Um produtor rural que também é acadêmico, engenheiro agrônomo, doutor em administração pela USP e, atualmente, presidente do Conselho de Administração da Coopercitrus, a maior cooperativa em número de associados do agro no Brasil, que vem crescendo muito nos últimos anos.
Matheus Kfouri Marino foi por muitos anos consultor de grandes empresas, pesquisador do PENSA/USP e coordenador da pós-graduação de agronegócio da FGV.
É por isso que, na conversa exclusiva com o AgFeed, fizemos questão de falar não apenas do atual cenário da Coopercitrus, mas principalmente ouvir sua avaliação sobre “os tempos de ajuste” do agronegócio, que, depois de duas décadas de crescimento expressivo, vem sendo desafiado por condições mais adversas.
“O incremento da taxa Selic e as recuperações judiciais do agro vão prover uma escassez de recursos para financiar o agro. Quando você sobe a Selic, o governo tem menos recurso para colocar no Plano Safra”, alertou Marino, que ao longo da entrevista deixou claro que o maior desafio de 2025 está relacionado ao cenário mais restrito de acesso ao crédito.
Em outra frente, ele destaca como positiva a expectativa de uma colheita maior ao longo desse ano.
“No lado agrícola, vejo um ano positivo, porque nós estamos com uma chuva extremamente favorável, provavelmente safras recordes e não temos preços muito baixos. Apesar de ter caído o preço de soja, com os níveis atuais de produtividade a conta operacional fecha, mas o desafio são os grupos que se alavancaram por um crescimento muito acelerado e aí esse Capex acaba consumindo o fluxo de caixa gerado”, explicou.
Nesse cenário, Matheus Marino prevê que o ano ainda seja marcado por novos pedidos de RJs e acredita que, no caso distribuição de insumos, especialmente, as cooperativas tendem a ser beneficiadas, pelo perfil mais tradicional, menos ousado do ponto de vista financeiro e de relacionamento de longa data com os produtores rurais.
Sobre a Coopercitrus, o presidente do conselho da cooperativa trouxe boas notícias. Houve crescimento em 2024 e a expectativa é de um avanço de 10% na receita esse ano. Ele admite que a cooperativa sofreu quando surgiram as grandes “plataformas”, mas que hoje o cenário se inverte, com ventos a favor dos canais tradicionais.
Com as recentes parcerias em áreas como organominerais, na joint venture com Amaggi e outros grupos e a Agroallianz, em defensivos, com o grupo DVA, a expectativa é que a Copercitrus feche 2024 com faturamento próximo de R$ 9 bilhões, patamar próximo ao ano “fora da curva”, quando insumos explodiram de preço em 2022.
Um novo investimento, com foco em pecuária, será feito ainda em 2025, na região de Araçatuba, ele adiantou.
Confira abaixo os principais destaques da entrevista de Matheus Kfouri Marino ao AgFeed.
Como você avalia o cenário para o agronegócio em 2025?
O ambiente de negócio, o ambiente macroeconômico, está muito mais turbulento do que o ambiente agro. E, de certa forma, isso contamina o agro. Se você for me perguntar qual que é o desafio da próxima safra, eu digo que é captação.
O incremento da taxa Selic e as RJs do agro vão prover uma escassez de recursos para financiar o agro. Quando você sobe a Selic, o governo tem menos recurso para colocar no Plano Safra, porque ele tem que equalizar a taxa de juros.
Isso atinge o mercado como um todo?
Você vai ter menos governo injetando recurso no agro (com juro) controlado, você tem menos canais de distribuição e cerealistas com balanços estruturados para colocar dinheiro no agro e você tem bancos escaldados com o agro. Então, para mim, o grande desafio de 2025 é como prover uma captação eficiente com os patamares atuais de Selic, ou com as projeções, com a curva futura da taxa de juros. E eu falo para o agricultor, para os canais de distribuição e cerealistas também. Inclusive em empresas de café, empresas de trading, porque você tem uma demanda de capital muito intensiva e você tem uma escassez de capital.
E o que há de positivo?
No lado agrícola, vejo um ano positivo, porque nós estamos com uma chuva extremamente favorável, provavelmente safras recordes e não temos preços muito baixos. Apesar de ter caído o preço de soja, com os níveis atuais de produtividade a conta operacional fecha.
O desafio são os grupos que se alavancaram por um crescimento muito acelerado e aí esse Capex acaba consumindo o fluxo de caixa gerado. Então, eu não vejo tanto problema no agro como operação, como resultado econômico, mas eu vejo problema na cadeia, os elos que vêm a jusante do agro.
A dificuldade ocorre para todos?
A gente vê que, em momentos como esse, quem tem balanço estruturado, quem tem auditoria de ponta, quem tem governança corporativa, quem fez a lição de casa de gestão, transparência, vai conseguir sobreviver e vai conseguir captar (recursos).
No segmento de distribuição, especificamente, nós tivemos fortes novos entrantes nos últimos cinco anos e esses entrantes acabaram desajustando aquele equilíbrio natural do mercado, Hoje nós estamos no momento ou de saída ou de redução de atividades de algumas dessas novas plataformas e eu acho que o mercado tende a se equalizar novamente, se estabilizar.
Como assim?
No nosso caso, a gente já vê uma curva ascendente de resultados do setor. Então, acho que o pior, no elo de distribuição, comercialização, foi o ano passado. Eu acho que agora nós já entramos numa seara mais positiva, uma seara de consolidação. Muitas ficarão no caminho, tem muita empresa que ainda deve deixar de operar e aí não é só revenda.
Estamos falando também de cerealistas, de tradings, que têm uma situação muito difícil. Você pega o preço do café está muito alto, o preço da laranja está muito alto, o preço da cana-de-açúcar está satisfatório, milho com uma perspectiva boa, soja não é que está ruim, piorou, mas ainda está com um operacional positivo. Então, no balanço geral, você tem uma condição favorável para o agro, essa é a minha percepção.
Em relação ao crédito, vai mudar o perfil de financiamento da safra?
A distribuição não está tendo recurso para financiar a venda de fertilizante. As revendas, até alguns misturadores, só estão vendendo à vista, porque tipicamente é um mercado que você não consegue crédito com fornecedor. O crédito você tem que captar no sistema e colocar para passar para o agricultor. Então, para mim, fertilizante vai sentir muito.
Canais que têm condição de ofertar crédito, canais com balanços estruturados e com governança vão ter uma oportunidade muito grande. Nos defensivos, a história é um pouquinho diferente, a indústria ainda continua financiando. Então, a indústria financia a revenda, o canal que vai financiar o agricultor.
O que vai mudar é que alguns players vão sair do jogo e outros entrarão no jogo. Os canais mais estruturados, mais tradicionais, mais estratégicos, como as cooperativas, tendem a ficar nesse negócio. Alguns novos entrantes e algumas revendas menores tendem a sair desse negócio esse ano.
E os bancos?
O banco vai naquele cliente que tem limite. Ele toma aquele limite e depois ele precisa complementar essas outras vias. O produtor pega mais ou menos um terço em banco, um terço em canais e tem uma parte que vem de recurso próprio e de tradings. Mas o desafio é grande. Eu acho que o recurso controlado diminui esse ano. Por esse spread entre o valor do recurso controlado e o valor da Selic, que consome muito orçamento da União e aí você não tem como casar esse orçamento. O agricultor pode conseguir o crédito, mas vai pagar mais caro. Isso vai ser muito evidente, principalmente para fertilizantes.
Como ficam as fintechs e os Fiagros nesse cenário?
Eu acho que tem que ser uma evolução natural. Nós tivemos alguns eventos aí com os Fiagros e com os CRAs que machucaram o investidor pessoa física. E ele tem uma memória. Se ele vê risco, aquilo vai ficar na cabeça dele. Diferente de um investidor institucional, que calcula o risco, calcula a quantidade que pode perder. É mais racional a decisão num investidor PJ.
O investidor PF é menos racional?
Num PF, a decisão é muito mais emocional. E algumas dessas operações machucaram esse investidor pulverizado. Eu acho que o mercado de capitais vai crescer, só que vai ser caro. Vai ser caro tomar dinheiro no mercado de capitais. Porque o investidor PF está machucado, a estruturação da operação vai exigir muito mais segurança, vai exigir muito mais critério e, com isso tudo, a operação vai ficar mais cara. Mas vai ser a única alternativa para alguns agentes dentro do agronegócio. Eu acho que esses instrumentos precisam de um amadurecimento. Eles vão ganhar muita maturidade com os eventos que nós vimos no ano passado e com alguns que ainda existem riscos.
"Ainda vai ter alguns problemas em 2025, que estão embaixo do tapete e que vão surgir. E isso pode machucar alguns Fiagros e alguns CRAs"
Quais são eles?
Eu acho que ainda vai ter alguns problemas em 2025, que estão embaixo do tapete e que vão surgir. E isso pode machucar alguns Fiagros e alguns CRAs.
Haverá mais pedidos de recuperação judicial?
A lei no Brasil está dando muita oportunidade para a RJ de produtor. O produtor que não é alavancado, que tem capital, tem um custo muito alto para entrar em RJ. O produtor que acaba entrando em RJ é aquele que tem um nível de alavancagem, um patrimônio menor, que para ele é interessante. Então ainda existe espaço para produtor. Mas eu acho que vai ter muito mais RJ de canais de distribuição e cerealistas. Você tem até algumas cooperativas que foram muito machucadas nesse último ano, sem margem, sem rentabilidade. O custo do dinheiro sobe, o dinheiro fica mais escasso...
É aí que vão se concentrar os problemas?
Acho que hoje o setor de trading e de canais de distribuição está sentindo muito mais que o setor de produção. E são problemas maiores. Quando estoura o negócio é R$ 2 bi, R$ 3 bi, machuca tudo, machuca um monte de banco, machuca um monte de investidor PF. Aí o impacto é muito negativo no mercado de capitais. E pode ter coisas do porte do que a gente viu em 2024, por exemplo. Ainda tem risco. Ainda tem alguns canais que estão numa situação bem complicada. Não sei até quando os investidores vão tocar esses negócios.
Agora é diferente dos canais tradicionais. As cooperativas, que já vêm construindo uma história há anos, estão numa situação diferente. Sentiram muito, os balanços foram ruins, mas eles conseguem sobreviver.
A margem de lucro dos produtores melhora em 2025?
É cultura por cultura. Café está numa das melhores margens da história. Cana está com margem boa. Laranja está numa das melhores margens da história. Milho recuperou bem. Soja caiu, mas ainda está com margem positiva. Então se você olhar no balanço geral, a situação operacional não está ruim. O que vai acontecer é que vai ter um aumento de custo financeiro muito alto e uma escassez de recursos. Isso pode gerar um agricultor alavancado que investiu muito no crescimento a entrar numa situação complicada. E normalmente isso acontece em áreas de abertura como o Cerrado.
Mesmo com todo esse problemão, ainda está um pouco melhor do que foi em 2024. A grande vantagem desse ano está sendo o clima. Esse ano está muito melhor do que do ano passado. Pelo menos tem produção. Até o momento atual vai ter uma produção grande, a não ser que tenha uma catástrofe. Mas até agora as sinalizações são muito positivas.
E a Coopercitrus? Como foi 2024 para a cooperativa?
Nós tivemos um crescimento, crescemos 6% mais ou menos. Adotamos a estratégia de consolidação. Dentro dos pilares estratégicos, colocamos crescimento orgânico e eficiência operacional e agregação de valor como os três principais. Nós investimos em três novas iniciativas de agregação de valor. Uma são os organominerais, a empresa se chama Tello, é em sociedade com Campanelli, com a Amaggi, com diversos grupos de investidores, com a AgroCP, que é para criar um produto com altíssimo valor agregado com um apelo ambiental muito forte, uma agricultura regenerativa, um solo vivo, que é uma tendência muito forte. E biológicos juntos.
O que mais?
Nós criamos uma fintech nossa, a Fincoop Coopercitrus. O objetivo não é captar recurso, mas sim auxiliar o agricultor nessa gestão do seu negócio. Nós auxiliamos o nosso agricultor a captar no sistema financeiro, a montar um fluxo de caixa auditado, a fazer sucessão do seu negócio, a empregar o seguro agrícola. Nós temos uma corretora de seguros, ou seja, tudo que tem a ver com a gestão do negócio dele, a Fincoop está próxima dele. Tiramos isso de dentro da Coopercitrus, que continua focada em soluções dentro da porteira para auxiliar o agricultor na produção.
Também houve o acordo na área de defensivos...
É uma terceira iniciativa. Nós ficamos sócios da DVA global e criamos a Agroallianz Brasil, que é uma empresa que traz tecnologia do mundo inteiro, tanto em produtos de nutrição especializada, produtos diferenciados de alto valor, como em commodities. Buscando também encurtar a cadeia e trazer mais eficiência.
A maior parte da receita da Coopercitrus vem da venda de insumos?
É 85% da nossa receita. Na verdade, compra de café, soja e milho, depende de ano para ano, mas normalmente fica por volta de 15% do nosso faturamento. Somos hoje o primeiro ou o segundo em fertilizantes, defensivos, tratores, implementos, em todas essas operações. Realmente, o nosso foco é ser um provedor completo de solução dentro da porteira. A Coopercitrus é uma cooperativa de tecnologia. Nosso papel é levar a tecnologia de mãos dadas para o agricultor, ofertar tudo o que ele precisa, desde o diesel, semente, fertilizante, defensivo.
Prestamos serviços de alta tecnologia, drone, imagem de satélite, aplicação, taxa variável. Aí vem a diferença das fintechs ou da Faria Lima. Lá se desenvolve à distância e deixa o agricultor executar. No nosso caso, pegamos as soluções que existem no globo e colocamos nosso time no campo para fazer aquela tecnologia entregar resultado.
Profissionalizamos muito fortemente o nosso conselho, os comitês de assessoramento. Nós investimos muito forte em governança, em estrutura de gestão para dar transparência e mais do que isso, para dar uma visão de longevidade para o nosso negócio, uma visão estratégica de longo prazo e não de curto prazo.
Como a chegada das plataformas afetou o negócio da cooperativa?
Em alguns momentos, alguns entrantes machucaram a gente, tiraram o nosso time. Em algumas regiões, tiraram gerente e vendedores das lojas. Agora essas lojas estão sendo fechadas, esses profissionais começam a voltar para o mercado. Mas por quê? Porque a nossa visão é de longo prazo, não é uma visão de curto prazo.
Por isso conseguiram crescer ano passado apesar do recuo em boa parte do mercado?
Precisávamos arrumar a casa antes de ter um crescimento tão acelerado como nós tivemos nos últimos anos. Então, no momento, mesmo de queda de preço de insumos, de um setor que foi machucado ano passado, nós vamos crescer 5%, 6%. Isso é o que nós estamos almejando. Sem um crescimento muito expressivo para os próximos anos. E muito mais investindo em agregação de valor e ganhos de eficiência. É muito bom, porque a maioria dos canais caiu em faturamento. Nós ganhamos share no mercado.
"Os novos entraram, compraram share, cresceram em cima da gente. Agora, recuperamos essa participação do mercado com a saída dessas empresas, que não têm uma condição financeira e uma estrutura de gestão eficiente"
O que aconteceu é que os novos entraram, compraram share, cresceram em cima da gente. Agora, nós recuperamos essa participação do mercado com a saída dessas empresas, que não têm uma condição financeira e uma estrutura de gestão eficiente. Não estavam entregando o valor aos seus acionistas. A nossa visão é muito longo prazo, uma constância. Crescer nem muito no ano, nem pouco, mas ter uma constância, um crescimento, um resultado, tudo muito sustentável.
Mas houve expansão?
A Copercitrus vinha crescendo 20% ao ano. Aí, demos uma parada porque o setor parou como um todo. Mas nós abrimos novas regiões. Fomos para o Mato Grosso. Isso é um outro ponto. Na Coopercitrus, sempre a gestão de risco esteve como estratégia principal. Então, talvez a Coopercitrus seja a única cooperativa no Brasil que é multicultural.
O que isso significa?
A gente opera com todas as culturas, com todos os perfis de produtor e em quatro estados do Brasil. Isso minimiza muito o risco de uma cultura específica ou de uma região específica. E dá uma estabilidade maior para o nosso negócio. Investimos também muito forte em sustentabilidade.
O que tem sido feito nessa área?
