“Laranja madura na beira da estrada. Tá bichada Zé ou tem marimbondo no pé”.

O samba de 1967, composto e eternizado por Ataulfo Alves, nunca foi tão atual. A fruta de origem chinesa tem no Brasil o maior produtor global, mas se tornou raridade no mercado comercial para a produção de suco. Os preços atingiram níveis tão altos como aqueles frutos maduros em galhos mais difíceis de serem colhidos nas laranjeiras.

A caixa de 40,8 quilos bateu recordes na atual safra, perto de R$ 100 para o fruto vendido à indústria e de R$ 140 para o fruto de mesa em outubro, o dobro do valor já elevado de outubro de 2023.

O suco de laranja também renovou os recordes do ano passado e chegou a US$ 8 mil a tonelada no mercado internacional.

Os preços da commodity já vinham sustentados pela redução drástica na oferta de laranja nos pomares da Flórida. O estado norte-americano, segundo maior produtor da fruta e de suco no mundo, chegou a ofertar 240 milhões de caixas ao mercado no começo do século, mas sucumbiu ao greening.

A pior praga da citricultura, sem cura e de difícil manejo, dizimou pomares e trouxe a produção para apenas 15 milhões de caixas na safra 2024/2025.

O greening também prejudicou a oferta no parque citrícola comercial brasileiro, entre São Paulo e Minas Gerais. Assim como em outras culturas, a atual safra foi prejudicada pela estiagem e pelas altas temperaturas este ano.

A Pesquisa de Estimativa de Safra (PES) do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), atualizada em dezembro, mostrou uma oferta de 223,14 milhões de caixas em 2024/2025 na região.

Se confirmada, a atual safra será a menor desde a de 1988/1989, com 214 milhões de caixas. O volume seria 27,4% menor que as 307,22 milhões de caixas da safra passada e quase a metade do recorde histórico de 436 milhões de caixas atingido em 1999/2000.

Renato Garcia Ribeiro, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Cepea/Esalq), é cauteloso ao falar sobre a próxima safra de laranja, mas aparentemente 2025 deve ser um ano melhor nos pomares.

Segundo ele, mesmo com a melhoria na oferta da fruta, não haverá produção suficiente para repor estoques de suco. Ou seja, os preços da laranja e da bebida seguirão elevados.

O presidente do Sindicato Rural de Taquaritinga (SP) e ex-presidente da Câmara Setorial da Citricultura do Ministério da Agricultura, Marco Antonio Santos, também está vacinado quando o assunto é a dependência de chuvas e clima mais ameno.

“A expectativa é de uma safra melhor, com uma perspectiva climática mais positiva. As floradas têm sido boas, mas foram muito dispersas e heterogêneas, o que pode atrapalhar a colheita pela diferença nos tamanhos dos frutos”, disse.

Briga no portão

Sem oferta da fruta e com estoques baixos, as três companhias gigantes do setor de suco de laranja - Cutrale, Citrosuco e Louis Dreyfus Company - tentam atravessar o samba uma da outra em busca da outra.

Relatos de agentes do mercado dão conta que a saída em busca de um maior market share é pagar mais em negócios feitos na modalidade “portão de fábrica”, ou seja, sem contrato.

Institucionalmente, a indústria de suco de laranja pensa em como será a próxima safra, a partir de meados do ano que vem, e projeta um estoque de passagem, em 30 de junho do ano que vem, crítico como foi este ano.

A Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR) prevê 116 mil toneladas de suco em estoque no início da próxima safra, ante 84 mil toneladas no início do atual período.

“É um volume suficiente para um mês de consumo, mas temos uma entressafra de três meses. Ou seja, não tem suco para a entressafra”, disse Ibiapaba Netto, diretor-executivo da CitrusBR.

Segundo ele, o cenário de disparada nos preços e queda na oferta não durará para sempre.

“Na hora que a oferta cair ou a demanda crescer, haverá uma acomodação”. Por isso, a entidade setorial investe em busca de futuros novos mercados para a bebida brasileira, como Índia e Coreia do Sul.