Se havia no ar alguma expectativa de algo novo, os dois principais dados de mercados da sojicultura, conhecidos nesta terça-feira, 12, não trouxeram nada com poder de alterar as projeções da safra brasileira, que está no fim da pista de decolagem para início do plantio 2023/24.

A nova safra americana reduzida mais um pouco pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), para 112,8 milhões de toneladas, já não impactava as previsões parao Brasil mesmo quando as previsões americanas eram de quase 10 milhões de toneladas a mais, observadas há alguns meses.

Aqui, vale o parêntese de que os produtores brasileiros não se balizam pela oferta dos Estados Unidos, historicamente, mesmo que isso cause reflexos em preços. Uma das razões, como destaca a gestora do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), Vânia Gach, é que não há culturas substitutas para se sobrepor à da soja, pelo seu peso de demanda internacional, tamanho de área e, inclusive, pela janela de calendário.

A outra estatística veio da Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), atualizando o ciclo brasileiro em 157,3 milhões de toneladas e inflando um pouco mais a média traçada pelo mercado. O que, por si só, adiciona mais pressões sobre os preços.

Da porteira para dentro, no Brasil, segue o jogo desenhado pelas previsões médias da maioria dos analistas e produtores. As 163 milhões de toneladas, inclusive estimadas pelo USDA também, só não estarão totalmente asseguradas se houver uma descarrilhada no clima, em um período de véspera do super El Niño.

Neste cenário, Vânia prefere esperar até o final de outubro para bater o martelo. O que se sabe, desde já, é que vai ser um novo ciclo cheio, como a sojicultura se refere em períodos de recordes, mesmo que aquele patamar não seja atingido.

Para o Mato Grosso, líder em tudo no negócio da soja, a estimativa de safra, no entanto, foi reduzida em 4% pelo instituto de pesquisa, mas contado pelo ângulo da produtividade prejudicada por menores investimentos ante custos ainda elevados de produção e preços achatados. Registra-se em torno de 43,7 milhões de toneladas.

Mais uma vez entra alguma incerteza quanto aos resultados das chuvas.

De todo modo, em nível nacional, só um desastre climático de proporções épicas, lembra a economista, pode fazer com que não se ultrapasse as 155 milhões de toneladas de 2022/23 – ou 154,5 milhões, segundo a Conab, ou as 157,3 milhões destacadas pela Abiove.

Quanto à área para 2023/24, não há mais o que esperar quanto de recuos – ou avanços –, fora alguma margem de erro estatístico, pela simples razão de que os números vêm sendo confirmados desde o primeiro semestre, sem alterações mesmo quando a soja vinha (e vem) com preços ruins frente a 2022.

Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting, por exemplo, não crê nada abaixo dos 45 milhões de hectares. “Pela primeira vez o Brasil passa essa marca na história”.

Vale lembrar, voltando ao Mato Grosso, que pode lançar as primeiras sementes no solo a partir do dia 16, que o Imea trabalha com uma pequena margem acima dos 12,12 milhões de hectares relativos à temporada anterior.

Porteira para fora

O desafio para 2013/24 vai ser a cotação, como vem sendo a comercialização da safra 2022/23.

Ainda há alguma coisa que pode ser alterada na produção dos Estados Unidos, na medida em que a colheita, mesmo começando em poucos dias, ainda enfrentará lavouras em estágio final de desenvolvimento. E o tempo seco e quente segue no radar.

Mas, ante as 122 milhões de toneladas, que se acreditava nas primeiras projeções do USDA, não deverá sofrer quedas mais bruscas.

O que vai prevalecer em termos de pressão sobre os preços, além da confirmação do ciclo brasileiro que entra mais ofertado, é o carrego da soja velha ainda com muita coisa para ser exportada pelo Brasil. Recorda-se que a safra passada foi recorde.

Em cenário de muita oferta, avalia Vlamir Brandalizze, as baixas nas exportações e estoques americanos de setembro, frente a agosto, são pequenas. Ficaram, respectivamente, de 49,6 para 48,7 milhões de toneladas, e de 6,67 para 5,99 milhões de toneladas, segundo o USDA.

Nesse ponto, ele vê mais turbulências para os preços, porque as estimativas de exportações brasileiras são ainda superiores às 97 milhões de toneladas que a agência governamental americana previu no recente relatório.

Seriam 100 milhões de toneladas no ciclo atual – restando 16 milhões para serem embarcadas -, em linha aproximada pela estatística da Abiove, e de 105 milhões na temporada que vai ser iniciada.

Nesse cruzamento geral, mesmo se mantendo a China com 100 milhões de toneladas de importações totais, o retrato é pouco promissor, como lembra Adriano Gomes, analista da AgRural. Além de destacar os prêmios ruins e câmbio desfavorável em 2023, ao AgFeed ele mostrou dois levantamentos deste início de semana.

A saca de soja em Dourados (MS) para entrega em fevereiro está negociada em torno de R$ 116, enquanto há um ano valia R$ 158. Na Chicago Board of Trade (CBOT), o bushel na segunda 11, de maio 2024 fechou em US$ 13,95; em maio 2023, foi US$ 14,23.

Em tempo: mesmo com o USDA refletindo nova queda de produção dos Estados Unidos, nesta terça todos os contratos caem forte, acima de 22 pontos.