Estive na COP, lá em Baku, no Azerbaijão, para apresentar o case de sucesso da Coopercitrus. Porque nós somos, talvez, o maior time de tecnologia digital e agricultura de precisão no campo. E, cada vez mais, nós temos muita certeza que, toda vez que você coloca uma tecnologia de ponta digital no campo, você preserva o meio ambiente. Quando você usa um drone, você reduz o consumo de água, reduz o consumo de diesel. Quando você usa uma imagem de satélite para uma sistematização, para um projeto de plantio, você reduz manobra, aumenta a produtividade, faz uma melhor gestão da água na propriedade e tem um conjunto de benefícios socioambientais.
Qual a estrutura da cooperativa para a área de sustentabilidade?
Além de ter uma fundação, que é a Fundação Coopercitrus, em que nós fazemos restauro ambiental, restauro de nascentes, restauro de APP, e uma escola de graduação gratuita, uma fundação que tem uma escola de profissionais para operar com agricultura de precisão, agricultura digital, curso de Big Data no agro e temos uma escola técnica para formar gestores de agronegócio.
Acabei de aceitar o convite para participar do comitê da ONU, representando a Aliança das Cooperativas no mundo, com o Márcio Lopes, então vou representar as cooperativas de produção, porque esse ano é o ano do cooperativismo pela ONU. A ONU entende que as cooperativas são agentes de transformação socioambiental e nós temos um comitê que se reúne mensalmente que discute como desdobrar os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU em ações nas cooperativas.
O que vai levar a esse comitê?
A Coopercitrus já tem o seu relatório de sustentabilidade e nós já temos as nossas metas associadas aos ODSs em cada uma das atividades. O que nós vamos fazer nisso é replicar para o mundo. Vai ter um evento em Madri, em maio, depois tem um evento em novembro em Doha para reunir todas as principais lideranças das cooperativas no mundo e tentar traçar um plano para os próximos anos em cima dos ODSs para promover o desenvolvimento socioambiental.
Também avaliam possibilidades de comercializar créditos de carbono?
Nós temos vários trabalhos, com fornecedores, trabalhos próprios, estamos no Pró-carbono da Bayer, estamos no programa da Syngenta, estamos mensurando. Só que, de fato, não conseguimos vender crédito carbono ainda. É um mercado ainda voluntário, não regulado, tirando a cana-de-açúcar que tem o CBios. Mas o que eu venho trabalhando, que a Coopercitrus vem trabalhando, é que o produtor não gera crédito carbono para vender, mas para aumentar o nível dele de produtividade.
O principal do carbono gerado em uma propriedade agrícola é aumentar o teor de matéria orgânica do solo com plantio direto, com mix de cobertura. E por que ele faz isso? Não é para vender o carbono, não, é porque aumenta o nível de produtividade dele e aumenta o retorno financeiro. Então, até na COP, a minha apresentação foi muito clara.
Em que sentido?
Eu sou um pouco contra aquela visão de que o mundo desenvolvido vai pagar, que vai ter o fundo clima, que vai pôr dinheiro no Brasil, que isso vai ser a salvação para a mudança climática. Eu não acho. Eu acho que são as tecnologias que dão resultado econômico e, por consequência, promovem um benefício socioambiental.
"Eu sou contra a visão de que o mundo desenvolvido vai pagar, que vai ter o fundo clima, que vai pôr dinheiro no Brasil, que isso vai ser a salvação para a mudança climática"
Todas essas tecnologias, cujos exemplos dei aqui e apresentei lá na COP, têm um impacto socioambiental gigantesco. Só que não são adotadas por causa do socioambiental, mas porque o produtor ganha dinheiro com elas tecnologias. Aumenta o retorno do seu investimento.
O que precisamos para desenvolver o clima é fazer com que essas tecnologias sejam adotadas no campo, que elas saiam da Faria Lima e que vão para o campo. E aí é o papel da cooperativa. Pôr isso em prática, para isso precisa de gente.
Qual a estrutura que a Coopercitrus possui?
Temos um time de 500 profissionais no campo que visitam os produtores ensinando, literalmente qualificando, preparando os produtores para adotarem essas novas tecnologias digitais. É o maior time de agricultura digital do Brasil.
