Um acordo comercial que promoverá a integração da União Europeia e o Mercosul em um bloco econômico com 718 milhões de pessoas e um Produto Interno Bruto (PIB) de US$ 22 trilhões.
O novo passo para a formalização do acordo UE-Mercosul, dado nesta sexta-feira, 6 de dezembro, no Uruguai, foi classificado como “histórico” por líderes públicos e privados do agronegócio brasileiros.
Com a presença da presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, a cúpula dos países do Mercosul viveu o dia mais importante de sua história, com um avanço significativo depois de 25 anos de discussões entre os dos blocos.
Mas a comemoração rapidamente se misturou com a cautela e certeza de que há muita negociação pela frente para a formalização da zona de livre comércio.
Em nota, o próprio governo brasileiro citou esses passos principais, a começar da revisão legal do acordo, “voltado a assegurar a consistência, harmonia e correção linguística e estrutural aos textos”.
Em seguida, o documento passará por tradução da língua inglesa para as 23 línguas oficiais da UE e as duas oficiais do Mercosul. O passo seguinte é a assinatura das partes manifestantes e o encaminhamento para a aprovação de autoridades de todos os países.
Essa parte é considerada mais difícil, já que há fortes divergências de líderes e políticos de países europeus, principalmente da França. No Brasil, o processo envolve o Executivo e Legislativo, por meio da aprovação do Congresso Nacional.
“O acordo entrará em vigor e, portanto, produzirá efeitos jurídicos no primeiro dia do mês seguinte à notificação da conclusão dos trâmites internos”, informou o governo. A expectativa é que as discussões nos 27 países integrantes da União Europeia se arraste pelo menos por dois anos.
“Como o Acordo UE-Mercosul estabelece a possibilidade de vigência bilateral, bastaria que a UE e o Brasil – ou qualquer outro país do Mercosul – tenham concluído o processo de ratificação para a sua entrada em vigor bilateralmente entre tais partes”.
Em depoimento em vídeo encaminhado por sua assessoria, o ministro da Agricultura Carlos Fávaro lembrou que as negociações duraram 25 anos para o acordo, que deve ser importante para a agropecuária brasileira.
“Esse acordo prevê mais liberdade comercial. Por exemplo, zero tarifa para frutas, café e outros produtos brasileiro, cotas para açúcar, carnes e etanol”, afirmou.
“Nós vamos mostrar nossa competência para acessar esse mercado tão importante que é a União Europeia. Com a tradução do acordo nos próximos meses, vamos aproveitar isso em oportunidades econômicas”, relatou o ministro, que está em missão com líderes empresariais do agronegócio em Angola.
O secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Luis Rua, afirmou ao AgFeed que “o sentimento é de felicidade” com o novo passo dado no acordo “histórico” entre UE-Mercosul e que as perspectivas são positivas para o futuro.
Rua lembrou que a União Europeia já é um dos maiores parceiros comerciais do Brasil e que o volume de negócios só deve crescer. Mas ponderou que “temos de respeitar os limites de cotas e o aumento (do comércio) não será do dia para a noite”, afirmou.
Indagado se o acordo não pode ser freado pela rejeição, principalmente da França, e pela necessidade de que todos os países-membros da UE o ratifiquem, Rua defendeu o trabalho diplomático para um avanço.
“Agora é hora de comemorar esse passo importantíssimo e depois a gente começa a trabalhar os próximos passos para o acordo caminhar”, finalizou Rua.
Em nota, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) também comemorou o acordo e citou a cota estabelecida para exportações de carne de frango de 180 mil toneladas equivalente-carcaça (50% com osso e 50% de carne desossada) com tarifa zero para embarque à UE, a ser compartilhada pelos países-membros do Mercosul
Segundo a entidade, a cota deverá ser atingida ao longo de seis anos. Também há cota para carne suína, no total de 25 mil toneladas, na mesma sistemática gradativa ao longo de seis anos, com tarifa de 83 Euros por tonelada.
