Quem vê a gama de investidores e clientes da startup Grão Direto, agtech que criou uma plataforma digital de negociação de produtos agrícolas, pode achar que está num ranking de maiores empresas do agro.
Nessa lista estão Bayer, Cargill, ADM (a primeira da lista a apostar na empresa), Amaggi, Louis Dreyfus e, mais recentemente, a Basf – que inclusive comprou uma participação minoritária no negócio.
As mãos dadas com essas gigantes dão espaço para a companhia crescer, e segundo afirmou o CEO da startup, Alexandre Borges, ao AgFeed, dobrar de tamanho em 2024.
No ano passado, a Grão Direto movimentou 5 milhões de toneladas de grãos em sua plataforma, cerca de 2% de todo o mercado brasileiro de grãos. A perspectiva para 2024 é chegar próximo aos 10 milhões de grãos, dobrando o que foi transacionado no ano passado.
Borges conta que o crescimento foi exponencial nos últimos anos. Em 2021 a agtech atingiu um milhão de toneladas transacionadas em um ano. No ano seguinte, para atingir o montante demoraram somente seis meses. Em 2023, em um trimestre. Agora, em 2024, a Grão Direto precisou de só um mês para bater a marca.
O faturamento anda em linha com o crescimento de transações de grãos, diz o CEO, que também vê um avanço de 100% frente a 2023.
No modelo de negócio, a Grão Direto não cobra nada por venda para os produtores, somente das indústrias e empresas compradoras. A empresa cobra por serviços adicionais, como contratos digitais.
“Mesmo para as empresas, cobramos taxas sem custo transacional alto. A ideia de não cobrar do produtor é porque ele faz parte da ponta mais frágil da cadeia”.
Hoje, a Grão Direto possui mais de 12 mil pontos de entrega precificados na plataforma, cobrindo 100% das regiões produtoras de maior relevância no Brasil. Borges estima que a plataforma é o maior app de comercialização de grãos no mundo.
Atualmente, a plataforma permite a transação de grãos de soja, milho, sorgo e recentemente também entrou no mercado de farelo de soja.
De acordo com Borges, as companhias que compram a soja acabam virando vendedoras dentro da plataforma, pois, em alguns casos, elas são as mesmas que processam a oleaginosa.
A Grão Direto “certamente irá para outras culturas no futuro”, afirma Borges. Sem um prazo ou meta definida, o CEO acredita que, pela sinergia dos atuais clientes, os próximos passos devem envolver algodão e café.
De um lado, muitos sojicultores clientes cultivam a fibra na segunda safra. Do outro, algumas tradings compradoras também operam com café.
A empresa já tem atuado com essas culturas no seu serviço de barter, mas ainda não nas negociações. No barter, o modelo de negócio também segue o princípio da negociação e só cobra taxas do corporativo, não do produtor.
Nessa estratégia, a empresa conta com parcerias com empresas como SLC e Petrovina Sementes.
Hoje, todo o funding é feito pelo próprio caixa da Grão Direto, mas dada a evolução da adoção do serviço, cujos números Borges não divulga, as operações devem contar com capital de terceiros no futuro.
Além do barter, a empresa lançou há alguns meses um cartão de crédito de bandeira Mastercard com prazo safra, dando mais um passo na estratégia de agregar valor via serviços financeiros.
A companhia pretende ampliar esse escopo com antecipação de recebíveis, crédito atrelado a contratos futuros e um cartão de crédito pagável em grãos.
“Como temos uma base de usuários grande e espalhada no País, junto a uma crescente nas negociações, vemos um terreno fértil para plugar produtos financeiros”.
A startup dos três amigos
Tudo começou na região do Triângulo Mineiro. “É uma região interessante para começar um negócio como o nosso, pois lá você encontra todos os players operando: grandes tradings, granjeiros, produtores pequenos, grandes, cooperativas e rotas próximas aos principais portos”, diz o CEO.
Alexandre Borges criou a Grão Direto no final de 2017 com dois amigos de infância: Frederico Marques, que hoje é CTO, e Pedro Paiva. No início das trajetórias profissionais, os três seguiram caminhos diferentes.
Enquanto Borges focou em uma carreira no mundo dos negócios, gestão e administração de empresas, Pedro Paiva foi atuar nos negócios da família ligados ao agro, incluindo distribuição de insumos e algumas propriedades rurais na região de Uberaba. Já Marques se formou em ciência da computação e atuou como profissional de TI durante muitos anos.
A ideia da startup veio de Paiva, que percebeu que a modernização encontrada dentro da porteira, no campo, não se estendia para fora dela, com um processo de comercialização igual há pelo menos vinte anos. “A única troca foi do telefone para o Whatsapp”.
Enquanto atuava na revenda agrícola, o cofundador tinha muito contato com pecuaristas que tinham uma alta demanda por milho. Dentre os clientes, alguns com fazendas há 500 quilômetros de distância, a reclamação constante era sobre a logística de encomenda de produtos.
Pedro Paiva buscou então se havia algum tipo de processo digital para essas negociações e percebeu o gap no mercado. Depois de alguns dias, ligou para Alexandre Borges para contar da oportunidade que havia percebido e, depois de uma análise, o CEO percebeu que o problema era real.
Com os astros se alinhando, Frederico Marques, o terceiro cofundador, buscava sair de Brasília, onde morava, para empreender. E foi aí que as expertises de negócio, agro e tecnologia se juntaram para criar a agtech.
“A ideia ganhou corpo, Frederico fez a primeira versão do app que disponibilizamos nas lojas virtuais. Como o Pedro já atuava no agro na região, começamos com pequenos testes e fomos gerando interesse do público”, afirmou.
No começo, a estratégia foi “crescer em cascas de cebola”, segundo Borges, de dentro para fora, e apostando na indicação de um produtor para outro na região. Tudo isso ancorado na rede de relacionamento de Pedro Paiva.
Já em 2018 a empresa fez a primeira rodada de captação, de R$ 2,3 milhões, liderada pela Monsanto, que hoje faz parte da Bayer. “Quando levantamos esse primeiro capital, já tínhamos centenas de usuários”, afirmou Borges. A rodada ainda contou com o fundo Canary e os criadores do OpenVC.
A companhia levantou mais R$ 13 milhões em 2021, numa rodada que contou com a Barn e outros fundos. A última rodada foi em 2022, quando captou R$ 40 milhões com Amaggi, ADM, Cargill e Dreyfus. De lá pra cá, ainda trouxe a Basf para o quadro de sócios.
Borges afirma que está “sempre captando” e a posição de caixa confortável da empresa permite escolher o momento ideal para novas rodadas. “Estamos conversando com potenciais novos investidores interessantes, que vão continuar a agregar valor. Mas fazemos isso sem pressa”, afirmou.
Segundo ele, os produtos financeiros trazem uma nova avenida de crescimento, mas demandam recursos para crescer mais rápido. Ele acredita que “no horizonte de um ano a empresa terá uma nova rodada”.