“Temos pressa zero de faturar”. Sérgio Simões, sócio da startup Beeotec demonstra confiança sobre o futuro da empresa, até agora mantida apenas com aporte dele e de outros dez parceiros na empreitada.

“Por enquanto, não queremos pensamos em conversas com investidores”, completa Erlei Guimarães, CEO e também sócio da companhia, reforçando assim o caráter peculiar do empreendimento, que classificam como uma “deep tech”.

Traduzindo: uma empresa com foco em pesquisa, com desenvolvimento de soluções aplicáveis a vários setores. No caso, soluções de biotecnologia natural, utilizando insumos naturais, para saúde humana, animal e vegetal.

Tamanha confiança vem de uma tecnologia inédita de diluição aquosa de substâncias fitoterápicas como óleos essenciais, que permitiu o desenvolvimento de um ingrediente batizado de Beeocitrix, que pode ser usado como base para a produção desde cosméticos a produtos veterinários e proteção de cultivos.

A partir dele, a Beeotec criou cinco subsidiárias, uma para cada vertical com potencial de negócios, e trabalha agora para obter patentes e registros em instituições regulatórias em 47 países. Além disso, desenvolveu um roadmap para desenvolvimento de 30 diferentes produtos, que podem gerar cerca de 50 diferentes patentes, de acordo com Guimarães.

“Em cinco anos, o potencial de receita estimado com produtos desenvolvidos com base no Beeocitrix é de R$ 5 bilhões”, afirma. Nenhum deles, porém, será manufaturado pela própria Beeotec.

O plano de negócios da startup prevê licenciar a tecnologia e vender o ingrediente-base, cujos ingredientes são mantidos em sigilo – com exceção da própolis, insumo natural que está na origem da criação da empresa.

“É como o xarope da Coca-Cola”, diz Guimarães. Não por acaso, o maior investimento feito até agora pelos sócios foi no depósito dos pedidos de patentes nos países que foram identificados pela empresa como os maiores mercados para sua tecnologia.

Apenas em um deles o registro já foi efetuado: África do Sul. Nos demais, inclusive o Brasil, seguem tramitando. Aqui, além das patentes, a empresa busca junto a autoridades sanitárias e agropecuárias o registro do Biocitrix como ingrediente para formulações de produtos a serem comercializados para uso agronômico e veterinário.

É a partir desse registro que as receitas devem, então, passar a fazer parte da rotina da empresa – os sócios garantem que os aportes feitos por eles são suficientes para custear mais 18 meses de atividades.

Mas deixam escapar ansiedade pela iminência de poder ver sua criação sendo comercializada – ainda que com marca alheia. Guimarães afirma que já tem contratos de licenciamento assinados à espera de sinal verde das esferas regulatórias para dois produtos desenvolvidos na vertical BeeAgro, de produtos para agricultura.

Além disso, avança em negociações e testes com um suplemento nutricional para pecuária bovina, com efeitos que iriam de aumento de ganho de peso a carrapaticida, além de reduzir as emissões entéricas do rebanho.

“As verticais agro e veterinária são as mais adiantadas, por terem um ambiente regulatório mais simples do que os que envolvem a saúde humana”, afirma Simões.

A origem da Beeotec, no entanto, foi na área de produtos sanitários. Um dos sócios da empresa tentava desenvolver, em Santa Rita do Sapucaí (MG), um desinfetante natural de alta eficácia, para uso hospitalar. Mas os insumos usados não atingiam todos os microorganismos desejados.

Com o uso da própolis, no entanto, perceberam que conseguiriam atingir o resultado desejado, mas antes precisavam encontrar uma maneira de diluir o insumo sem o uso de produtos químicos ou etílicos.

A descoberta de um processo de diluição aquosa foi a chave do avanço. E também o ponto de partida para a utilização do processo, transformado em uma plataforma biotecnológica, em outras aplicações.

A partir de então, novos sócios foram sendo incorporados, com base em sua expertise em cada área. Além de capital, eles deveriam trazer conhecimento de mercado e capacidade de contribuição no desenvolvimento.