Nem os grandes fabricantes têm um time desse tamanho, que está lá junto com o agricultor, fazendo o drone voar, tirando imagem de satélite, fazendo planejamento de plantio, colocando direção elétrica com piloto automático. Não existe um canal. E nós temos isso como nosso foco.
O desafio é ampliar o acesso?
Como eu disse, a Coopercitrus é uma empresa de tecnologia dentro da porteira. Enquanto todo mundo quer atender a distância, atender os grandes centros, nós não. Queremos ter o time no campo. E a gente entende que agrande barreira para a tecnologia ser adotada é alguém ensinar o produtor a adotar aquela tecnologia.
E nesse momento de margens mais apertadas, de crédito mais caro, não pode inibir um pouco os investimentos aí nessa transição?
Esse ano é um pouco assustador, porque, com o (Donald) Trump, ninguém sabe o que vai acontecer. Os bancos já pularam do barco dos acordos climáticos, algumas seguradoras... então, ainda existe um nível muito grande de incerteza.
Eu não acredito que o mercado de carbono vá gerar resultados financeiros no curto prazo. Só que eu acredito que todo mundo vai querer pôr o carbono no solo porque vai aumentar a produtividade e ele vai ganhar dinheiro. Então, é tudo indireto.
Pode dar um exemplo?
Nós emitimos o título do Rabobank, emitimos o título do Bradesco, títulos verdes com alguns, porque como nós temos o nosso relatório de sustentabilidade nos padrões GRI. Tenho os indicadores bem claros.
Aí vem um Rabobank, por exemplo, ele pega meus indicadores, pega meu inventário de carbono e fala você tem que melhorar nisso e nisso. “Se você melhorar, te dou um prêmio adicional na sua captação”. E isso nós fazemos.
E como esse dinheiro vem para a cooperativa e nós emprestamos isso para o agricultor, indiretamente chega no agricultor, porque o nosso custo de captação é menor do que o custo de mercado.
Então, eu acredito muito em ganhos indiretos. Tudo que é muito forçado, eu acho que não anda. Você tem que ter um mercado. Se deu dinheiro, tem agente privado que ganha dinheiro, vai acontecer. Se não deu, dependendo do governo ficar pondo dinheiro, uma hora muda o governo, uma hora tira o financiamento e isso para, isso morre.
Quais são as prioridades da Coopercitrus para 2025?
Nós estamos com um investimento grande no complexo em Araçatuba. A gente vai continuar investindo em fábrica de ração. Vamos continuar investindo muito forte em tecnologias. Esse ano o mercado de tratores caiu, por exemplo, e a Coopercitrus cresceu.
Então, porque nós entendemos que tecnologia é a base de tudo. E principalmente as máquinas, com a telemetria, elas buscam informação.
O nosso drive é cada vez mais investir em time no campo, levando tecnologia para o campo. Vamos continuar crescendo em 2025. Achamos que vai ter muita oportunidade, porque os nossos concorrentes estão machucados. Existe espaço, e hoje o desafio é ter time qualificado para conseguir suportar o agricultor ali no mercado. O mercado está em profunda transformação.
Como acontece essa transformação?
Algumas plataformas estão saindo, outras estão se reestruturando. Os chineses começaram a acessar o mercado diretamente, não mais só pelas grandes fabricantes de químicos. Então, é um conjunto de transformações que nós vamos ter que aprender a lidar. Mas eu falo que 2025 é o momento de consolidação que vai abrir muitos espaços e oportunidades para os canais já estruturados que fizeram a lição de casa.
"O nosso budget para este ano prevê um crescimento de 10%, mas ele está sendo bem modesto. Eu acho que dá para crescer mais"
Qual sua previsão de crescimento para este ano?
O nosso budget para este ano prevê um crescimento de 10%, mas ele está sendo bem modesto. Eu acho que dá para crescer mais. Talvez a rentabilidade das cooperativas e canais ainda seja um pouco sofrida, porque muitos players precisaram fazer números e estocar a distribuição e, de certa forma esse estoque passou a ficar muito caro, porque você não tem recurso e esse recurso está escasso. Então muitos vão colocar esses produtos no mercado ainda existente e isso faz com que você tenha uma dificuldade de manutenção de margem no setor.
O crescimento da Coopercitrus envolve todos os segmentos que atua, inclusive insumos?
