A produção brasileira de algodão segue avançando em volume e também nas estratégias voltadas à qualidade e sustentabilidade, mas as condições de mercado em 2023 acabaram frustrando a expectativa inicial que era ultrapassar os Estados Unidos nas exportações ainda este ano.
O relatório divulgada esta semana pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), mostra que os embarques entre agosto de 2022 e julho de 2023 somaram 1,45 milhão de toneladas da pluma.
O volume é 13,7% menor que os 1,68 milhão de toneladas exportados entre agosto de 2021 e julho de 2022. Na comparação com o período encerrado em julho de 2021, o tombo é ainda maior, de quase 40%.
A expectativa para o período entre agosto de 2023 e julho de 2024 é de que as exportações voltem a crescer para patamar próximo ao visto em 2020/2021, para 2,34 milhões de toneladas, segundo estimativa feita pela Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea).
O presidente da Abrapa, Alexandre Schenkel, afirma que o Brasil está pronto para ser o maior exportador de algodão do mundo, só não sinaliza mais quando isso deve acontecer.
“Nossa produtividade já é melhor que a deles, e lá se utiliza muito a irrigação, o que não acontece aqui. Temos que trabalhar para valorizar a nossa pluma nos mercados internacionais”, afirma Schenkel.
Estimativa feita pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o USDA, mostra que as exportações americanas devem ficar próximas de 3 milhões de toneladas na safra 23/24. Para o Brasil, o USDA estima 2,1 milhões de toneladas.
As lideranças do setor chegaram a prever que o Brasil ultrapassaria os EUA nas exportações de algodão já em 2023, mas se este cenário for mantido, o sonho será mais uma vez adiado.
A Abrapa aposta principalmente no controle de qualidade e na rastreabilidade do algodão brasileiro como diferenciais na hora de negociar com compradores de países como a China, que consome 30% do volume exportado pelo país.
A rede de varejo de moda C&A lançou, em junho, uma coleção de jeans que traz na etiqueta um QR Code que dá acesso a todo o caminho do algodão utilizado na fabricação da peça, desde a plantação até a chegada ao consumidor.
“Em uma calça jeans, vocês vão encontrar algodão de 18 fazendas de três estados diferentes”, conta Silmara Ferraresi, diretora de Relações Institucionais da Abrapa, e gestora da campanha Sou de Algodão.
Schenkel conta que até mesmo as indústrias têxteis estão se adequando às maiores exigências dos consumidores.
“Hoje, as fábricas trabalham para tratar e reutilizar a água que utilizam no tingimento. E depois, o resíduo tem que ser direcionado para lugares específicos. Tudo isso é auditado, fiscalizado”, conta o presidente da Abrapa.
Mas além de convencer os compradores asiáticos, os produtores vão precisar de um salto logístico para ultrapassar os EUA na corrida global do algodão.
O alerta é de André Pessoa, CEO da consultoria AgroConsult. Durante o Dia do Algodão, promovido pela Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), ele falou sobre o volume recorde que os portos brasileiros devem embarcar de produtos agrícolas este ano.
“Os portos devem bater, pela primeira vez na história, a marca de 200 milhões de toneladas em granéis, com soja, milho, trigo, arroz e outros produtos. O algodão concorre com estes itens. Então, precisamos urgentemente de investimentos no sistema portuário”, afirma Pessoa.
Ele acredita que há o risco real de que, em uma ou duas safras, o algodão enfrente um gargalo logístico para chegar no patamar de 3 milhões de toneladas exportadas. “Nós já estamos testando os limites dos granéis”, diz Pessoa.
A questão é importante porque o Brasil exporta cerca de dois terços do algodão que produz, e segundo Schenkel, cerca de 98% das vendas são para a Ásia. Os maiores mercados são China, Bangladesh, Vietnã, Paquistão e Turquia.
As receitas com exportação na safra 22/23 chegaram a US$ 2,7 bilhões entre agosto de 2022 e junho de 2023, valor 14% menor que o apurado no período anterior.
Produção continua em alta
Se as exportações correm em ritmo mais lento, a produção deve fechar a safra 2022/2023 em recuperação. A projeção da Abrapa e da Conab é de que o Brasil produza mais de 3 milhões de toneladas da pluma após o fim da colheita, crescimento de quase 20%.
Segundo a entidade, a colheita de algodão neste ano acontece em ritmo mais lento. Até o dia 13 de julho, os produtores haviam colhido 12,9% da produção. No ano passado, até esta mesma semana, a proporção de colheita era de 29%.
O atraso na colheita é resultado dp plantio mais tardio do algodão segunda safra, especialmente em Mato Grosso. O bom volume de chuvas também permite maior extensão do ciclo.
O dono de um dos maiores grupos agrícolas do Brasil, a Bom Futuro, Eraí Maggi, que também é presidente da Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa), confirma que a safra de Mato Grosso teve seu ciclo atrasado, mas diz que a produtividade foi muito positiva.
“Não tivemos frio exagerado, com granizo, e isso ajudou muito. Devemos ter uma safra recorde ou próximo do recorde de 2019”, conta Maggi.
Para a safra 2023/2024, a expectativa da Agroconsult é de aumento de área do algodão no Brasil, passando de 1,67 milhão de hectares para 1,81 milhão de hectares.
Segundo André Pessoa, muitos produtores podem preferir a cultura do algodão em detrimento do milho, na segunda safra. “Enquanto a perspectiva é de queda de 23% na rentabilidade do milho, para o algodão, a estimativa é de aumento de 25% no retorno ao produtor”, diz o consultor.
O presidente da Abapa, que representa os produtores baianos, Luiz Carlos Bergamaschi, também projeta um crescimento da área de algodão no estado. “Está mais competitivo em relação ao milho. Acredito sim em uma migração. Tem bastante tempo até a época de plantio, mas pelo menos um crescimento pequeno de área devemos ter”, afirma.
Já Eraí Maggi afirma que em Mato Grosso o movimento de aumento de área não deve se repetir. “Os preços estão até bons, mas não compensa o custo para quem vai abrir uma área nova para algodão. Mesmo com o preço do milho muito baixo, se tiver aumento, será muito pequeno”.