A sucessão de safras recordes de soja no Brasil tem um outro lado da moeda, que vai além da exportação do grão: a corrida das indústrias processadoras para ampliar a capacidade de esmagamento e dar conta da demanda crescente pelos derivados da oleaginosa.
A Abiove, Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais divulgou a edição 2023 da chamada pesquisa de capacidade instalada, a qual o AgFeed teve acesso.
O levantamento mostra que a capacidade de processamento de oleaginosas este ano vai atingir 69,2 milhões de toneladas, acima das 65,5 milhões de toneladas de 2022.
Com isso, a indústria passa a ter condições de processar 209.632 toneladas por dia, um aumento de 5,5% em relação ao ano passado.
Em entrevista ao AgFeed, Daniel Furlan, diretor de Economia e Assuntos Regulatórios da Abiove, que representa as indústrias de óleos vegetais, disse que um aspecto interessante deste avanço é que ele ocorre não apenas por projetos de ampliação, mas também pelo fato de algumas plantas que estavam paradas terem sido reativadas.
Agora são 106 unidades ativas, ante 95 na pesquisa do ano passado. Já o número de plantas paradas caiu de 27 para 22. A pesquisa mostra ainda que as unidades industriais de processamento subiram de 122 para 129, mas o número de empresas que se dedicam ao segmento avançou pouco, de 62 para 63.
O estudo da Abiove mostrou também uma perspectiva para 2024. Considerando os anúncios já feitos pelas empresas ao mercado, a entidade contabilizou R$ 6 bilhões em investimentos para expansão do processamento de soja, que devem resultar em 19.000t/dia adicionais no esmagamento.
"O Brasil já é um grande exportador de soja em grão, mas se as empresa decidem construir uma planta de esmagamento, significa que elas estão vendo espaço no mercado para também vender mais farelo e óleo”, explicou Furlan.
A pesquisa mostrou um aumento significativo na capacidade de processamento no Centro-Oeste, de 84.682t/dia em 2022 para 92.790t/dia este ano. A região é responsável por 44,3% do processamento total de oleaginosas no Brasil e tem como destaque as indústrias de Mato Grosso (23,5% de participação) e Goiás (13,6%).
Já os estados da região Sul apesar de terem ampliado a capacidade de processamento, tiveram leve recuo na participação total, que agora ficou em 34,1%.
Impulso do biodiesel
A safra de soja 2022/2023 foi estimada pela Abiove em 157,3 milhões de toneladas. Deste total 99 milhões são exportadas em grão, principalmente para a China.
Já o processamento de soja pelas indústrias instaladas no Brasil está projetado em 53,5 milhões de toneladas para 2023, é um avanço em relação às 50,9 milhões esmagadas no ano anterior.
"Por mais que o processamento venha aumentando cerca de 5% ao ano, a produção brasileira de soja também cresce muito, por isso não há uma mudança significativa entre o percentual que fica no mercado interno e o que vai para a exportação", comentou o executivo.
Daniel Furlan afirmou que "no caso do óleo de soja há um cenário bem interessante desde o início do ano quando a mistura obrigatória de biodiesel no diesel foi para 12%, o que trouxe uma previsibilidade muito importante para os empresários".
O executivo também destacou perspectivas otimistas no setor após o anúncio do programa "Combustível do Futuro", do governo federal, que prevê incentivos para o diesel verde e para o SAF, biocombustível de aviação.
O AgFeed mostrou recentemente que a indústria do biodiesel espera que o governo autorize um aumento da mistura para 15%, o que poderia ser implementado a partir de março de 2024.
Sobre este tema, Daniel Furlan disse que não como prever a decisão que será tomada, mas garantiu que a diferença entre o que mostrou a pesquisa de capacidade instalada e o que realmente vem sendo processado hoje mostra que a indústria realmente parece estar preparada para um aumento na demanda por óleo, em função do biodiesel.
Caso o B15 venha a vigorar a partir de março, a Abiove estima que a demanda por óleo no próximo ano poderia subir de 5,4 milhões de toneladas para 6,4 milhões de toneladas. Para produzir 1 milhão de toneladas de óleo de soja é necessário esmagar 5 milhões de toneladas de soja.
Outro fator que costuma influenciar a decisão da indústria é o mercado de farelo de soja, que em 2023 esteve aquecido em função da quebra de safra na Argentina. As exportações brasileiras de farelo devem atingir o patamar recorde de 22 milhões de toneladas, ante 20,4 milhões no ano passado.