Sertãozinho (SP) - Um misto de incerteza e temor entre as principais entidades setoriais de açúcar e etanol quanto ao impacto do tarifaço de 50% imposto pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros marcou a abertura da 31ª edição da Fenasucro & Agrocana, nesta terça-feira, 12 de agosto.
Na principal feira do setor, em Sertãozinho (SP), lideranças setoriais trouxeram poucas previsões sobre o cenário futuro para os dois produtos, que ocupam importantes nichos no mercado norte-americano, diante das medidas de Donald Trump.
O açúcar brasileiro exportado para os Estados Unidos é basicamente da cota sem o imposto de US$ 357 dólares por toneladas aberta anualmente de 1,1 milhão de toneladas para 40 países.
Nessa cota, o Nordeste se beneficia com 155 mil toneladas, divididas entre os estados produtores, o que tem sustentado a secular indústria local. A cota é anunciada sempre em setembro de cada ano, ou seja, no próximo mês, e vale a partir de outubro.
Outro nicho ocupado pelo adoçante naquele mercado é o “special sugar”, no qual o açúcar orgânico brasileiro tem mercado cativo naquele país, independentemente do imposto. Nos dois últimos anos, com a alta nos preços do mercado norte-americano, até mesmo o açúcar comum, fora dessas duas categorias, foi exportado para lá.
Com a tarifa de 50%, esses nichos de mercado podem se tornar inviáveis, na avaliação do presidente da Bioenergia Brasil, Mário Campos, entidade que reúne 15 associações de classe e 214 unidades industriais, entre elas as do Nordeste.
“O setor está se mobilizando para tentar conversar, tem certo tempo ainda e esperamos que o governo consiga resolver a questão do açúcar”, afirmou o executivo ao AgFeed.
Na guerra econômica aberta contra o Brasil, Campos citou também a questão da pressão do governo norte-americano sobre o etanol, alvo inclusive de uma investigação em relação à tarifa de 18% imposta sobre o biocombustível importado para cá.
“Nosso governo segue firme, porque não há discriminação contra os Estados Unidos. São 18% para qualquer tipo de etanol do mundo e vamos nos defender nessa investigação”, opinou o presidente da Bioenergia Brasil.
Maiores produtores mundiais de etanol, os Estados Unidos têm um excedente anual de 7 bilhões de litros do biocombustível produzido a partir do milho. E não conseguem atender parte do mercado interno, principalmente o da Califórnia, que depende do etanol de cana-de-açúcar e de segunda geração brasileiro para cumprir as metas ambientais.
Esse nicho de mercado, com uma pequena demanda anual de cerca de 330 milhões de litros, tende a ser inviabilizado com o tarifaço de 50% sobre o biocombustível, segundo o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), Evandro Gussi.
“Não temos clareza de como vai funcionar nesse regime tarifário porque as regras não são transparentes, mas a tarifa nesse nível tende a tornar inviável a nossa exportação”, afirmou o representante das grandes usinas do Centro-Sul do Brasil.
Gussi comentou também sobre os impactos do tarifaço sobre o açúcar dos produtores da região Nordeste, que não são representados pela Unica.
“O açúcar de baixa intensidade de carbono e alta competitividade precisa ser respeitado e a indústria nordestina, com muita competência, muita resiliência, tem suprido essas cotas nos Estados Unidos. É uma injustiça brutal punir um setor tão valioso e com alta densidade de emprego, sobretudo no Nordeste”, avaliou.
Esperado para a cerimônia de abertura da Fenasucro & Agrocana, o vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin enviou um vídeo aos participantes e falou sobre as medidas estudadas pelo governo brasileiro para mitigar os efeitos do tarifaço.
“Vamos editar a MP (Medida Provisória) com forte apoio à agroindústria e ao setor de máquinas atingindo pelo tarifaço e reiterar o compromisso incondicional na defesa do etanol, um dos produtos mais limpos, com menor emissão de carbono”, afirmou Alckmin.
Com foco na transição energética, mobilidade de baixo carbono e políticas sustentáveis, além do lançamento de tecnologias e inovações para a cadeia da bioenergia, o evento segue até sexta-feira, dia 15, no município do interior paulista.
A maior feira mundial de bioenergia reúne mais de 600 marcas expositoras e visitantes de mais de 60 países e tem a expectativa de superar os R$ 10,7 bilhões movimentados na edição passada.
Resumo
- Abertura da Fenasucro foi marcada pela incerteza diante do tarifaço dos EUA, afetando nichos estratégicos como a cota nordestina e o etanol de cana para a Califórnia
- Lideranças do setor alertaram para riscos de inviabilização das exportações e defenderam negociações do governo para reverter ou mitigar os impactos
- O evento, maior feira mundial de bioenergia, reúne mais de 600 marcas e espera superar R$ 10,7 bilhões em negócios