Uma batalha silenciosa acontece neste momento nos pomares que abastecem a indústria brasileira de suco de laranja, responsável por dois em cada três copos da bebida consumidos no mundo.
Os produtores de laranja enfrentam o ataque o greening, também conhecido como huanglongbing (HBL) doença provocada pela bactéria Candidatus Liberibacter asiaticus, que tem como vetor o inseto psilídeo.
Trata-se de uma praga com intenso poder devastador, considerada a mais destrutiva da citricultura, tendo sido responsável pela erradicação de mais de 90% dos pomares da Flórida, nos Estados Unidos.
E está avançando no Brasil. Segundo o Fundecitrus, a incidência do greening cresceu 56% e passou de 24,4% em 2022, para 38,06%, em média, em 2023, a maior evolução desde 2008. Cerca de 80 milhões de árvores estão infectadas e o prejuízo estimado é de cerca de R$ 600 milhões.
Um contra-ataque, porém, começa a acontecer em uma área específica dos pomares da Louis Dreyfus Commodities (LDC), uma das maiores indústrias do setor. No início de janeiro, a companhia assinou uma parceria com a startup americana da área de biotecnologia Invaio para testar algumas das mais promissoras tecnologias já desenvolvidas para o controle da doença.
“A colaboração nasce pequena. Vamos entrar gradualmente em uma área determinada, onde vamos testar diferentes possibilidades ao longo de três anos. À medida em que for bem-sucedida, pode ser ampliada”, afirmou ao AgFeed Avram Slovic, diretor geral da Invaio no Brasil.
Segundo Slovic, o combate à doença será feito em diferentes fronts, envolvendo o controle do inseto vetor e o tratamento da doença na própria planta. Por isso, diz, a Invaio trará um portfólio de soluções, que envolve uma gama de produtos, que serão avaliados dentro da realidade brasileira.
Um dos principais trunfos da startup nessa guerra é o sistema de aplicação Trecise, patenteado pela Invaio, que tem chamado a atenção pela eficiência obtida em projetos na Flórida.
No estado americano, a empresa obteve no ano passado o registro para seu método para tratamento contra o greening, após comprovar, em testes, os bons resultados em devolver a saúde aos laranjais. A solução desenvolvida pela Invaio conseguiu suprimir as bactérias presentes nas árvores infectadas. Mais que isso, promoveu um aumento de até 30% em sua produtividade.
O grande diferencial do tratamento é a plataforma de aplicação do pesticida – no caso um bioativo desenvolvido com uma empresa parceira. “Nossa vantagem é que, com esse sistema, conseguimos acessar diretamente o sistema vascular da planta”, diz.
“Ao invés de pulverizar e esperar que o bactericida seja absorvido através da folha, o que gera desperdício ou mesmo sua dispersão para o meio ambiente, aplicamos a dose certa na árvore, que é rapidamente absorvida e começa gerar efeito de proteção”.
Com isso, afirma Slovic, é possível aplicar quantidades de ingredientes ativos muito pequenas, “até 90% menos que uma pulverização convencional”.
Juntamente com os testes, os produtos da Invaio passarão, segundo o executivo, por um processo de tropicalização, seguindo os passos regulatórios para uma eventual submissão para registro. “Os trabalhos aqui já foram iniciados e estamos em vias de fazer ensaios necessários e pedir registro para aprovação comercial”, diz.
O acordo com a LDC é o primeiro projeto de maior envergadura da Invaio no Brasil. Mas a companhia já trabalha há três anos por aqui, fazendo estudos junto aos principais produtores de citros no Brasil e também junto com instituições de pesquisas relevantes do setor, como Fundecitrus e IAC.
“Estamos trazendo parceiros para aprender junto com eles e criar a melhor solução possível para ambiente de citros no Brasil”, diz Slovic.
Com o novo acordo, o executivo acredita que a startup passa a um novo patamar no País. O modelo de negócios da empresa contempla não só a venda de produtos, mas sua aplicação, já que exige certificação das equipes que atuarão em campo, além da remoção de todo o material utilizado.
Assim, além da importação de equipamentos e dos bioativos, a empresa iniciará a formação de equipes no Brasil.
A empresa vislumbrou as culturas perenes, como a de laranja, como o primeiro mercado potencial para suas tecnologias, mas já desenvolve, nos Estados Unidos, modelos de aplicação e produtos voltados a cultivos extensivos, como soja, milho e hortifrutis.
A Invaio foi fundada pela Flagship Pioneering, cujo ecossistema reúne mais de 45 empresas com tecnologia de ponta em biociências, como a fabricante de vacinas Moderna e a desenvolvedora de sementes Inari, que recentemente foi avaliada em US$ 1,6 bilhão.
Na definição de Slovic, a Invaio é uma empresa “multiplataforma”. “Desenvolvemos novos ingredientes ativos a base de biomoléculas e sistemas de aplicação que garantam a sua eficiência”, explica.
“Sabemos que não adianta ter a molécula mais sustentável e mais específica se ela não sobrevive quando aplicada no campo”.
A tecnologia Trecise, usada nos pomares, é uma das plataformas desenvolvidas. Segundo o diretor da empresa, a empresa já desenvolveu outras duas, mais apropriadas à utilização em outras culturas.
Neste primeiro momento, porém, a citricultura será o grande foco da Invaio no País. “O objetivo da colaboração é mitigar o greening e melhorar a sustentabilidade da produção de laranjas”, afirma Slovic.
“O sucesso de uma colaboração como essa e do trabalho com o setor é o nosso sucesso. Nossa esperança é que sejam tão efetivas quanto foram na Flórida e até mais e propulsione nossa presença”.