À BeeAgro, por exemplo, juntou-se Thomaz Britze, atual vice-presidente da caraíba Sementes e com passagens em posições de liderança em multinacionais como Bayer e Helm.

“Somos uma startup gray hair”, define Guimarães, referindo-se aos cabelos grisalhos dos experientes sócios. “Todos estamos aqui com compromisso de colocar dinheiro e ajudar a fazer funcionar”.

Segundo o CEO, essa experiência somada “tem ajudado a pular etapas, a chegar nas empresas e já falar com o decisor”. Exemplo disso acontece junto à Ourofino Saúde Animal. A empresa é que está em estágio mais avançado de testes com o suplemento nutricional para bovinos criado com base no Beeocitrix.

O produto já foi avaliado até mesmo na Austrália, em um programa que envolveu outras 30 soluções voltadas para a redução de emissões de metano entérico dos rebanhos.

“Éramos a única empresa brasileira no processo”, afirma Guimarães. “Nos relatórios finais de testes, tivemos o segundo melhor desempenho, atrás apenas da Rumin8, que recebeu um cheque do Breakthrough Ventures, do Bill Gates”.

A diferença, segundo o CEO, é que os demais produtos eram voltados apenas para a questão do metano, enquanto na solução da BeeAgro essa é uma vantagem adicional do produto, que foi originalmente desenvolvido para aumentar imunidade do animal e se mostrou ainda um excelente carrapaticida.

No Brasil, a Ourofino contratou o Instituto de Zootecnica de São Paulo para realizar testes, mas os resultados não podem ser divulgado em função de cláusula de confidencialidade no contrato entre as empresas, que negociam um possível licenciamento para comercialização do produto dentro de um ano.

Na agricultura, os testes envolvem parceiros como AgroGalaxy e Nortox, com foco em dois produtos. O primeiro foi batizado de Beeogarden, e funciona como um bioestimulante e indutor de resistência foliar.

Aqui, mais uma vez, a startup atirou no que viu e acertou no que não viu, segundo palavras do próprio CEO. Os testes iniciais em lavouras de café no Sul de Minas pareciam comprometidos pela chegada da pandemia quando, no inverno de 2021, produtores procuraram a Beeotec pedindo mais do produto.

Segundo eles, as áreas onde o teste foi a realizado haviam sido as que mais resistiram a uma forte geada que queimou 40% dos cafezais da região. A empresa correu, então, para formular mais um lote e fazer novo teste. Nova geada veio e a proteção se repetiu.

“Na colheita, em 2022, vimos, além disso, que nas plantas que receberam o produto houve mais uniformidade nos grãos e ganho médio de produtividade de 31%”, diz, cotando resultados recentemente apresentados em um congresso da Fundação Procafé.

Na semana passada, Guimarães publicou em suas redes sociais os resultados de outros testes, esses realizados com milho pela AgroGalaxy. “Foi uma gratíssima surpresa”, afirma. A área que recebeu o produto demonstrou peso médio por espiga até 49% maior e produtividade 32% à área de controle.

“Temos parceiros testando em várias culturas, como soja e batata, afirma.

A segunda solução agro a usar o Beeocitrix é chamada de Bifruit e é resultado de uma encomenda de produtores de bananas, interessados em aumentar o tempo de prateleira de seus produtos, visando o mercado de exportação.

Para destravar os embarques por via marítima para a Europa, por exemplo, é preciso uma janela logística de pelo menos 18 dias. A solução desenvolvida pela empresa, diluída no tanque de sanitização já no pós-colheita, permitiu chegar a 32 dias, segundo Guimarães.

Também nesse caso, há testes sendo realizados por grandes produtores e contratos para licenciamento à espera apenas dos registros dos produtos na Anvisa e no Ministério da Agricultura.

A empresa espera tê-los nos próximos meses, assim que ultrapassar uma barreira: achar a “caixinha” certa para classificação do Beeocitrics dentro das categorias existentes. Um efeito colateral da inovação, segundo os sócios.