Depois de uma safra com muitos problemas causados pelo El Niño, que durou até abril deste ano, analistas e meteorologistas passaram a precificar que a temporada 2024/2025 enfrentaria uma La Niña já na primavera deste ano.

O resfriamento do Oceano Pacífico, que é quem dita o fenômeno, se chocou com a escalada de temperaturas a nível global e enfraqueceu o movimento.

Na visão do meteorologista Willians Bini, esse aquecimento global pode estar reduzindo a taxa de resfriamento do Oceano Pacífico. “Por enquanto, nesta primeira quinzena de outubro de 2024, ainda estamos em uma condição de neutralidade climática”, diz.

De acordo com o NOAA (Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos), órgão que monitora esses fenômenos climáticos, indicou, em relatório da semana passada, uma La Niña breve, de fraca intensidade e com menor influência sobre o clima.

No documento, a instituição pontuou que o fenômeno tem 60% de chance de ser confirmado até novembro deste ano e deve persistir até o trimestre entre janeiro e março de 2025.

Nesta semana, o departamento de meteorologia da Austrália fez coro ao par americano e afirmou que a probabilidade de uma La Niña nos próximos meses diminuiu.

Olhando para o Brasil, Bini acredita que o impacto do La Niña na safra de grãos seja limitado no Centro-Oeste, principal região produtora.

“Espera-se que a partir de dezembro as chuvas se tornem mais regulares, beneficiando a umidade do solo”, afirma.
Ludmila Camparotto, agrometeorologista da Rural Clima, acredita que mesmo com essa tendência de chuvas regulares, os produtores devem observar intervalos entre as precipitações.

“Acredito em chuvas relativamente abaixo da média, principalmente falando na primavera, mas chuvas mais bem distribuídas, que é o que importa para a agricultura”.

No Centro-Oeste, ela vê a condição favorável ao início e desenvolvimento das lavouras e acredita que os produtores devem acelerar o plantio nas próximas semanas, já prevendo essa regularidade.

No Matopiba, ela espera que as chuvas cheguem, de forma mais regular, entre o final de outubro e o início de novembro, fazendo com que o plantio local atrase ainda mais.

A região Sul, que historicamente sofre com o La Niña, pois o fenômeno traz uma escassez hídrica local, preocupa, mas se o cenário mais fraco se confirmar, os estados podem se beneficiar.

Nas safras 2020/2021, 2021/2022 e 2022/2023, sob efeito de La Niña, os estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul tiveram grandes prejuízos na produção. Com um La Niña mais curto e menos intenso, espera-se que os impactos negativos no regime de chuvas sejam menores, estima Bini.

No Matopiba, o La Niña costuma trazer chuvas mais abundantes. “Apesar de a última safra, sob o efeito do El Niño, ter sido bastante produtiva, um La Niña fraco ainda pode favorecer um regime de chuvas mais estável, o que seria extremamente positivo para os produtores da região”, diz Bini.

Já o Norte do Brasil, que enfrenta uma longa estiagem, também pode se beneficiar do retorno das chuvas, mesmo com um La Niña de baixa intensidade.

Nem tudo é bonança, no entanto. Com mais chuvas, Ludmila Camparotto relembra que a incidência de pragas pode aumentar no cultivo da soja. Segundo ela, a formação de um corredor de umidade na faixa central do País é um “prato cheio para doenças”.

“O produtor tem que estar com produto dentro da fazenda na hora que precisa aplicar, demanda muito planejamento. Ele precisa ficar atento ao timing de aplicações preventivas”, afirmou Camparotto, da Rural Clima.

O desafio da segunda safra

De maneira geral, a safra 2024/2025 vem sendo impactada por uma longa estiagem e altas temperaturas, o que atrasou o início da semeadura. Isso pode trazer consequências para o final da safra de soja e para o início da segunda safra, já em 2025.

No entanto, essa condição de seca e calor não está diretamente relacionada ao início ou à intensidade do La Niña. Portanto, quaisquer prejuízos que ocorram na safra 2024/2025 não podem ser atribuídos ao La Niña, que ainda está se formando.

O cenário de um clima um pouco mais estável pode ajudar produtores que, de forma geral, estão atrasados no plantio da soja. Segundo um relatório da semana passada do Pátria Agronegócios, o plantio da oleaginosa brasileira avançou na última semana, atingindo 9,3% da área concluída, mas ainda de forma modesta.

A questão é que em 2023 o montante plantado chegava a 17,40% e em 2022 era de 22,60%. A média dos últimos cinco anos apontava 17,5% de área plantada para esse período, o que mostra que o ritmo da safra 2024/2025 está bem lento.

"O avanço do plantio segue concentrado no Centro-Sul brasileiro, com destaque para o Paraná. No Centro-Oeste, o plantio caminha lentamente, aguardando melhores chuvas que são projetadas para a próxima semana", pontuou o Pátria Agronegócios.

Segundo Bini, o atraso está mais relacionado a um carrego da safra passada do que da expectativa dos produtores com uma melhora no clima. Por conta do atraso do plantio na temporada passada, muito por conta da seca e chuvas desreguladas, toda temporada acabou “atrasando”. Com isso, o Mapa liberou a semeadura da soja em setembro.

A grande questão fica para o futuro. “De forma geral, pelo que vi nas projeções, a La Ninã será ou fraca ou de curto impacto, o que vejo como positivo, pois traz condições de chuva na região amazônica e no Centro-Oeste. Matopiba também deve ter outro ano bom, a preocupação é com o Sul do País”, afirmou Bini.

Na região do Mato Grosso, apesar dos microclimas, o estado como um todo deve encontrar chuvas regulares e dentro da média histórica a partir da segunda quinzena de outubro.

“Vejo com bons olhos a hidrologia ajudando a manter uma chuva nos acumulados mensais dentro da média. A preocupação era ver uma continuação de escassez, o que não está mais nas projeções”, afirma Bini.

Bini explica que as projeções dos órgãos internacionais indicam que vai chover na hora certa. Os modelos preditivos preveem essa regularidade até fevereiro do ano que vem, assim a preocupação pode estar no início da safrinha.

Se para a soja a condição é favorável em todo o País, o ponto de atenção fica para a segunda safra de milho. Além do aperto natural de calendário que o atraso da soja já causa, uma incerteza quanto ao pico da La Niña e sua intensidade, que pode trazer muita umidade no momento da colheita da oleaginosa e plantio do cereal.

“Dependendo do ciclo da soja, a colheita pode ocorrer em um período mais úmido entre janeiro e fevereiro. O produtor até colhe, mas não necessariamente consegue plantar, vai depender do terreno”, pontua a agrometeorologista.

Segundo o meteorologista Willians Bini, os produtores precisam olhar com atenção para as chuvas no período de colheita da soja e plantio do milho, que pode ser prejudicado pela chuva.

“Pelo que vi, fevereiro será um mês com chuva acima da média. O produtor terá de ser rápido e terá dificuldade de achar janelas operacionais principalmente diante do atraso do plantio, que já está consolidado”, afirma.