, empresários e até entidades do setor.
Ao longo dessa segunda-feira, as manifestações que antes estavam dispersas começaram a se materializar na forma de notas divulgadas por associações setoriais. Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Sociedade Rural Brasileira (SRB) e Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), por exemplo, defenderam a anulação de questões com esse tom e prometeram atém esmo recorrer à justiça para atingir esse objetivo.
Uma das primeiras foi emitida pela Associação dos Criadores do Mato Grosso (Acrimat). A associação, que reúne pecuaristas e a indústria da carne no estado, considerou “um completo absurdo elaborar questões que não servem para avaliar conhecimento, mas sim para acusar, sem fundamento, toda a agropecuária nacional”.
As questões mais polêmicas foi a de número 89 da prova do domingo, formulada a partir do texto “Territorialização do agronegócio e subordinação do campesinato no Cerrado”, assinado pelos acadêmicos Manoel Calaça, José Novais de Jesus, ambos da Universidade Federal de Goiás, e Edson Batista da Silva, da Universidade Estadual de Goiás.
O trecho destacado no exame afirma que “no Cerrado, o conhecimento está cada vez mais subordinado à lógica do Agronegócio” e aponta como “fatores negativos” desse contexto “a mecanização pesada, a ‘pragatização’ dos serem humanos e não humanos, a violência simbólica, a superexploração, as chuvas de veneno e a violência contra a pessoa”.
Em outro ponto, na questão 71, o trecho base da pergunta é um artigo de Ariovaldo Oliveira, publicado em 2006 na revista Terra Livre, com o título "A Amazônia e a nova geografia da produção de soja".
No trecho destacado, o autor afirma que “alternativas logísticas estão servindo de instrumentos que ativam os mercados especuladores de terras nas diferentes regiões da Amazônia e constituem em indicadores utilizados por diferentes atores para defender ou denunciar o avanço da cultura da soja na região e, com ela, a retomada do desmatamento”.
Ainda no domingo, reproduções das duas perguntas serviram como ilustração para textos protestando contra sua utilização na prova. Um dos mais compartilhados nas redes sociais foi postado por Gustavo Spadotti de Castro, chefe-geral da Embrapa Territorial. “Para que promover esta desinformação aos nossos jovens? Quem ganha com estas mentiras? Qual o objetivo destes ataques ao setor agropecuário?”, questionava ele.
Outra postagem bastante difundida foi feita pelo economista e especialista em cadeias produtivas do agronegócio Marcos Fava Neves.
“Sabe quando o zagueiro de um time dá um chutão para dentro do próprio gol? Foi minha sensação ao ver esta questão do ENEM de ontem”, escreveu ele, referindo-se ao texto da questão 48. “Cabe ainda nesta segunda-feira cedo um processo para anulação desta questão”, sugeriu.
No começo da tarde da segunda, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) emitiu nota afirmando que “aguarda posicionamento urgente do governo federal brasileiro sobre questões de cunho ideológico e sem critério científico ou acadêmico dispostas no Exame Nacional do Ensino Médio”.
A entidade, da mesma forma, defendeu a anulação das “perguntas são mal formuladas, de comprovação unicamente ideológica” e afirmou que tomaria, ainda, ações como o requerimento de convocação do Ministro da Educação, Camilo Santana, para audiências na Câmara dos Deputados e no Senado, além de solicitar informações sobre a banca organizadora do exame e as referências bibliográficas utilizadas na sua elaboração.
“Consideramos, no mínimo, um perigoso desserviço à nação a apresentação nas provas de questões direcionando foco unilateral em críticas sobre um tema tão complexo como a atividade agropecuária no País”, escreveu, em nota, o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag).