Portadora de fibromialgia desde muito jovem, a empreendedora Simone Ponce se viu há alguns anos cansada de tratamentos e remédios que não aliviavam as dores causadas pela doença.

Quando conheceu os benefícios de produtos da cadeia do mel - própolis e pólen -, sua vida mudou. Além de uma melhora no seu sistema imunológico e cognitivo, viu a oportunidade de criar um negócio de impacto: a startup Bee2Be.

Nas palavras de Ponce, a Bee2Be é um canal de inovação para a cadeia dos apicultores. A startup, criada em 2022, atua tanto desenvolvendo projetos de polinização com criadores de abelhas ou criando canais de venda para eles, para dentro e fora do País.

“A Bee2Be é a plataforma que operacionaliza essa gestão, mas não funcionamos apenas conectando apicultores a produtores e a compradores. Olhamos com inteligência para desenvolver projetos customizados”, comenta a CEO e fundadora da startup.

Quando Simone Ponce começou a estruturar o negócio, a primeira “inovação”, segundo ela, foi desmistificar a cadeia de abelhas. “As pessoas acreditam que a abelha no brasil é somente a apis. Essa é uma, mas temos mais de 300 espécies catalogadas no País, um potencial econômico enorme de biodiversidade”, afirma.

O primeiro passo foi entender esse potencial, principalmente para a polinização da atividade agrícola. Nos seus cálculos, o impacto da polinização por abelhas pode aumentar a produtividade de 18% a 40%, dependendo da cultura.

Com isso, um dos focos de atuação da empresa está em desenvolver projetos com produtores rurais para utilizar abelhas de apicultores nessa polinização. Um dos principais clientes na empresa é a Fazenda Obrigado, também uma das maiores produtoras de coco do Brasil.

“Conseguimos trazer uma transição mais verde em algumas culturas, medindo o quanto a ação de polinizadores permite a diminuição do uso de fertilizantes. O serviço de polinização é como se fosse um hub de iniciativas para culturas diferentes”, conta.

De outro lado, a empresa ajuda os apicultores na venda dos produtos produzidos pelas abelhas. A rede da Bee2Be possui atualmente, segundo Simone Ponce, uma rede de 250 milhões de abelhas divididas entre mais de 200 apicultores. Ela estima que são 70 famílias monitoradas pela startup.

Segundo a CEO, os apicultores estão geralmente “presos na cadeia dos intermediários”, que definem um preço por quilo do mel, compram e repassam para varejistas.

Nesse sentido, a Bee2Be criou uma certificação para que esses profissionais vendam os produtos de outras formas. Segundo ela, isso aumenta a geração de renda dos apicultores.

Além da venda direta de mel, a empresa ajuda os apicultores a venderem produtos com um valor agregado, como própolis, pólen apícola e até mesmo produtos com aplicação pet. Alguns produtos são vendidos no próprio site da Bee2Be.

“Criamos uma estratégia do pequeno apicultor deixar de vender de forma somente artesanal e se conectar com B2B por um olhar de inovação”.

A empresa e os apicultores estão localizados na Bahia, considerado o melhor estado para esse tipo de atividade. Contudo, Ponce revela que o processo de expansão geográfico já começou.

“Estamos começando a atuar na Chapada Diamantina, mais quatro estados do Nordeste e, nesta semana, começamos a conversar para atuar no Rio de Janeiro, na baía de Guanabara”, contou.

O próximo passo, segundo a CEO, é atuar no Centro-Oeste. O olhar sempre começa com o produtor local, que ganha escala regionalmente e depois globalmente.

A empresa já exportou mais de 1,5 tonelada de pólen apícola e 300 quilos de própolis. No mercado interno, foram 500 quilos de própolis vendidas desde a fundação.

A empresa possui investidores brasileiros e americanos e já recebeu aportes, cujos valores não foram revelados pela CEO. Ela cita, dentre alguns investidores, executivos do Google, da Petrobrás, um “apoio significativo” da Ambipar. Tom Fink, ex-CEO do Barings Bank, e Daniel Cady, empresário ambientalista e também marido da cantora Ivete Sangalo, também estão na lista.

Caixa de abelhas de um apicultor da rede da Bee2Be

“As abelhas me recrutaram"

Simone Ponce nasceu em Cuiabá, no Mato Grosso, mas foi criada em Tangará da Serra, também no estado. O contato com o agro veio, obviamente, desde cedo, tanto com os grandes produtores de commodities, como soja, algodão e girassol, como com os pequenos produtores em pequenas comunidades.

Ela conta que sempre se questionou por que, de um lado, as grandes produções eram exportadas e as pequenas não chegavam ao supermercado.

A empreendedora foi vítima de violência enquanto jovem, o que trouxe um quadro de fibromialgia. A doença é crônica e tem como principal sintoma a dor constante em todo o corpo. “Uma doença não óbvia, pois traz complicações como dor e fadiga, e os tratamentos mudavam ao longo dos anos. Num momento, eu não poderia fazer nenhum exercício e, em outro, essa rotina era a recomendada”, conta.

Sempre convivendo com a doença, Ponce começou sua trajetória acadêmica e profissional. Após um intercâmbio fora do país, voltou para o Brasil e foi morar em Curitiba para estudar relações públicas, curso em que se formou.

Por questões familiares, voltou ao Mato Grosso, onde trabalhou na FIFA, num cargo que envolvia comunicação e responsabilidade social. Lá, ela atuou em um projeto de egressos de trabalho escravo em obras da Copa do Mundo de 2014.

Depois, morou alguns anos em São Francisco, nos EUA, fazendo mestrado em marketing internacional. “Com o olhar de alguém do Mato Grosso, ouvia os professores falarem de temas sem levar em consideração a realidade de um país emergente como o Brasil”, afirma.

No final de sua estadia por lá, trabalhou em alguns eventos na Casa Branca, incluindo uma exposição de empreendedorismo de impacto. Lá ela conheceu a trajetória de um empreendedor tailandês que estava “ressignificando cadeia do arroz” e exportando o produto para os EUA.

De volta ao Brasil, com a ideia de atuar com uma startup de impacto, ela criou um marketplace de refeições caseiras chamado Eats for You, que chegou até a receber aportes da Alelo.

Porém, “para pagar as contas”, ingressou na Uber, onde atuou por mais de três anos como gerente de marketing e gerente de operações. Na pandemia, após algumas perdas familiares e um momento mais crítico da fibromialgia, ela foi apresentada por um médico aos produtos apícolas.

Um pouco cansada de terapias e remédios que não tinham um resultado satisfatório, ela resolveu apostar e o resultado foi além do esperado. “Me vi utilizando própolis vermelha, o que deu um boom no meu sistema imunológico e diminui outras doenças. Além disso, também uso pólen apícola para melhorar meu sistema cognitivo. Foi aí que as abelhas me recrutaram”, diz.

Foi nesse momento que a executiva, que sempre trabalhou com inovação, “olhou para a natureza”, e pesquisou sobre o universo da apicultura. Percebeu a necessidade tanto da preservação ambiental, da morte das abelhas e dos trabalhadores da cadeia.Assim nasceu a Bee2Be.