Menina dos olhos do trio de fundadores da 3G Capital – os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira –, a Fundação Estudar foi criada em 1991 para financiar a formação de talentos voltados para a gestão de negócios ou para a administração pública brasileira e, assim, gerar valor ao capitalismo brasileiro.

Quase três décadas e meia depois, a instituição botou seu principal programa, o Líderes Estudar, na rota do maior negócio do Brasil.

De olho no potencial do setor vem ganhando na economia do país, a fundação decidiu, em 2025, ampliar a presença de estudantes com atuação em áreas ligadas ao agronegócio, que até agora não estava entre as que mais recebiam sua atenção e, consequentemente, seus recursos.

“O agro no Brasil faz muita coisa incrível e queremos estar mais perto como organização”, afirma Lucas Mendes, que acaba de assumir o cargo de diretor-executivo da Fundação Estudar.

O programa Líderes Estudar concede bolsas de estudos a acadêmicos que estão em cursos de graduação ou pós-graduação no Brasil ou no exterior, em intercâmbio acadêmico de graduação ou dupla titulação, com a ideia de estimular a formação de talentos brasileiros.

Por ano, são mais de 50 bolsas concedidas e o recurso pode chegar a até 90% do valor solicitado pelos estudantes.

“Olha o tamanho do agro no Brasil, e olha o tamanho do agro na Fundação: o agro é muito maior no Brasil do que é para a gente”, reconhece Mendes.

O executivo fala com conhecimento de causa. Ele foi também um bolsista do programa, em 2014, quando foi estudar na Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos – mais tarde, ele foi um dos fundadores do Cubo Itaú, um dos principais hubs de startups do país, e CEO do WeWork Brasil

Mendes calcula que uma pequena parte das mais de 900 bolsas já concedidas pela fundação criada por Lemann, Telles e Sicupira foi destinada a acadêmicos voltados ao agro, principalmente ligados a agtechs.

“Mas a nossa ideia para o agro é bem ampla. Vale para agtechs? Vale, com certeza. Se a pessoa mexe com grãos, algo mais tradicional, vamos olhar com bastante carinho também. A gente olha para a pessoa”, afirma Mendes.

A ideia da fundação é conceder bolsas para escolas com atuação já consolidada no agro, ainda que essa não seja uma regra.

“É o caso da Universidade de Illinois, da Universidade de Cornell nos Estados Unidos. Também estamos com um olhar bastante carinhoso para a Ásia, nas universidades da China que também são especialistas nisso”, afirma.

“Mas mesmo para quem estuda em universidades públicas do Brasil. Um exemplo: um estudante da Universidade Federal de Lavras e quero uma bolsa para pagar seu custo de vida na cidade, seus livros, seus estudos. Ele pede para a gente e vamos avaliar.”

A busca pelos futuros lideres do agronegócio é também uma porta para uma aproximação maior com as companhias do setor. O diretor-executivo da Fundação Estudar explica também que busca parcerias com empresas do agronegócio para contribuir na concessão das bolsas a pesquisadores interessados.

“Para a gente poder escolher boas pessoas do agro, a gente vai precisar de ajuda. É o que ouço aqui do nosso conselho, dos nossos fundadores, porque eles não têm essa tradição. Até tem negócios, mas não é o negócio principal deles”, afirma. “A gente vai, então, atrás de parceiros que possam nos ajudar.”

Mendes cita o exemplo bem sucedido do programa Tech Fellow, que nasceu em 2020, foi criado para investir em talentos brasileiros na área de tecnologia e incorporado ao Líderes Estudar neste ano. “No Tech Fellow, o CTO da Stone nos ajuda a escolher o pessoal de tecnologia”, afirma.

Lucas Mendes, diretor-executivo da Fundação Estudar

A ideia é replicar esse modelo para o agronegócio. “Estamos procurando parceiros, empresas, cooperativas, associações que queiram se juntar à gente para ter esse trabalho de longo prazo, de achar talento que vão transformar o Brasil pelo agro”, diz Mendes.

Além da bolsa, os escolhidos para integrar o programa também participam de eventos com o próprio trio do 3G Capital.

“São eventos petit comité, com o próprio Jorge [Paulo Lemann] ou o próprio Beto Sicupira, por exemplo”, afirma.

Lemann, Telles e Sicupira controlam, há décadas, gigantes globais de vários setores, como a cervejaria AB Inbev, dona da americana Budweiser e da brasileira Ambev.

A gestora fundada pelo trio, a 3G Capital, ficou conhecida por ter feito aquisições de grandes marcas globais como a rede de fast-food Burger King, em 2010, e a Heinz, fabricante do ketchup de mesmo nome, em 2013, e a Kraft Foods, em 2015, que foi fundida à Heinz e deu origem à atual Kraft Heinz -- companhia vendida por eles no ano passado.

O trio também é acionista da varejista Lojas Americanas, que acabou envolvida em um escândalo contábil que foi a público em janeiro de 2023.

Networking vitalício

Além da oportunidade dos eventos, o programa gera o que Mendes chama de “comunidade vitalícia”, que os idealizadores do programa também querem ver também replicada no contexto do agronegócio.

“O recurso é sempre importante, a gente quer dar mais bolsa, mas a ideia é principalmente conseguir criar uma rede que seja relevante no agro”, afirma. “Acho que a nossa rede já é muito relevante, mas no agro ela pode ficar mais relevante.”

As inscrições para o programa começaram no último dia 28 de janeiro, às 12h, e vão até as 23h59 do dia 6 de abril de 2025.

Para ingressar no programa, os candidatos precisam ser brasileiros natos ou naturalizados e ter até 34 anos de idade. Também precisam estar em processo de candidatura/aceitação, matriculados ou cursando cursos de graduação ou pós-graduação no Brasil ou no exterior – que não podem terminar antes de 31 de dezembro de 2025.

Somente no ano passado, o Líderes Estudar contabilizou 45.085 inscritos, sendo que, ao fim de todo o processo, foram selecionados 26 candidatos, com um valor total investido de R$ 6 milhões.

A fundação contabilizou, como um todo, em 2024 , 53 parceiros e 270 doadores, abrangendo diversos nomes como Fundação Lemann, Nubank, Stone, Ambev, Suzano, Itaú, iFood e Santander.

Somando todos os recursos que a instituição obteve e que vieram dos fundadores e de doadores e empresas, foram arrecadados ao todo R$ 21,7 milhões em 2024, segundo dados de um relatório de transparência da Fundação Estudar disponibilizado em sua página na internet.

Entre os negócios já criados por ex-bolsistas estão empresas conhecidas de diferentes setores, como o e-commerce de móveis Mobly e a imobiliária digital QuintoAndar.