A demanda menor por fertilizantes por parte dos produtores brasileiros - e que tem provocado queda no volume de importações desde o início do ano - está sendo vista como um alerta por especialistas ouvidos pelo AgFeed.

Uma das preocupações é que o movimento de espera do produtor para começar a adquirir os insumos se transforme em problema nos próximos meses, criando um gargalo logístico para as entregas, já que o Brasil depende de importação para atender o mercado doméstico.

O analista de inteligência de mercado da Agrinvest Commodities, Jeferson Souza, mostrou em gráfico recente que a compra de fertilizantes para uso na safra 2024/25 no Brasil até o dia 13 de abril está abaixo da média dos últimos anos para o mesmo período. Até o momento, foram realizadas compras de apenas 44% do previsto, enquanto no mesmo período do ano passado esse percentual era de 52%, chegando a mais de 60% nos anos anteriores.

A opção por esperar se baseia na expectativa de que os preços dos fertilizantes importados continuem caindo no mercado internacional. Na comparação entre 2023 e 2024, o preço do cloreto de potássio (KCI), por exemplo, recuou 26%, enquanto a ureia está 9% mais barata, segundo a Agrinvest Commodities. Essa queda, melhora a relação de troca, a depender da cultura.

Os consultores Fabio Silveira, Henrique Bortolotti e Guilherme Gracia, da MacroSector calculam que a relação de troca entre os fertilizantes e a produção de soja no Mato Grosso está melhor para o produtor rural. Em abril deste ano, segundo a consultoria, era necessárias 23 sacas de soja para comprar uma tonelada de fertilizantes, custo 20% menor que em abril do ano passado (28,9 sacas por tonelada).

Isadora Araújo, economista da GEP Costdrivers, plataforma de inteligência, análise e projeção de dados, por outro lado, estima que a relação de troca da soja com fertilizantes piore para o produtor no segundo semestre, chegando a 26 sacas por tonelada. Para o milho, essa relação pode chegar a 54 sacas por toneladas – maior que os 52 praticados no ano passado.

“A quantidade de sacas para se trocar por uma tonelada de fertilizante sempre vai ser maior para a produção de milho em relação à soja porque o preço da saca de soja é estruturalmente mais caro que o da saca de milho e, por isso, garante maior rentabilidade em relação aos custos de produção”, explica Isadora.

Segundo a economista, há variações dependendo do tipo de insumo. No caso da ureia, espera-se que a média de sacas de soja por tonelada chegue a 17 este ano – foram 16 no ano passado. Já no milho, a relação de troca deve se manter em 36 sacas por tonelada, a mesma de 2023. “Mais barato que a ureia, o nitrato de amônio (NA) deve oferecer uma relação de troca ainda mais favorável, chegando a 25 sacas no milho”, diz.

Jeferson, da Agrinvest, acredita no equilíbrio de custo para o produtor, pois os preços que tinham subido muito estão voltando a patamares mais atrativos, com exceção dos fosfatados. “Mesmo com oferta menor, o preço desse insumo tem se mantido em patamares altos, com uma relação de troca para o produtor maior que a verificada no ano passado”, diz.

A luz no final do túnel está na expectativa de que a China volte a exportar fosfatados, o que ampliaria a oferta com potencial de redução nos preços.

A China é hoje o segundo maior fornecedor de fertilizantes para o Brasil, depois da Rússia. Em 2023, os chineses foram responsáveis por 15% das nossas importações, enquanto os russos tiveram participação de quase 30%. O Canadá ficou em terceiro lugar, com 13,18%, seguido por Marrocos (6,49%), Israel (4,79%) e Irã (4,51%).

Maior importador de fertilizantes do mundo, no ano passado, o Brasil importou 40 milhões de toneladas, enquanto a produção nacional foi de 7 milhões de toneladas. O País importa quase seis vezes mais do que produz, o que deixa o agronegócio exposto às condições macroeconômicas e geopolíticas globais que impactam a produção e oferta de insumos.

“As guerras, a inflação externa, política de juros e seus efeitos no câmbio, o desaquecimento da China, os conflitos no Leste Europeu, com a guerra entre Rússia e Ucrânia, e no Oriente Médio, com os confrontos de Israel com o Hamas e Irã colocam ainda mais pressão nesse cenário”, diz Isadora, lembrando que no segundo semestre, há uma tendência de aumento na demanda interna.

Levantamento feito pela Agrinvest mostra que de toda a ureia importada pelo Brasil, mais de 30% são provenientes de nações localizadas na região do Golfo Pérsico, incluindo o Irã, que responde por 15% da ureia consumida no País.

“O Brasil também depende do fornecimento de superfosfato simples (SSP) de Israel, cujas importações recuaram mais de 60% entre janeiro e março deste ano”, lembra Isadora, da GEP Costdrivers.

A Rússia, outro país em guerra, detém a maior parte do fornecimento de nitrato de amônio (NA) e, entre janeiro e março deste ano, as importações de fertilizantes do país recuaram 27,5% na comparação com o mesmo período do ano passado. Em fevereiro, as compras zeraram.

Os dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do governo federal, confirmam que o volume total de fertilizantes importados caiu no primeiro trimestre deste ano. Foram 7,2 milhões de toneladas nos primeiros três meses de 2024, contra 7,4 milhões de toneladas no mesmo período do ano passado.

A entidade que representa a indústria de fertilizantes do Brasil, a Anda (Associação Nacional para Difusão de Adubos) até o momento divulgou apenas os números de janeiro indicando aumento nas entregas e nas importações, de 8,3% e 14,6%, respectivamente. Já a produção nacional recuou 9,5 % em janeiro, na comparação anual. Como a Secex mostra uma redução mais expressiva nas importações em fevereiro e março, é possível que os próximos relatórios da Anda indiquem queda nas entregas.

Souza, da Agrinvest, não vê ainda riscos de impactos na produtividade da safra nacional, mas lembra que países como Estados Unidos e Índia, que disputam o mercado global de fertilizantes, reduziram suas compras nos últimos meses e que isso tem beneficiado o Brasil – pois a menor demanda global reduz pressão nos preços, o que ajuda o produtor.

A queda no preço de alguns insumos, gera ainda uma oportunidade de formação de estoques. Segundo a GEP Costdrivers, o estoque de fertilizantes cresceu 16% em 2022 em relação a 2021 e teve alta de 3% em 2023 na comparação com o ano anterior.

“Com os preços atuais, é estratégico ampliar os estoques”, diz a economista. E para quem não tem como estocar, ela recomenda a antecipação de contratos, mantendo com o preço atual entregas que serão realizadas no futuro. “Essa estratégia tende a deixar as relações de troca entre saca de grão por tonelada de fertilizantes mais favoráveis, melhorando a rentabilidade do produtor”.