Em meio a esburacada logística brasileira, a safra recorde de grãos que se prevê para os próximos meses trará, como consequência, uma série de desafios no transporte.
Desde já, o escoamento de 322,3 milhões de toneladas, projetadas pela Conab, já movimenta empresas do setor.
Na FreteBras, empresa que faz parte do unicórnio Frete.com, startup latina avaliada em mais de R$ 6 bilhões, uma trilha de IA deve guiar o negócio daqui para a frente e também ajudar a dar vazão à produção agrícola.
A companhia atua como um marketplace de frete, conectando caminhões com cargas, em tempo real, na intenção de reduzir a capacidade ociosa dos veículos e aumentar a segurança no transporte.
Para colocar IA em todas funcionalidades de seu software e manter a liderança no segmento, a empresa investiu R$ 800 milhões nos últimos três anos, segundo explicou ao AgFeed Federico Vega, CEO da empresa.
A ideia de colocar a IA no negócio servirá para trazer mais eficiência, segurança e redução de custos, de acordo com o executivo.
Para alimentar esses algoritmos, nada melhor que a base de dados da companhia, que segundo ele, transaciona mais da metade de todas cargas agrícolas do País.
Hoje, o agro já é o segmento de maior representatividade no negócio, responsável por metade de todas as cargas movimentadas pela plataforma FreteBras.
De acordo com o CEO, esse percentual beira os 60% no primeiro trimestre, no auge do escoamento da safra, e na média do ano, fica entre 40% e 50%.
De acordo com Vega, a base da companhia conta com mais de 900 mil motoristas ativos e 25 mil transportadoras que publicam cargas regularmente, resultando em 20 milhões de análises de frete por ano. No ano passado, o marketplace facilitou mais de R$ 70 bilhões em pagamento, segundo informações da empresa.
“Os números que transacionamos nos dão muitas informações e, com isso, conseguimos colocar um preço do frete em tempo real. Além disso, verificamos quem são os caminhoneiros, quem faz um trabalho melhor ou pior”, explica o CEO.
A empresa passa a contar com um algoritmo que conecta as cargas publicadas aos caminhoneiros mais adequados, com base em geolocalização, histórico e tipo de carga. Outra nova funcionalidade é um monitoramento de roubos de cargas.
Nos estudos iniciais da empresa, essa ferramenta tem potencial para evitar perdas anuais de R$ 1,4 bilhão em roubos de carga.
A IA também oferece precificação dinâmica, análise avançada de dados para otimizar rotas e um seguro de no-show para minimizar imprevistos, tudo com o objetivo de atender à crescente demanda do setor agro e aumentar a rentabilidade das transportadoras.
A nova aposta em IA está em teste com 100 transportadoras do setor agro e a expectativa é expandir o acesso da tecnologia para 3 mil transportadoras ainda neste ano, em meio ao escoamento da safra de grãos 2024/2025.
Antes da digitalização dos fretes, Vega conta que era tudo feito presencialmente. Um caminhoneiro que transportava uma carga de Sorriso à Santos ficava em postos de gasolina e outros locais estratégicos buscando novas cargas para “voltar para casa”.
“Digitalizamos o mercado e conectamos esses transportadores às cargas. Acontece que os problemas do mundo real, como fraudes e ineficiência de alguns caminhoneiros, também chegaram ao virtual”, diz.
A contratação ficou mais rápida, mas a confiança no caminhoneiro e a qualidade do seu serviço por muitas vezes empacavam o transporte. Com isso, as tecnologias de IA juntam todo o histórico dos motoristas que já passaram pela FreteBras, o que ajuda a otimizar as rotas.
Se um caminhoneiro mora em Santos e hoje está em Sorriso, o software da empresa consegue destinar a ele rotas que o façam voltar para o litoral paulista.
“Conseguimos fazer um match mais forte, que acaba barateando o frete, pois esse motorista quer ir para Santos”, explica Federico Vega.
A companhia também está utilizando inteligência artificial para que as cargas sejam publicadas mais rapidamente na plataforma, utilizando chatbots com IA.
Antes, a negociação, mesmo no ambiente virtual, se transformava num bate-papo entre o motorista e a empresa. Agora, tudo é otimizado com bots.
Segundo Vega, essa é uma IA focada no aumento da eficiência para os donos da carga, que reduz o tempo de contratação.
Outra ideia da FreteBras é informar uma média de preço de frete, a fim de evitar distorções de preço, se por exemplo, uma fazenda está em épocas de chuva, o que encarece o frete e aumenta o tempo de transporte.
Por fim, a IA entra como uma aliada antifraude na FreteBras. Os caminhoneiros que passam pela plataforma, de acordo com seus preços e tempos de entrega, ganham um score.
Se um caminhoneiro tem um histórico de transportar milho do Mato Grosso até o Porto de Paranaguá e de repente começa a buscar cargas de café em Minas Gerais, a IA detecta essa anormalidade, que pode indicar alguma atividade ilícita.
“Acima dos dados, implementamos ferramentas de sistemas antifraude de bancos. Com essa camada e todo histórico dos motoristas, tentamos prever o futuro e detectar possíveis roubos de carga”, diz Vega.
Investidores de peso
A FreteBras é parte da holding Frete.Com, que ainda contempla a CargoX (que conecta empresas a transportadoras) e a FretePago (de pagamentos e soluções financeiras).
O grupo nasceu quando o argentino Vega criou a CargoX, em 2013. Oito anos depois, se juntou às outras duas companhias para formar a holding.
Foi aí que a companhia atingiu o status de unicórnio, ou seja, atingiu mais de US$ 1 bilhão em valor de mercado.
Os números robustos operacionais são ancorados por um histórico também robusto, recheado de investidores de primeira prateleira.
A empresa já captou R$ 2,2 bilhões desde sua fundação e atraiu nomes como Softbank, Tencent, BTG Pactual, Goldman Sachs, Jeb Bush (ex- governador da Flórida), Reid Hoffman (fundador do LinkedIn) e Oscar Salazar (co-fundador do Uber).
Foi na rodada do tipo Série F, em 2021, que a empresa recebeu investimentos do Softbank, BTG e da chinesa Tencent e se tornou unicórnio.
No banco de André Esteves, além do aporte, houve a criação em 2023 de um FIDC de R$ 300 milhões para financiar pequenas transportadoras.
A companhia lidera um mercado com concorrentes como a startup goFlux e a TruckPad, comprada pela JSL em 2022. A primeira tem investido em IA para fazer frente à líder, além de reforçar sua veia de crédito, se transformando em uma logfintech nos últimos meses.