Olímpia (SP)* - Como se proteger no ano ruim da cana? Na Tereos, a resposta é múltipla: tecnologia, biológicos e sustentabilidade para garantir prêmios.

A companhia não escapará do cenário de seca que vive o setor na temporada 2025/2026, é verdade, mas caminha para ter uma queda menor do que em anos anteriores na moagem.

Nesta terça-feira, dia 7 de outubro, a companhia recebeu o AgFeed e outros jornalistas em sua unidade Cruz Alta, na cidade de Olímpia (SP), para dar um panorama da temporada atual e mostrar um pouco mais da “resiliência dos canaviais”, termo usado por vários diretores ao longo da programação do dia, que começou no campo e se encerrou na usina processadora de cana-de-açúcar.

Segundo revelou o CEO da empresa no Brasil, Pierre Santoul, a Tereos deve moer 18 milhões de toneladas de cana na temporada 2025/26, que marca o vigésimo quinto ano de operação da companhia de origem francesa por aqui.

Morando há 10 anos no País, Santoul cita que as mudanças climáticas aumentam a volatilidade no setor, com anos ruins e anos muito bons. “As pessoas imaginam que por eu estar há uma década no País não enfrento mais surpresas. Mas a cada ano a cana consegue te surpreender”, diz.

O número da temporada atual mostra uma queda em um ano, mas está dentro do planejado e mostra um cenário “menos pior” ao se olhar o histórico da empresa.

Para ilustrar como a adoção dessas tecnologias e práticas verdes tem tornado a operação da Tereos mais resiliente, Mendes olha para o passado. Na safra 2021/2022, com um clima favorável, a Tereos moeu 20,5 milhões de toneladas de cana.

Na safra seguinte, com uma seca histórica e até geadas em parte do inverno, a moagem caiu para 15 milhões de toneladas. Por isso, a projeção de moer 18 milhões de toneladas de cana mostra que a “queda” na produção é menor.

Na safra 2024/2025, a Tereos realizou uma moagem de 20,5 milhões de toneladas, e na temporada 2023/24, mais de 21 milhões de toneladas.

“Estamos em uma região de extremos climáticos fortes, mas temos visto resultados resilientes com as tecnologias. A situação dos incêndios prejudicou bastante a safra, mas o grande problema ainda é a escassez de chuva. De toda forma, temos hoje um canavial mais resiliente”, disse Felipe Mendes, diretor de sustentabilidade, institucional e novos negócios da Tereos.

As queimadas de 2024 atingiram cerca de 10% dos canaviais da empresa no Brasil, algo próximo a 30 mil hectares. A cana, mesmo queimada, ainda pode ser processada, como faziam as empresas no passado. Isso desde que tenha sido queimada no momento certo do ciclo, o que não aconteceu em parte da região que sofreu com as chamas.

O impacto na Tereos ficou na qualidade de cana medida pelo ATR (Açúcar Total Recuperável). Pierre Santoul, CEO da empresa, cita que o importante com a cana queimada é uma moagem rápida, mas como o incêndio não foi controlado atingiu plantios que estavam em diferentes momentos do ciclo.

“Houve cana que queimou que estava prevista para colheita, mas houve cana de cinco meses e cana que já havia sido colhida e estava com três meses de rebrota. Bagunçou todo o ritmo”, citou.

E o que a empresa está fazendo para ter esse resultado melhor que a encomenda? A maior parte das práticas está na etapa produtiva que acontece nos canaviais. A empresa aposta na agricultura regenerativa como base tanto para uma produção mais resiliente quanto para angariar prêmios na venda para os clientes.

Na lavoura, a agricultura regenerativa da Tereos caminha por quatro etapas: preparo do solo, plantio da cana, colheita e tratos culturais.

José Olavo Vendramini, superintendente de Excelência Agronômica da Tereos cita que, no caso das empresas de cana que possuem uma atuação verticalizada - do plantio à produção de açúcar ou etanol -, a agricultura regenerativa funciona como um “ciclo fechado”.

Ele exemplifica, por exemplo, o uso da vinhaça, subproduto da etanol como fertilizante no canavial. Nesse tipo de insumo, cita inclusive que a empresa não utiliza fertilizantes tradicionais, somente especiais, por acreditar que possuem “eficiência maior e dosagem menor”. Nesses produtos, a israelense ICL é uma fornecedora da Tereos.

