Nos últimos anos, a busca pela autossuficiência, fazendo o País deixar de ser dependente de importações do grão, tem sido quase uma obsessão para o setor.
O Brasil chegou próximo disso há algumas safras, mas problemas climáticos nos distanciaram da meta. Em 2025, podemos mais uma vez reduzir o déficit entre consumo e produção, mas ainda não chegaremos lá.
Os dados oficiais, fornecidos pela Conab, estimam que o Brasil vai produzir cerca de 8,5 milhões de toneladas para um consumo previsto de 12 milhões de toneladas.
Geralmente, para suprir esta defasagem o país conta com seus parceiros comerciais como a Argentina, Rússia e Estados Unidos.
Neste ano, conforme a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), que reúne os moinhos, as compras argentinas devem aumentar, pois o país vizinho produziu mais. Serão cerca de 5 milhões de toneladas, frente às 3 milhões do ano passado.
Como, segundo análise da Scott Consultoria, os estoques brasileiros estão apertados, deve ser necessário importar de outros países, a fim de regular preços no mercado interno.
A produção de trigo no Brasil ainda está muito ligada ao que acontece no mercado de soja e milho e no clima dos três estados do sul, onde se planta 90% do que é consumido no País.
O ranking coloca, historicamente, o Rio Grande do Sul como principal produtor, seguido pelo Paraná e depois, Santa Catarina. Há vezes em que os gaúchos trocam de posição com os paranaenses, mas em geral são os gaúchos que plantam mais.
Na safra passada, a área plantada foi de 2,995 milhões de hectares, com produtividade média de 2,9 mil kg/ha.
Um fato que vem cada vez mais se confirmando e que pode tirar o Brasil desta dependência de compra de outros países é o aumento de área e de produção no Cerrado.
Em 2024, o plantio de trigo ocupou, nessa região, cerca de 450 mil hectares, para colher 480 mil toneladas após uma quebra de 50% na produção mineira por conta do clima.
Ainda assim, a expectativa permanece de que, com um clima médio mais estável e trabalhando com irrigação, Minas Gerais, Distrito Federal e Bahia podem ser, a médio prazo, os novos eldorados da cultura.\
“Podemos ver inclusive a migração ou criação de moinhos nestes estados”, prevê o presidente executivo da Abritrigo, Rubens Barbosa.
Preços
“Com maior importação de trigo, menor produtividade e qualidade inferior e o dólar nas alturas, o preço, em reais, tem tido pouca folga”, afirma Felipe Fabbri, analista de mercado da Scott Consultoria.
Segundo ele, no mercado internacional, a Rússia elevou em outubro a taxa para as indústrias exportadoras de trigo, que passou a 41,0%. A estratégia visa a manter maior oferta de trigo no mercado doméstico.
Fabbri lembra que, no mundo, o balanço de oferta e demanda está pouco confortável há algumas safras e, em novembro passado, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), estimou aumento para o consumo global de trigo, em ritmo maior à elevação da expectativa de produção.
Com isso, os estoques finais foram revisados para baixo, sendo os menores estoques desde a safra 2014/2015.
O analista diz ainda que no Brasil, com uma maior necessidade de internalização, a qualidade do trigo colhido impactada e o dólar em alta, há pouco espaço para fortes correções. Os preços praticados pela tonelada, em 16 de dezembro de 2024 estavam em R$ 1.389,26, segundo o Cepea/USP.
Depois da soja
Toda a produção de trigo no Brasil também é muito conectada ao que acontece com a soja e o milho. Isto porque o triticultor não é um especialista na cultura.
Muitas vezes ele planta para fazer cobertura de solo ao longo do inverno e espera, com isto, ter mais uma renda na sua atividade.
Assim, a definição de quanto de área e investimento vai fazer no trigo depende de como foram os resultados da safra de soja e da safrinha de milho, para aqueles que conseguem plantar este cereal na época propícia, como os agricultores do Paraná, por exemplo.
Se o produtor sai capitalizado do ciclo soja/milho e vê perspectivas boas com o trigo, investe em tecnologia e no aumento de área. Caso contrário, pode não plantar trigo e optar por alguma outra cultura de inverno somente para proteger o solo da erosão e outros problemas.
Conforme diz o pesquisador da Embrapa Trigo, Marcelo Klein, o ano de 2024 foi composto por vários cenários, positivos e nem tanto, para esta cultura. Ocorreram chuvas regulares, mas, ao mesmo tempo, problemas com a semeadura.
Em áreas que foram semeadas mais tarde, a produtividade foi bem expressiva, assim como a qualidade. “Tivemos casos, no Rio Grande do Sul, em que o produtor conseguiu entre 80 a 90 sacas por hectare com ph de 80, o que é excelente”, relata ele.
Mas, ao mesmo tempo, o Paraná enfrentou secas na região norte e geadas no centro sul, gerando quebras em torno de 35%, finaliza.