A situação no Rio Grande do Sul ainda é crítica e, por isso, continua difícil estabelecer qual o tamanho do prejuízo para os produtores rurais do estado, que ainda tem diversas regiões alagadas.

As primeiras estimativas feitas por especialistas, principalmente para as duas maiores culturas do estado, soja e arroz, são de perdas significativas, inclusive por conta da colheita mais atrasada.

Com isso, surge também a preocupação com a inflação, especialmente para a camada mais pobre da população, atingida diretamente pelos preços do arroz nas prateleiras dos mercados.

Segundo dados da consultoria Datagro, a expectativa era de uma produção de 7,5 milhões de toneladas de arroz no Rio Grande do Sul, antes da tragédia, em uma área de 900 mil hectares. Volume que representa mais de 70% da safra brasileira.

A colheita estava em cerca de 83% até a semana passada, somando 6,3 milhões de toneladas de arroz. O restante, de 1,2 milhão de toneladas, está em uma área de aproximadamente 150 mil hectares. Deste total, 45 mil hectares estão localizados em áreas atingidas pelas enchentes.

“Considerando que o arroz de terras baixas é uma cultura acostumada com umidade, e que consegue ficar embaixo da água por até 7 dias, a avaliação preliminar é que as perdas poderiam girar em torno de 50% da produção potencial restante, ou cerca de 600 mil a 700 mil toneladas”, diz a Datagro.

O prejuízo causado pela quebra na safra de arroz foi estimado em R$ 68 milhões pela consultoria.

Relatório elaborado pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Universidade de São Paulo (USP), mostra que a colheita do arroz já estava muito atrasada em relação à última safra e que as perdas podem ser grandes.

“Colaboradores consultados pelo Cepea relatam que as recentes tempestades deixaram as lavouras debaixo d'água, inviabilizando as atividades. Além disso, algumas estradas estão interditadas, o que também dificulta o carregamento do cereal”, diz o relatório.

O Cepea cita os dados do último levantamento feito pelo Instituto Rio-Grandense do Arroz (Irga), no último dia 22 de abril, que mostrava uma produtividade de 8,6 toneladas por hectare no estado.

Assim, o Cepea e alguns economistas já começam a falar de impacto na inflação por conta não só da quebra na produção, mas também pela dificuldade de abastecimento, já que o Rio Grande do Sul tem várias estradas bloqueadas e o aeroporto Salgado Filho está fechado por tempo indeterminado.

No caso da soja, a consultoria HedgePoint Global Markets afirma que ainda é muito difícil estabelecer quanto das 5 milhões de toneladas ainda não colhidas no estado podem ser perdidas pelos produtores. A estimativa inicial dos especialistas da empresa é de perda entre 1 milhão e 2 milhões de toneladas.

Já a Safras & Mercado disse ao AgFeed na semana passada que a quebra pode chegar a 5 milhões de toneladas.

“Com as chuvas, o ritmo de colheita está atrasado ante a mesma época da temporada anterior, quando atingia 77%. O índice atual de colheita também está atrasado em relação à média histórica para o período, de 83%”, diz Alef Dias, analista de Grãos e Macroeconomia da Hedgepoint.

O analista afirma que a situação do milho é menos grave, já que a produção do estado é menor em relação à soja, com cerca de 5 milhões de toneladas esperadas para a safra 23/24, e a colheita mais adiantada, com cerca de 83%, o que deixa menos de 1 milhão de toneladas ainda a serem colhidas no Rio Grande do Sul.

Com a enchente no Rio Grande do Sul e outros fundamentos no mercado internacional, os preços da soja fecharam em forte alta na Bolsa de Chicago, avançando 30 pontos. Nos principais vencimentos a cotação ficou acima de US$ 12 por bushel.

Indústria também é afetada

Outras empresas ligadas ao agronegócio tiveram impactos pelo menos parciais em suas operações nos últimos dias.

A montadora de máquinas agrícolas John Deere está com três fábricas paralisadas desde a última quinta-feira, dia 2. Elas ficam localizadas nas cidades de Porto Alegre, Montenegro e Canoas.

Outra gigante multinacional de máquinas, a AGCO, informou suspendeu temporariamente as operações de sua fábrica de Canoas, sem previsão de retomada. As demais unidades da empresa no Rio Grande do Sul e em São Paulo estão participando da mobilização para recolher e distribuir donativos às vítimas da enchente.

A Três Tentos Agroindustrial, que atua tanto na comercialização de insumos quanto no processamento de grãos, afirmou por meio de nota que as unidades industriais de Ijuí e Cruz Alta operam normalmente.

Já as unidades comerciais de Santa Maria e Cachoeira do Sul tiveram episódios de inundação, mas, segundo a Três Tentos, sem comprometimento da estrutura e dos estoques.

A Lavoro também tem subsidiárias que atuam no Rio Grande do Sul, como a Casa Trevo e Referência e a holding Crop Care. A empresa afirma que ainda não tem um levantamento sobre os impactos em suas unidades no estado.

A Be8, produtora de biodiesel, informou que “mantém suas atividades com dificuldades e enfrenta alguns desafios que se apresentam em decorrência dessa calamidade que está instalada no Rio Grande do Sul”.

Até mesmo na capital gaúcha o agronegócio sofreu com os reflexzos da enchente histórica. Rogério Kewrber, diretor do sindicato que representa a indústria de suínos do Rio Grande do Sul, disse ao AgFeed que a sede da entidade está alagada.

Segundo ele, na tarde desta segunda-feira a sede da Secretaria da Agricultura do Rio Grande do Sul precisou ser evacuada, em meio a uma reunião que discutia a tragédia no estado. A água do Guaíba já chegou ao bairro onde fica o prédio da secretaria, no bairro Menino Deus.