O perfil tranquilo e a experiência de quase 22 anos somente na Basf dão ao engenheiro agrônomo Marcelo Batistela as credenciais para enfrentar, como principal executivo do segmento agrícola da multinacional alemã no País, um dos períodos mais desafiadores da agricultura brasileira.

Depois de alguns anos de bonança, com recordes de produção agrícola, de preços das commodities e de resultados na indústria de insumos, o setor está lidando, desde 2023, com cenários bem mais incertos.

“O nosso negócio é um negócio resiliente e fragmentado. E todo negócio resiliente e fragmentado é cíclico”. Essa foi uma das frases de Batistela, na conversa com o AgFeed, para reforçar que uma hora este ciclo de dificuldades vai terminar, só não se sabe quando.

“Mesmo em ciclos mais prósperos, eu não lembro de ter experimentado 50% de ebit (lucro antes de juros e impostos) por hectare como teve lá no agricultor e, geralmente, você consegue capturar valor ao longo da cadeia inteira”, lembra o executivo, sobre o cenário pós-pandemia.

Como este período ficou para trás e agora é hora do “freio de ajuste, na mesma intensidade”, segundo ele, algumas consequências são inevitáveis.

Um deles é a revisão das taxas de crescimento. Entre o fim de 2023 e início de 2024, executivos da Basf falavam em crescer dois dígitos esse ano. Na entrevista concedida em julho, um dos diretores, já se deparando com o comportamento atípico do agricultor, baixou a estimativa para 5%.

Neste fim de ano, Batistela evitou citar percentuais. Apenas repetiu que a Basf terá performance “acima do mercado”. Mas admitiu que o “mercado” piorou ao longo do segundo semestre e que o setor de defensivos poderá fechar 2024 com leve queda em relação ao ano passado.

A outra consequência aparece na área de crédito. Margens apertadas ou até negativas em algumas regiões onde houve quebra de safra foram causando um efeito dominó na cadeia. E o resultado foi uma restrição na oferta de crédito, com elevação do custo do capital.

Vice-presidente de Soluções para Agricultura da Basf no Brasil, Batistela diz que a empresa não passou “ilesa” por esse cenário, mas garante que estratégias que já vinham sendo adotadas minimizaram os efeitos negativos.

Em tempos de preocupação com a saúde financeira das revendas, por exemplo, principalmente depois da recuperação judicial da AgroGalaxy, a Basf se vê menos exposta a esses riscos por ter mudado a forma de abordagem ao agricultor há um ano. Agora atua por sistemas de cultivo e com ferramentas “multicanais”.

Foi criada uma área dentro da própria Basf que cuida exclusivamente do atendimento ao agricultor. Uma estratégia diferente de concorrentes da empresa que optaram por caminhos como abrir lojas próprias ou mesmo criar joint venture com tradings.

Batistela diz que, assim como o mercado em geral, entre 30% e 35% das vendas da indústria de insumos ocorre de forma direta ao agricultor. O restante seria de forma indireta, sendo em torno de 30% via cooperativas e 40% pelas revendas.

Para sofrer menos com a inadimplência, por exemplo, a Basf diz ter sido seletiva.

“Nós fizemos algumas escolhas, de quais são os parceiros que a gente entende que serão o modelo de revenda ou de cooperativa que vão estar aqui daqui 5, 10, 15 anos, baseado numa filosofia ou até numa crença que a gente tem do que é valor para o agricultor”, afirmou.

“Biocontrole” e “Biodiversidade” estão na pauta

Ao falar sobre 2025, o VP da Basf admite que o período de ajuste provavelmente deve persistir.

“Acho que se a gente tiver uma safra mundial 2024/2025 do tamanho que está se projetando ter, principalmente em soja e milho, o preço da commodity não deve ter grandes movimentos. E preço é um dos grandes fatores importantes para dizer quando esse ciclo vai se inverter”, ponderou.

Ele ressaltou, no entanto, que a empresa não quer “comprometer o futuro com o presente”. Por isso um dos pilares estratégicos para 2025 é seguir investindo em tecnologia e inovação, com foco “em tornar a agricultura cada vez mais resiliente, sustentável, fazendo mais com menos”.

A Basf prevê lançar a partir do ano que vem, até o final dessa década, “oito grandes tecnologias e mais de 25 novos produtos”, disse Batistela.

“Essa é uma grande fonte de oportunidade, não só de crescimento, mas também de grande foco e atenção de 2025 em diante. Eu tenho certeza de que vai ser uma coisa disruptiva”, afirmou.

Em biotecnologia, ele mencionou o lançamento, para 2028/2029, de soluções contra o nematoide. “Mas também (haverá novidade) em proteção de cultivo. Temos um novo modo de ação em fungicida, novo modo de ação em inseticida, em herbicida e em tratamento de semente”.

Outra aposta é avançar no mercado de biológicos, algo que diversos concorrentes da Basf também vêm investindo com mais força.

Batistela disse ao AgFeed que, em 2025, “haverá um lançamento em biocontrole bem importante”, mas não revelou detalhes. Confirmou que no pipeline de 35 produtos há, por exemplo, biofungicidas.

A Basf tem ambição de alcançar 10 % do mercado de biológicos. “Fizemos um lançamento importante este ano em tratamento de sementes que compõe essa nossa ambição”.

Hoje o portfolio de biológicos da empresa na América Latina tem mais de 20 produtos.

“O mercado tem tido cada vez mais uma adoção de biológicos, o que eu acho ótimo. A Basf acredita e a nossa estratégia é essa de cada vez mais combinar diferentes tecnologias”.

Em outra frente, Batistela disse que a expectativa é intensificar parcerias com foco em sustentabilidade, que vão desde startups no programa de Open Innovation, até o setor público e ONGs. O objetivo é “encurtar o diálogo” com estes agentes.

O executivo citou como exemplo duas parcerias que tratam de biodiversidade. Uma delas feita esse ano com a Embrapa, avaliou a convivência das abelhas com a soja e demonstrou que a atividade apícola próxima das lavouras poderia elevar em 13% a produtividade. Outro acordo, com a Fundação Solidaridad, da Colômbia, também aborda prática mais sustentáveis na soja.

A terceira prioridade para 2025, segundo o executivo, é fortalecer o novo modelo de acesso aos clientes agricultores, com os multicanais e o atendimento para cada sistema produtivo – soja/milho, soja/trigo, soja/algodão, seriam alguns exemplos, além da abordagem customizada para cada região geográfica, que tem necessidades específicas.

“Em momentos de crescimento rápido ou de grandes oportunidades, você acaba criando ineficiência. E toda vez que a gente tem momentos de ciclo mais desafiador, mais de ajuste, é uma oportunidade ímpar de buscar eficiência”, afirmou.