Para o presidente da ABPA, Ricardo Santin, o acordo deve fortalecer ainda mais a relação entre os exportadores dos países do Mercosul e consumidores europeus.
“A consolidação do acordo abre novas oportunidades de embarques para o mercado europeu, em condições mais vantajosas do que as cotas atualmente existentes. As cotas atuais serão mantidas, e as novas estabelecidas pelo acordo deverão ser ocupadas, em especial, pelas exportações de produtos brasileiros”, informou.
Entre janeiro e novembro deste ano, o Brasil exportou 205 mil toneladas de carne de frango para a União Europeia, gerando para o país receitas de US$ 749,2 milhões.
Em nota, a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) informou que a expectativa é de um gradual incremento do PIB do Mercosul com o acordo com a UE gerado pela facilitação de investimentos e redução e ou isenção de taxações do bloco europeu a produtos originários da América do Sul.
“Isso permitirá o aumento da capacidade do bloco em promover o desenvolvimento sustentável e o atendimento a demandas socioambientais e econômicas recorrentes”, diz nota divulgada pela entidade.
Segundo a Abag, em 10 anos a UE deve isentar em mais de 80% as importações agrícolas do Mercosul para o agronegócio e dar acesso preferencial com menor tarifa a diversos produtos.
“A eliminação de tarifas é referente a frutas, peixes, suco de laranja, óleos vegetais entre outros produtos. Já as carnes bovina e suína terão um valor estabelecido por cotas, assim como o açúcar e o etanol”.
Ainda de acordo com a Abag, o acordo deve valorizar a percepção sobre o agronegócio brasileiro focado na produtividade e na sustentabilidade.
Na avaliação do vice-presidente da entidade, Ingo Plöger, o acordo abre “um esquadro jurídico que facilita o andamento de pautas futuras de cooperação entre blocos democráticos que apostam na livre iniciativa em um mundo cada dia mais protecionista”.
Representante de um dos setores beneficiados, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) avaliou que a parceria entre os dois blocos econômicos abre novas oportunidades para os setores produtivos, incluindo a agroindústria de açúcar e bioenergia.
“Esse pacto permitirá ao Brasil expandir sua presença no mercado europeu, com potencial significativo para a diversificação das exportações e o aumento da competitividade do setor sucroenergético, que segue comprometido com a produção sustentável e a economia de baixo carbono”, relatou a entidade em nota.
Já a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC), também em nota, considerou o acordo “um marco diplomático com potencial de transformar as relações comerciais entre as regiões de forma duradoura” e ponderou: “embora sua entrada em vigor não seja imediata, a assinatura do acordo já representa um avanço significativo. Aguardamos com expectativa os desdobramentos.”
Barreira ambiental
Um dos maiores entraves para a abertura do mercado Europeu ao agronegócio brasileiro são as barreiras ambientais.
Para Yuri Rugai Marinho, fundador e CEO da consultoria Eccon, o longo período de transição até o acordo UE-Mercosul surtir efeitos práticos “é importante para se manter um bom ritmo de investimentos em agricultura sustentável e economias de baixo carbono, além de blindar os países quanto a eventuais alterações políticas, inseguranças climáticas e guerras”.
Segundo Marinho, o momento do acordo é oportuno diante do cenário recente de maiores restrições por parte dos europeus. “Se tivermos sucesso nas negociações, o agronegócio sai fortalecido e deve aumentar suas exportações para a Europa”, relatou.
O CEO da Eccon citou o contexto histórico de o avanço no acordo UE-Mercosul ocorrer no no momento em que Donald Trump volta ao poder nos Estados Unidos e deve criar barreiras e tarifas aos produtos brasileiros, tal como ocorrido em sua gestão anterior.
“Com isso, as exportações do agronegócio tendem a se voltar para a China que, há poucos dias, firmou uma série de novos acordos com o Brasil”.