Há certos temas no agronegócio que se repetem a cada ciclo de alta na produção. E um dos mais relevantes sem dúvida – que está deixando o agro em sinal de alerta em 2023 – é a falta de estrutura de armazenagem no Brasil, problema que ganha novos contornos e que poderá influenciar até o resultado das exportações agrícolas.

A produção agrícola do Brasil cresceu em média 7,8% ao ano durante duas décadas. Enquanto isso, a capacidade de armazenagem no país avançou 3,4% ao ano. Estima-se que a atual infraestrutura de silos e armazéns atenda a apenas 61% da safra de grãos.

Em tempos de preços mais altos, quando a qualquer momento do ano era possível ter valores remuneradores, o problema aparecia, mas convivia-se com ele.

Afinal os grandes volumes de soja e milho são colhidos em períodos diferentes do ano e era possível "driblar" dificuldades maiores ao liberar espaço de uma safra para colher a outra.

Mas a situação se torna alarmante quando se observa um cenário de preços de soja e milho em forte queda, como temos observado nos últimos meses.

Em regiões de Mato Grosso o preço do milho atualmente, abaixo de R$ 40,00 por saca, é praticamente a metade do que era visto em janeiro. Neste período, o indicador do milho da Cepea/Esalq mostra queda acumulada de 38%.

Cenários como este são ideais para que o produtor rural tente guardar parte de sua produção, esperando por períodos em que a demanda está mais aquecida – a janela de exportações, por exemplo – e consiga preços melhores.

Para que todos tivessem acesso a esta estratégia seria necessária uma capacidade total de armazéns que hoje, infelizmente, o Brasil não possui.

Somente em Mato Grosso, maior produtor de soja e milho, o déficit de armazenagem nas duas culturas seria de cerca de 88 milhões de toneladas, de acordo com o Imea.

Em nível nacional, consultorias privadas e entidades do setor, com base em dados da Conab e do IBGE, têm apontado estimativas de um déficit de armazenagem de grãos no país entre 115 milhões e 118 milhões de toneladas.

Com pressão da oferta – produtores são obrigados a vender porque não tem onde guardar – o preço segue em queda. E a busca por soluções temporárias – como diversas vezes vimos, o milho a céu aberto – representa risco também para a qualidade do produto.

O atual governo mostrou sensibilidade com o tema ao anunciar o Plano Safra 2023/2024. Resta torcer para que o anúncio vire realidade na hora em que o produtor procurar os bancos.

A solução do problema passa por investimentos na infraestrutura atual de silos e armazéns no país. Sabemos que no Brasil apenas 14% destas estruturas estão nas fazendas e, de acordo com o próprio Ministério da Agricultura, somente 20% estão próximas das lavouras. O restante está próximo de portos ou áreas industriais.

A boa notícia é que o atual governo mostrou sensibilidade com o tema ao anunciar o Plano Safra 2023/2024, aumentando em 81% o volume de recursos destinado ao Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) para estruturas com capacidade de até seis mil toneladas e em 61% para armazéns de maior capacidade.

Resta torcer para que o anúncio vire realidade na hora em que o produtor procurar os bancos. Sabemos que a burocracia na concessão de financiamentos destinados à armazenagem tem sido bem maior se comparada às exigências feitas na compra de tratores e colheitadeiras.

Projetos que estimulem o investimento de tradings e cooperativas também podem ajudar nesse processo. E neste caso o ambiente de taxa de juros competitivas – e segurança jurídica para o agronegócio, com maior clareza em temas como regularização fundiária, demarcação de terras indígenas e regras ambientais – serão fundamentais.