Segundo colocado entre os grãos mais produzidos no Brasil, o milho pode assumir a ponta nesse ranking, ultrapassando a soja. Essa é a perspectiva do presidente da Associação Brasileira de Milho e Sorgo (Abramilho), Paulo Bertolini.

“Temos tudo para nos tornarmos o país do milho e até produzirmos mais milho do que soja”, disse o executivo. “Em Mato Grosso já aconteceu.” O Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) estima que a produção de milho na safra 2024/2025 no estado será de 45,54 milhões de toneladas, enquanto a de soja alcançará 44,04 milhões de toneladas.

O cenário de evolução projetado pelo presidente da Abramilho é sustentado pelo avanço das oportunidades para o milho brasileiro. No mercado nacional, um dos principais estímulos vem do crescimento das usinas de etanol à base do grão.

“Essas empresas proporcionam mais liquidez para o setor e ampliam as negociações de contratos futuros nas regiões de fronteira agrícola”, afirmou Bertolini.

Segundo a União Nacional do Etanol de Milho (Unem), a moagem do cereal para produção de biocombustível deve chegar a 12,21 milhões de toneladas na safra 2024/25, volume 20,7% maior do que o da temporada passada (10,11 milhões de toneladas).

Ainda conforme a entidade, o Brasil tem atualmente 22 biorrefinarias em operação, nove projetos com autorização de construção pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e 11 unidades programadas para serem construídas.

Nas lavouras, o momento de formação da próxima safra (2024/25) nacional de milho está favorável. Levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), realizado no início de novembro, mostrou que o plantio da primeira safra do grão já havia passado de 42% dos 3,7 mil hectares previstos.

E com rendimento acima do registrado na temporada passada, favorecido pelo equilíbrio entre os fatores climáticos, com alternância entre bons volumes de chuvas e períodos de sol.

A estimativa da Conab para a produção brasileira total de milho na safra 2024/2025 é de 119,8 milhões de toneladas, volume 3,6% superior ao da temporada passada, com 115,7 milhões de tonelada.

A produtividade também deve crescer (3,8%), passando de 5,5 toneladas por hectare para 5,7 mil toneladas por hectare. Já a área plantada tende a se manter quase igual, com tendência para queda. A redução será de 0,2%, totalizando 21,01 milhões de hectares no período atual, enquanto em 2023/24 foram 21,05 milhões de hectares.

Nesta primeira safra, a redução de área é maior, chegando a 5,2%. A estimava atual é de 3,75 milhões de hectares, enquanto na primeira temporada de 2023/2024 foram cultivados 3,97 milhões de hectares.

Essa diminuição, segundo a Conab, está diretamente relacionada à concorrência comercial com outras culturas, pois os preços do milho não vinham sendo atrativos o bastante para evitar a perda de espaço.

O cereal até chegou ao terceiro mês com valorização na Bolsa de Chicago, mas a alta vem perdendo força, conforme a recém-publicada análise Agro Mensal do Itaú BBA. Se em setembro as cotações avançaram 6%, em outubro cresceram 4% e, em novembro, a o aumento se aproximou de 2%, chegando a USD 4,23 por bushel.

Esse panorama de preços ainda crescentes é consequência da boa demanda pelo milho dos Estados Unidos, que apresentou ritmo de exportação mais forte do que no ano passado.

Outro fator que contribui para esse cenário é a sinalização de queda na produção de milho da Ucrânia e da União Europeia, que impacta o mercado global.

E também influencia o mercado nacional, intensificando os efeitos da conjuntura interna, que registra forte demanda, valorização do dólar e vendas retraídas. Ou seja, há redução da oferta disponível.

Visão do mercado externo

Em relação às exportações brasileiras de milho, o Itaú BBA informou queda entre os períodos de fevereiro a outubro deste ano e de 2023. De acordo com o banco, nesses nove meses de 2024, o Brasil enviou ao mercado externo 25,9 milhões de toneladas do grão, volume 28,5% menor do que em igual período do ano passado.

Segundo a análise do Itaú BBA, “o programa de exportação, com os lineups, aponta 34,4 milhões de toneladas, 18 milhões de toneladas atrás de 2023, com o Brasil sendo pouco atrativo em relação às outras origens, como Estados Unidos, Ucrânia e Argentina, além da ausência da China, maior importador do cereal, nas compras”.

A China é um capítulo à parte no estudo apresentado pelo Itaú BBA, levando-se em conta a revisão, para baixo, da importação de milho pelo gigante asiático, conforme dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).

