Há pelo menos três anos seguidos a expressão "safra recorde” é repetida todos os meses quando são divulgados os levantamentos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Hoje foi diferente. O relatório mostrou que a produção deve cair 1,5% na temporada 2023/2024, ficando em 317,5 milhões de toneladas. Este foi o primeiro levantamento completo para a safra que já está sendo plantada.
O principal motivo para que a projeção menor é a queda nos preços do milho, que desestimulou os produtores a plantar o cereal na safra de verão – cultivada principalmente na região Sul – com chances de afetar também a segunda safra, conhecida como “safrinha”, mas que há anos é a maior do País.
A estimativa da Conab é de uma redução de 4,8% na área plantada, que deve ficar em 21,19 milhões de hectares, considerando as três safras cultivadas no Brasil. Uma redução no cultivo do milho não era observada nos levantamentos da Conab desde a safra 2017/2018.
A produtividade média também deverá ser reduzida em 4,9%, ficando em 5.636 quilos por hectare. Com isso, a produção total de milho esperada é de 119,4 milhões de toneladas, abaixo das 131,8 milhões de toneladas da safra passada.
Somente a segunda safra de milho, que é aquela plantada principalmente no Paraná e no Centro-Oeste, após a colheita da soja, deve produzir cerca de 9 milhões de toneladas a menos, com menor área plantada e produtividade mais baixa.
Um dos fenômenos que leva a esta situação é a decisão do produtor de apostar no algodão como cultura prioritária na segunda safra, já que a rentabilidade tem sido bem mais alta.
Ismael Menezes, sócio-diretor da MD Commodities disse ao AgFeed que apenas 50% do volume de ureia que deveria ter sido vendido para o plantio da segunda safra de milho foi comercializado.
"O menor uso de fertilizante impacta a produtividade, portanto a redução não será apenas de área", alertou.
A consultoria acredita, no entanto, que a produção não será tão baixa quanto prevê a Conab. A expectativa é chegar em 126 milhões de toneladas de milho na safra total, comparado com 136 milhões de toneladas que o Brasil teria produzido em 2022/2023, segundo a MD.
"Os Estados Unidos estão exportando menos milho e o Brasil ainda não vendeu 40% da safrinha de milho que já foi colhida este ano, tudo isso nos leva a estoques maiores, que podem pressionar negativamente os preços”, afirmou Menezes.
Do lado oposto está o algodão. A Conab projetou aumento de 2,9% na área plantada, que deve chegar a 1,71 milhão de hectares. Ainda assim, está prevista uma queda de produtividade, que poderá resultar em redução na produção total de algodão em plua, estimada em 3 milhões de toneladas.
"O algodão é muito sensível à demanda internacional, embora a rentabilidade esteja muito mais alta, sempre há incertezas", ponderou Menezes.
A pedido do AgFeed, o sócio da MD fez uma simulação com base em preços e custos recentes do milho e do algodão. Mesmo na época em que chegou a valer R$ 55 a saca, o milho gerava em Mato Grosso uma rentabilidade de R$ 2500, considerado uma produtividade média de 110 sacas/hectare.
Já no algodão uma conta simplificada entre cotações atuais, taxa de câmbio e custo de produção calculado pelo Imea chegou a levar a uma rentabilidade de R$ 10 mil por hectare.
"Mas isso é muito difícil de estimar, vai depender da tecnologia utilizada, da produtividade alcançada em função do clima e do momento em que o agricultor trava preços e custos", explicou Ismael Menezes.
Mais soja, arroz e feijão
O levantamento da Conab mostrou, por outro lado, que a produção de soja ainda está prevista para bater novo recorde, com 162 milhões de toneladas, 4,8% acima da safra anterior.
A área plantada deve ficar em 45,18 milhões de hectares, um avanço de 2,5% na comparação com a safra 2022/2023. O crescimento é menor se comparado ao ritmo que vinha sendo registrado nos últimos anos. Já a produtividade da soja também deve crescer levemente, segundo a Conab, para 3.586 quilos por hectare.
O presidente da Conab, Edegar Pretto, destacou que esta deve ser “a segunda maior safra de grãos da história” e mencionou políticas públicas para incentivar a produção de alimentos.
O comunicado destacou o avanço na produção de arroz e de feijão. Considerando as três safras de feijão plantadas no País, está previsto um avanço de 3,4%, para 2,78 milhões de hectares. Mas a produção total da leguminosa está projetada para cair levemente, 0,8%, para em função da menor produtividade esperada.
A safra de arroz foi projetada em 10,8 milhões de toneladas, alta de 7,7%, com avanço de área e de produtividade.