O Agronegócio brasileiro ocupa posição central na economia nacional, sendo responsável por expressiva parcela do Produto Interno Bruto (PIB), das exportações e da geração de empregos, no acumulado do ano até o terceiro trimestre de 2025, o PIB cresceu 2,4% em relação ao mesmo período de 2024
Esse protagonismo, contudo, vem acompanhado de riscos trabalhistas relevantes, decorrentes das peculiaridades do trabalho rural, da sazonalidade das atividades, da dispersão geográfica das operações e do crescente escrutínio regulatório e reputacional sobre o setor.
Nesse cenário, o compliance trabalhista deixa de ser um tema periférico e passa a ocupar lugar estratégico na governança das empresas do Agro, especialmente diante da obrigatoriedade de cumprimento da NR-31, que disciplina a segurança e saúde no trabalho rural, e da NR-1, que institui o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).
A NR-31 é de observância obrigatória para todas as empresas que desenvolvem atividades rurais, abrangendo desde propriedades agrícolas até agroindústrias, cooperativas e empresas prestadoras de serviços no campo. Ela estabelece regras específicas sobre condições de trabalho, uso de máquinas, defensivos agrícolas, alojamentos, transporte de trabalhadores, ergonomia e saúde ocupacional no meio rural.
Paralelamente, a NR-1 possui caráter geral e transversal, aplicável a todos os empregadores que admitam empregados, independentemente do setor econômico.
Não há qualquer exceção que afaste sua incidência sobre o Agronegócio. Ao contrário, a NR-1 introduz uma mudança estrutural relevante ao exigir que as empresas adotem um modelo contínuo de gestão de riscos, materializado no PGR.
É comum, contudo, a interpretação equivocada de que a NR-31, por ser específica do trabalho rural, substituiria ou afastaria a NR-1. Juridicamente, esse entendimento não se sustenta.
As normas são complementares: enquanto a NR-1 define a metodologia de gerenciamento de riscos ocupacionais, a NR-31 detalha os riscos e as medidas preventivas próprias do ambiente rural. Na prática, o PGR exigido pela NR-1 deve incorporar integralmente os riscos e controles previstos na NR-31.
Outro aspecto que merece destaque é a inclusão expressa, pela NR-1, dos riscos psicossociais no escopo do gerenciamento obrigatório.
No Agronegócio, esses riscos assumem características específicas, como jornadas extensas em períodos de safra, trabalho em locais remotos ou isolados, pressão por produtividade, condições de alojamento coletivo, conflitos hierárquicos e impactos de eventos climáticos extremos sobre a saúde mental dos trabalhadores.
A omissão na identificação e gestão desses fatores pode resultar em autuações administrativas e em significativo passivo trabalhista e previdenciário.
Sob a ótica do compliance, a integração entre NR-1 e NR-31 representa avanço relevante. O foco deixa de ser exclusivamente documental e passa a se concentrar na prevenção de riscos, na rastreabilidade das ações adotadas e na produção de evidências de diligência empresarial.
Isso reduz a exposição a litígios, fortalece a cultura de integridade e melhora a posição da empresa diante de fiscalizações e auditorias.
Além disso, o tema dialoga diretamente com a agenda ESG. Cada vez mais, instituições financeiras, seguradoras, tradings e compradores internacionais avaliam a conformidade trabalhista como critério para concessão de crédito, celebração de contratos e manutenção de relações comerciais.
Falhas na gestão de saúde e segurança do trabalho rural podem comprometer não apenas a regularidade legal da operação, mas também sua reputação e viabilidade econômica.
Diante desse contexto, cumprir a NR-31 e a NR-1 não deve ser encarado como mera obrigação burocrática. Trata-se de decisão estratégica, que posiciona o compliance trabalhista como eixo central da governança no Agronegócio e como instrumento essencial para a sustentabilidade e perenidade do negócio.
Vanessa Maria Sapiência é advogada e diretora de Compliance e Novos Negócios do Pellegrina e Monteiro Advogados.