Com o atraso no plantio, a colheita da soja na safra atual é uma das mais concentradas dos últimos anos. E justamente na temporada em que o clima ajudou na maior parte das regiões produtoras, o que está confirmando uma safra recorde, que precisa ser colhida e transportada praticamente ao mesmo tempo.

É nesse cenário que o desafio da logística para os diferentes elos da cadeia fica mais intenso. O AgFeed mostrou que no final de janeiro uma das rotas de transporte em Mato Grosso, por exemplo, teve alta de 73% no preço do frete em duas semanas, segundo dados da Argus Media.

Na logtech Strada, que tem como “clientes” e sócias as tradings ADM, Amaggi, Cargill e Louis Dreyfus, a alta no preço do frete também é muito visível. Nos primeiros 10 dias de fevereiro, o aumento chegou a 57% na comparação com o ano passado, mas há sinais de desaceleração nessa alta.

Segundo a empresa, se considerado o período entre 1 e 27 de fevereiro, nas rotas com origem em Mato Grosso, houve um avanço de 35% no preço médio.

“É resultado de um mês fortíssimo nos embarques de grãos, pressionando a demanda por transportes e consequentemente (provocando) aumento de preço”, afirmou Rodrigo Koelle, CEO da Strada, ao AgFeed.

O aumento da demanda acaba impulsionando o interesse das empresas e dos motoristas em utilizar a plataforma digital. O número de visualizações das ofertas de frete na Strada chegou a 1,32 milhão em fevereiro desse ano, bem acima dos 966 mil do mesmo período do ano passado, o representa um aumento de 37%.

Koelle disse que no início de fevereiro, em um único dia, ocorreram 68 mil visualizações, sendo o normal seriam 40 mil. A demanda ocorre principalmente pela sazonalidade das cargas agrícolas, já que na ponta da indústria há uma maior linearidade nos acessos.

Com o pico da safra, a previsão é que a média diária de visualizações suba para 65 mil em março. Já o número de negócios fechados que era de 8 mil por dia, em média, até 2024, subirá para 12 mil.

Antes da chegada das plataformas digitais, as empresas usavam telefone e visitas presenciais aos principais polos de oferta de frete – geralmente postos de gasolina em regiões chave para cargas do agronegócio – para captar interessados e negociar valores.

Agora cada carga aparece com as características especificadas no aplicativo, para saber qual tipo de caminhão e qual valor está sendo oferecido. O motorista pode só visualizar para saber as ofertas ou então oficializar a solicitação para efetuar aquele frete.

“A gente sai de uma característica marcante do transporte rodoviário, que é a informalidade, o fluxo de informação, a cotação do frete, até mesmo a discussão dos volumes, das capacidades, isso era feito por e-mail, telefone, depois o WhatsApp, mas isso com uma rastreabilidade muito baixa. Quando a gente digitaliza e centraliza isso tudo numa plataforma rastreável, ganha primeiro com agilidade, depois a gente começa a gerar informação, consegue começar com otimização de processos e ganhar eficiência de escala”, disse o líder da área de logística de uma das tradings, que utilizam o serviço.

Na empresa ouvida pelo AgFeed, por exemplo, o volume de cargas transportadas aumentou 40% nos últimos anos, mas não foi necessário ampliar o número de funcionários na área, em função da agilidade não apenas na cotação e contratação de motoristas, mas também nos sistemas de pagamento, depois de finalizado o serviço, algo que hoje já está sendo feito 100% via digital.

O relato é que também há mais informação disponível quanto aos preços praticados, o que pode dar “mais sensibilidade na tomada de decisão”. Mas com o volume forte de uma super safra, a visão dos profissionais da área é que nem mesmo o uso da plataforma digital é capaz de garantir um valor mais baixo para o frete, o que vale “é a livre concorrência”.

Neste momento, as tradings confirmam que estão “disputando” caminhões que também precisam atender as lavouras. Em Mato Grosso 66% da soja já foi colhida, mas o trabalho foi muito concentrado nas últimas semanas.

“Você vai ter um colapso do ponto de vista logístico quando o milho entrar em junho e você tiver muita soja disponível no interior para ser comercializada”, disse a fonte de uma trading. Por isso a tendência é de maior uso nas plataformas de digitais para que que seja possível “acelerar ou frear” operações com maior agilidade.

Em 2025, segundo Rodrigo Koelle, a perspectiva é atingir R$ 14 bilhões em cargas transacionadas pela plataforma, um aumento de 40% em relação ao ano passado.

Novos produtos a caminho

Enquanto surfa na onda da super safra, a Strada está lançando novos produtos na plataforma, em busca de mais receita – e ainda mais tráfego.

Um deles é o serviço chamado “bid” que faz a relação entre o dono da carga e a transportadora. É diferente da maior parte das transações que vinham sendo feitas até agora pela Strada, que consistem na oferta de frete do transportador para o motorista.

“Cotar o frete e contratar o frete são atividades que são independentes, mas quanto mais amarradas estiverem, maior o nível de compliance e governança que você dá na sua indústria, na sua cadeia”, explicou Koelle.

Ao invés de ligar ou mandar email para uma lista de transportadoras, a empresa que tem a carga utiliza a ferramenta digital para publicar suas demandas. A partir daí fica aberto um processo parecido com um leilão de cargas, para a cotação e contratação de fretes.

Segundo a Strada, um dos desafios mais comuns no mercado é o chamado "paper price", quando uma empresa oferece um preço baixo apenas para ganhar o lote, mas, na hora da execução, não consegue cumprir e tenta renegociar um valor maior.

No sistema bid, caso ocorra um caso assim, já há um plano de contingência, porque a segunda opção previamente validade é acionada automaticamente.

Rodrigo Koelle lembra que época de safra é “um período nervoso” na logística. Como trabalhou muitos anos nesse departamento das tradings, sentiu na pela as dificuldades. Além de cotar e contratar a melhor oferta, o executivo de uma multinacional é muito cobrado pelos processos de compliance.

Por isso, a expectativa é de um interesse crescente pela ferramenta, que vai dar mais garantias em termos de governança, com o processo de contratação todo documentado de forma digital.

A Strada também pretende lançar em breve um sistema de inteligência de dados, que já está sendo testado com alguns clientes, como um piloto. Um deles fornece um “mapa de calor” do frete, para que as empresas identifiquem locais com maior ou menor oferta de motoristas, naquele momento, por exemplo.

Koelle diz que concorda com a máxima de que o “o dado é novo petróleo”, não apenas pela extração e coleta, mas principalmente pelo refino, que vem na sequência. O mapa de calor, que pode ser útil para a indústria de fertilizantes, por exemplo, seria um desses produtos “refinados”.

Há também uma “versão beta” sendo testada com clientes em produto voltado a precificação dos fretes. Segundo Rodrigo, não se trata de um indicador de preço, mas sim de uma informação sobre um intervalo de valores que estão sendo praticados em cada mercado, para servir de referência.