Sim. E quando eu falo em insumo, estou colocando tratores e máquinas também. Tratores e máquinas devem dar 20% do nosso negócio. Depois vêm rações, que vêm crescendo muito, dando muito resultado. Inauguramos uma fábrica top, automatizada, uma das maiores do País, vamos construir outro complexo agora em Araçatuba, então um investimento forte na nossa área de agregação, buscando ganhar eficiência nas operações.
Será construída uma nova fábrica de ração?
Isso, uma nova fábrica de ração, é um complexo que vai ter fábrica de ração, silos, TRR, que é a entrega de diesel na propriedade, loja, área de agricultura de precisão, com campo digital, com todas essas tecnologias. Acaba se ser assinado o contrato de compra de um terreno, num local bem estratégico, então a gente vai fazer um investimento pesado lá.
Pode nos dizer qual será o investimento?
Ainda é um pouco cedo, estamos estudando, mas o terreno já está concretizado. Mas é para começar esse ano, inclusive o projeto já está feito, então é um negócio bem rápido, um investimento rápido.
E é maior do que esses últimos investimentos que foram feitos, nas joint ventures por exemplo?
Os últimos foram as três iniciativas, a Tello, a Agroalliaz e a Fincoop, e agora nós vamos investir nesse complexo. Há dois anos fizemos o investimento na fábrica de Colina.
Nós estamos optando por desativar estruturas antigas e sem eficiência operacional, que normalmente estão em localizações muito urbanas, desinvestindo para imobiliário e investindo em locais mais apropriados, em estruturas novas, mais modernas e mais automatizadas. Isso dá uma eficiência operacional de custo muito grande em qualidade do produto.
A média anual de investimento da Coopercitrus em novos negócios estava entre R$ 50 milhões e R$ 60 milhões. Seguirá nessa linha?
Esse ano vai ser mais, só esse negócio é muito maior. Vamos pôr o dobro disso, até mais do que isso, só nesse complexo que vai ser construído.
Nossa prioridade hoje além de Araçatuba, é time. Eu acho que o grande impacto negativo dos novos entrantes foi essa mudança de cadeira de time. Então nós perdemos muitos profissionais em todos os níveis dentro da organização. E esses profissionais foram para essas novas empresas que praticamente estão desativando suas atividades.
Então está tendo toda uma recomposição novamente dessas cadeiras. E isso demora tempo, é perfil, é formação, é cultura. Então isso machucou muito a gente nos últimos anos.
A diversificação de culturas agrícolas deve continuar? Qual a fatia do negócio relacionada a produtores de grãos?
Sim, 15% soja, 12% café, 10% citros, 10% milho, é tudo picadinho. Não tem outro canal que tenha essa pulverização de culturas, pulverização de regiões. Atuamos em São Paulo, Minas, Goiás e Mato Grosso. E também pulverização de perfil. Atuamos com pequenininho, pequeno e médio, que são 80% do nosso negócio, mas também temos 20% que são grandes.
E atuamos em todos os segmentos, acho que não tem outro canal de distribuição que atua de semente, diesel, irrigação, eletrificação com fotovoltaica... Tudo que se possa imaginar que o agricultor precisa dentro da propriedade, nós ofertamos.
Tem muita cooperativa olhando para biocombustível, etanol de milho, esmagadora, essas coisas também estão no radar?
Nós fizemos já alguns estudos. A gente acredita que teria que ser pela nossa localização via intercooperação. Temos um terminal ferroviário em Barretos que está para ser reativado. A Rumo tem um compromisso de, até o ano que vem, reativar esse terminal. Com isso sendo feito, já temos uma área preparada para receber até dois silos de 120 mil toneladas com balança férrea. Então, ali provavelmente caberia investimentos expressivos nessa direção.
Estamos aguardando essa definição da Rumo por edital. Se não tiver nenhum aditivo, ela tem mais um ano para estar realmente reformando toda essa linha, em que falta um trecho de 110 quilômetros entre Pradópolis e Barretos. Efetivando esse trecho, dá uma competitividade muito forte para a gente trabalhar com açúcar, ração, farelo, até mistura de fertilizantes, aí cabe uma estrutura muito interessante lá em Barretos, de um complexo de indústrias.