Estudo realizado pelo Observatório de Inovação e Conhecimento em Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas, e apresentado pela FGV Agro, mostra que o Produto Interno Bruto da Bioeconomia (PIB-Bio) do Brasil cresceu 1,03% no ano passado, em comparação com 2022. O índice de avanço pode até parecer tímido, mas quando se leva em conta que o valor de mercado do PIB-Bio é R$ 2,74 trilhões – 25,3% do PIB nacional –, a percepção certamente muda.

Outros dois pontos favoráveis contidos nesse resultado é a recuperação parcial da queda de 2,3% registrada no ano passado e a tendência de uma retomada de crescimento. A perspectiva é que a bioeconomia retorne à rota de expansão que vinha sendo mantida desde 2017. Esses dados trazem ainda mais uma referência valiosa para o agronegócio.

É possível que até quem convive de perto com as atividades agropecuárias se surpreenda com a íntima relação entre o meio rural e a bioeconomia. Conforme o estudo da FGV, a bioeconomia é composta por agricultura, pecuária, extrativismo vegetal, pesca e aquicultura, alimentos e bebidas, celulose e papel, têxteis, biocombustíveis, partes das indústrias de vestuário, calçados, madeira, farmoquímicos, borracha e plástico, móveis e energia elétrica.

Essas atividades são divididas em quatro subgrupos: bioeconomia primária, bioindústria, bioenergia e indústria com viés biológico. A bioindústria é o que tem a maior representação econômica, com participação de 46% no todo, ou seja, R$ 1,8 trilhão.

A bioeconomia primária vem na sequência, com 41% (R$ 1,1 trilhão), e tem grande relevância nesse balanço, pois apresentou crescimento de 5,9% entre os anos de 2022 e 2023, compensando a retração dos demais.

É exatamente neste segundo subgrupo que estão atividades agropecuárias, extrativismo vegetal e pesca e aquicultura. Indústria com viés biológico e bioenergia completam o quadro com 8% (R$ 213 bilhões) e 5% (R$ 131 bilhões), respectivamente.

O estudo da FVG, que foi desenvolvido pelo pesquisador Cícero Zanetti de Lima, abordou o período de 2010 a 2023. Durante esses anos, o PIB-Bio acumulou crescimento real de 13,8%, mantendo uma taxa média anual de 0,81%. No primeiro ano do levantamento, o valor do PIB-Bio era R$ 785,5 bilhões e representava 20,2% do PIB nacional.

Ao longo desse tempo, a bioeconomia primária foi ganhando relevância no PIB-Bio. Em 2010, o setor representava 32,8% do valor total, com R$ 257,5 bilhões. E, por conta desse crescimento, também foi se equiparando com a bioindústria.

As informações desse estudo serão apresentadas e debatidas durante o Fórum Bioinsumos Brasil, que será realizado pela CropLife Brasil (CLB), no dia 6 de novembro, em Brasília (DF). Na visão da entidade, o levantamento da FGV reforça o papel dos bioinsumos no fortalecimento de práticas sustentáveis na agricultura e abrange aspectos econômicos, ambientais e de inovação.

A CropLife Brasil destaca ainda outro ponto importante relacionado ao estudo: a necessidade de se criar um ambiente regulatório que favoreça tanto os próprios bioinsumos, com políticas públicas que incentivem a pesquisa e o desenvolvimento nos setores público e privado, quanto sua adoção por parte dos agricultores.

Avanço dos bioinsumos na prática

Outro documento, também fruto do trabalho de pesquisadores, confirma os benefícios da utilização dos bioinsumos na produção agrícola brasileira. Inclusive favorecendo a conquista de espaço no mercado internacional, em especial nas regiões em que a demanda por produtos mais ecológicos é crescente.

Artigo assinado por Fernanda Cigainsnki, Leonardo Ferraz e Heloisa Lee Burnquist, pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea Esalq/USP), reúne dados significativos sobre os avanços da aplicação de bioinsumos no Brasil.

De acordo com o artigo, o mercado global de bioinsumos – envolvendo controle biológico, inoculantes, bioestimulantes e solubilizadores – foi avaliado entre US$ 13 bilhões e US$ 15 bilhões, no ano passado. E a perspectiva de crescimento do setor é de 13% a 14% por ano até 2032, chegando a US$ 45 bilhões, o triplo do valor atual.

No Brasil, esse mercado avançou 15% na safra 2023/24, em comparação ao período anterior. Em termos de vendas de bioinsumos ao agricultor, os negócios chegaram a R$ 5 bilhões. “Nos últimos três anos, esse mercado teve taxa média de avanço de 21%, um desempenho notável e que é quatro vezes superior à média global”, afirmam os pesquisadores no artigo.

Um recorte sobre proteção de cultivos contra pragas, doenças e outros fatores prejudiciais mostra que, somando produtos químicos e biológicos, houve crescimento de 15% na safra 2022/23 em relação à temporada anterior.

Nessa mesma comparação temporal, o uso de bioinsumos agrícolas aumentou 35% na mesma área, chegando a uma participação de 12% do total da safra.

A continuação dessa tendência, no entanto, depende de uma combinação de fatores, até porque há desafios consideráveis nessa trajetória, conforme a análise dos pesquisadores do Cepea. Um desses obstáculos é o custo inicial de implementação da tecnologia. O texto traz como exemplo o segmento da cana-de-açúcar.

A adoção dos bioinsumos demanda adaptação das práticas agrícolas, capacitação de mão de obra e aquisição de novos produtos. E ainda há desafios logísticos e tecnológicos para a produção em larga escala dos insumos biológicos.

No entanto, pode haver compensações no médio e no longo prazos, como uma significativa diminuição dos custos de produção nas fazendas. Esse ganho é consequência da redução na necessidade de aplicação e produtos químicos e da economia com correção de solo e tratamentos fitossanitários. Também dos ganhos em produtividade.

“O uso de inoculantes desenvolvidos pela Embrapa na cana-de-açúcar mostrou aumento de até 20% na produtividade, o que pode compensar os custos iniciais mais elevados”, exemplificou o artigo.

Para os pesquisadores do Cepea, o maior uso de bioinsumos na cultura da cana pode tornar o Brasil mais competitivo no mercado global pela promoção de práticas mais sustentáveis. E até reduzir a dependência de produtos importados.

No caso específico da cana, há ainda o benefício da transformação de resíduos em energia, reduzindo o impacto ambiental do início ao final da cadeia produtiva. A bioeletricidade gerada a partir do bagaço da cana, fonte renovável de energia, tem potencial para alimentar até 30% do País se for plenamente aproveitada.

Vale destacar que os benefícios do avanço na utilização de bioinsumos no agronegócio brasileiro, e até global, não são imediatos, ocorrem gradativamente. No entanto, como dizem, o desfrute dos resultados positivos vem com a vivência e o aprendizado do processo.

É uma questão de mudança de hábitos, de rotinas, que vão se tornando perenes com o passar do tempo. A julgar pelos dados sobre a bioeconomia, o número de adeptos a tal transformação tende a continuar crescendo.