Na parte do plantio, a empresa faz um uso massivo de biológicos. Vendramini cita que tirando os herbicidas, o restante do pacote de defensivos é praticamente todo biológico. “70% dos inseticidas são biológicos. 100% dos fungicidas e nematicidas também. Quando houver uma molécula adequada nos herbicidas vamos usar também”, disse.

Nessa etapa, a Koppert é a grande parceira. Além da relação comercial, a Tereos é parceira da companhia de biológicos no SparcBio (São Paulo Advanced Research Center for Biological Control), centro de pesquisa da companhia junto à Esalq/USP. Dessa forma, a Tereos serve também como campo de teste para as inovações desenvolvidas por lá.

Além de plantar cerca de 300 mil hectares próprios, a Tereos ainda conta com uma extensa rede de cerca de 500 canavicultores, que possuem níveis de adesão diferentes nas práticas regenerativas. A função da empresa sucroenergética, nesse caso, é incentivar o uso.

Parte do manejo da empresa ainda conta com uso de tecnologias como drones e robôs da Solinftec, o Solix.

O discurso e as práticas sustentáveis não ficam apenas restritas aos relatórios de sustentabilidade. Na Tereos, segundo o diretor Felipe Mendes, as ações “verdes” ganham espaço também em linhas estratégicas do balanço.

A empresa tem um mix açucareiro que, historicamente, fica na faixa dos 70% para o adoçante e 30% para o etanol. Nessa temporada, Santoul cita um mix 72%/28%, e relembra que quase 90% do açúcar produzido é exportado, onde chega em clientes como Danone e Nestlé na Europa.

“Fazemos essas práticas porque também conseguimos monetizar. Nossos clientes na Europa fazem seus inventários de carbono e percebem que cerca de 85% de suas emissões está no escopo 3 (emissões indiretas). Então ele precisa dos fornecedores para se descarbonizar”, disse.

Com isso, a Tereos oferta produtos “premium”, ou com 30% menos de carbono ou com até 60% menos emissões. “Hoje temos 20 contratos desse tipo fechados e outros 80 em andamento. Nós não capturamos um prêmio equivalente ao do mercado voluntário, mas já conseguimos entre 10 euros e 20 euros a tonelada do açúcar. Num tempo de preços baixos, conseguir de 2% a 3% de prêmio num negócio de margens apertadas é uma boa”, diz.

A empresa ainda olha para descarbonização em mais frentes. Uma delas é a substituição do diesel nos caminhões por biometano, mas tudo ainda depende desse mercado desenvolver motores mais eficientes e potentes.

O que brilha os olhos da empresa por enquanto é a possibilidade de máquinas agrícolas (tratores e colheitadeiras) movidas à etanol. “ Isso tem aparecido de maneira promissora. Nosso time operacional acompanhou alguns testes nos Estados Unidos e os resultados foram positivos”, disse Mendes.

“Seria o melhor dos caminhos para a gente ter uma solução dentro de casa que vai emitir 80% menos carbono do que o diesel”, acrescentou.

A empresa ainda acompanha com atenção as movimentações do setor de transportes marítimos, que em breve pode credenciar o etanol como um dos combustíveis possíveis de substituir o óleo tradicional.

O executivo lembrou que neste mês, a Organização Marítima Internacional (IMO), agência ligada à ONU que regula o setor, deve avançar em uma reunião agora em outubro com metodologias para descarbonização do bunker oil, abrindo espaço para novas opções de combustível.

“A Wartsila, finlandesa que fabrica motores de navios, tem cerca de 40% de market share e ela já vem trazendo esse motor híbrido. Ou seja, o etanol está entrando como uma alternativa, e isso pode ser um novo caminho para a gente, uma nova linha de negócio”, afirmou o diretor.

A colheita da safra 2025/26 está próxima do fim na Tereos. Segundo o CEO, Pierre Santoul, os últimos canaviais devem ser colhidos até o final de outubro.

Com a moagem da safra passada, de 20,4 milhões de toneladas de cana, a empresa produziu 1,8 milhão de toneladas de açúcar e 624 milhões de litros de etanol. O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação) da operação brasileira ficou em R$ 1,8 bilhão, com R$ 364 milhões de lucro.

*O jornalista viajou a convite da Tereos