Devido à expectativa de uma produção maior dos chineses na safra 2024/25, somada ao ritmo lento de compras, as importações de milho pela China foram revisadas de 19 milhões de toneladas em outubro para 16 milhões de toneladas em novembro. De um mês para o outro o volume foi reduzido em 3 milhões de toneladas, resultando no menor volume de compras desde a safra 2019/20.

Outra redução de estimativa do USDA refere-se à produtividade norte-americana do milho, resultando em queda de 1,5 milhão de toneladas na produção, que deve ficar em 384,6 milhões de toneladas.

Essa retração não elimina o fato de que a colheita nos Estados Unidos continuará sendo robusta. Na verdade, ainda uma das maiores da história do país, mantendo confortável o balanço de oferta e demanda, com aumento dos estoques finais e da relação estoque/consumo, apesar da expectativa de maior demanda para exportação.

O Itaú BBA apresentou ainda informações sobre a Argentina. Com a chegada das chuvas – que estavam atrasadas –, o plantio avançou, se aproximando da performance média dos últimos anos.

Mesmo com a expectativa de uma área menor com milho em solo argentino, o avanço na produtividade tem sido suficiente para a manutenção das projeções de produção do USDA e da Bolsa de Rosário em torno de 50 milhões de toneladas.

Já em relação ao balanço global, o USDA acenou com uma pequena alteração. Considerando a produção menor nos Estados Unidos, a estimativa para o estoque final mundial passou de 307 milhões de toneladas no relatório de outubro para 304 milhões de toneladas em novembro. Proporcionalmente falando, 3 milhões de toneladas é uma queda não tão expressiva.

Enquanto isso, por aqui os negócios com o milho estão abaixo da média dos últimos anos, tanto para a safra 2023/24 quanto para a 2024/25. E logo o setor pode vir a sentir uma pressão em relação aos preços, assim que a safra da soja se aproximar, pois será necessário haver liberação de silos para armazenar a oleaginosa.

A infraestrutura está na lista dos principais desafios para o desenvolvimento da produção do milho, na opinião de Bertolini. “O déficit de armazenagem no setor de grãos cresce cerca de 5 milhões de toneladas por ano e já passa de 120 milhões de toneladas”, disse o dirigente, citando dados de um levantamento feito pela consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio.

Segundo o presidente da Abramilho, no revezamento com as safras da soja, o milho acaba perdendo a concorrência pelos silos. Sem espaço para secar e armazenar o grão, os produtores se veem obrigados a colocá-lo no mercado e acabam perdendo liquidez.

“A falta de armazém gera perdas de aproximadamente R$ 35 bilhões todos os anos”, afirmou Bertolini.

Negócio da China

Enquanto buscam soluções para eliminar, ou pelo menos reduzir, as perdas que acontecem pelo caminho do milho, os representante da cadeia produtiva também se dedicam a conquistar mais oportunidades para o setor.

Foi o que aconteceu na primeira quinzena de novembro, quando a Abramilho liderou a Missão Empresarial Brasil-China, que levou uma delegação brasileira à Ásia para estreitar laços comerciais e institucionais com os chineses.

Entre os temas de destaque nessa visita estava a assincronia das aprovações de eventos de biotecnologia entre os dois países. Falando especificamente de sementes geneticamente modificadas, seja por transgenia, seja por edição genética, a falta de sincronismo nos processos de aprovação desses materiais vem impedindo que os produtores brasileiros tenham acesso a novas e melhores tecnologias.

“Eles só começam o processo de aprovação após o produto já estar aprovado no país de origem. É muito moroso e não sabemos em que ponto está”, disse Bertolini.

O chefe-geral da Embrapa Soja, Alexandre Nepomuceno, que também integrava a delegação brasileira, sugeriu a utilização de um protocolo já está em funcionamento entre Brasil e Argentina, no qual um país reconhece os processos de aprovação da tecnologia realizados no outro.

No mínimo, a chance de debater o assunto “olho no olho” gerou uma resposta positiva dos chineses de que há intenção de intensificarem a colaboração nessa questão.

Outra boa notícia que os brasileiros trouxeram dessa missão à China é o reconhecimento da qualidade do milho produzido no Brasil.

“Ouvimos de vários clientes que o nosso milho é o melhor que eles recebem. Não pouparam elogios ao nosso produto”, afirmou Bertolini.

Segundo o dirigente, embora isso ainda não signifique uma valorização financeira direta, no médio e no longo prazos, em uma situação de preços equalizados, o milho brasileiro tende a levar vantagem sobre o de outros países.