De um lado uma empresa brasileira que foi fundada por um ex-executivo da Tesla e mais dois sócios, a Micropower. De outro, uma empresa de origem austríaca que vem avançando no mercado de irrigação do Brasil, a Bauer.

O casamento improvável ocorreu por meio de uma parceria comercial e, mais especificamente, de um projeto que virou realidade na Fazenda Santa Paula, que fica em Barreiras, no oeste da Bahia.

É fato que investir em irrigação pode multiplicar a produtividade das lavouras. Mas também é consenso que o investimento nem sempre é acessível e que possui muitos desafios de implantação. Entre as premissas está o acesso à energia elétrica, para movimentar os pivôs.

Em entrevista ao AgFeed, o CEO da Bauer, Rodrigo Parada, e o CEO da Micropower no Brasil, Sergio Jacobsen, explicaram como foi viabilizada a parceria entre as duas empresas.

“A Bauer tinha uma limitação de crescimento de pivôs, de acessar o mercado, que era a falta de energia em algumas regiões. E nós conseguimos entregar energia de forma distribuída para quem não tem rede elétrica. É aí que casou essa necessidade com a minha oferta”, afirmou Jacobsen.

Apesar do momento de margens mais apertadas na agricultura, o CEO da Bauer diz que a empresa espera fechar 2024 com aumento de 30% nas vendas. No primeiro semestre houve um crescimento de 12%.

“Acho que o grande ponto é que a irrigação, diferente de outros mercados que têm maquinário, é o único mercado em que você pode aumentar a produtividade de um cliente. Quando você coloca uma máquina melhor, ela não vai produzir mais naquela área por causa disso. Você pode colher mais rápido, mas ela não produz mais”, ressaltou Parada.

A maior área de atuação da Bauer é justamente o estado da Bahia, segundo Parada, um importante polo de agricultura irrigada no País, mas que ainda enfrenta falta de acesso a energia em algumas áreas.

Um exemplo disso é o fato de que a Micropower, antes mesmo de fechar a parceria, já era uma das responsáveis por um projeto que levou energia solar e o uso de baterias para o município baiano de Remanso.

A empresa é especializada em projetos de armazenamento de energia. Atualmente é uma joint venture (criada em 2017) por Comerc Energia, Siemens e Equinor. Já no início, trouxe a proposta de substituir ou complementar a geração por óleo diesel. Por isso, tem atuado, por exemplo, nos programas governamentais que levam energia elétrica para comunidades mais isoladas.

Projeto “único no mundo”

Na fazenda da Bahia, que materializou o trabalho conjunto da Bauer com a Micropower, o projeto consiste no que as empresas chamam de “microrrede”.

É um conjunto de soluções para geração e armazenamento de energia solar que está viabilizando o funcionamento de 30 pivôs para a irrigação de 7 mil hectares onde já foi colhida uma safra feijão e, em breve, serão plantados soja e algodão. A fazenda tem ao todo 12 mil hectares.

Sem acesso ao serviço da concessionária de energia local, a fazenda dependeria de outras fontes para operar a irrigação como, por exemplo, o uso de óleo de diesel. As empresas calculam que, ao reduzir o uso do combustível, tenham gerado uma economia de R$ 2,47 milhões para a fazenda.

Para os executivos, trata-se de um projeto “inédito” no Brasil e possivelmente no mundo. Isso porque está baseado num sistema híbrido (solar/bateria/hidrelétrica e diesel, se for o caso), com um software de gerenciamento que vai indicando qual fonte de energia é a mais barata a cada momento.

A usina solar da fazenda tem 23 mil metros quadrados e o sistema também é integrado com uma PCH, Pequena Central Hidrelétrica, usina de tamanho e custos reduzidos para gerar energia hidrelétrica.

“Quando passa a usar também a bateria, você substitui o diesel praticamente. Você vai usar em alguns momentos, quando não tem tanto sol e não choveu o suficiente para irrigar. É aí que entra a bateria. E a inteligência do software define a fonte, da mais barata para a mais cara. A mais cara vai entrar em última instância”, explicou Jacobsen.

Ele destaca que a energia solar sozinha oscila muito. “Se passar uma nuvem, ela cai para menos da metade. E a bateria dá essa firmeza. Vai ficar o dia inteiro carregando e descarregando. Passou a nuvem, ela descarrega”.

Rodrigo Parada, da Bauer, conta que em várias fazendas novas da Bahia, para conseguir energia elétrica o próprio produtor rural é obrigado a investir na linha de rede. “E é caríssimo, chega a R$ 200 milhões”.

Com a solução proposta agora, esperam atrair boa parte dos clientes da região, que adotam um custo bem mais baixo, já que o modelo de negócio da Micropower é o chamado “as a service” – ou seja, tudo que precisar ser instalado será feito pela própria empresa. O produtor apenas pagará pelo serviço que utilizar, como se fosse uma mensalidade.

As empresas não revelam detalhes deste custo, mas dizem que em alguns casos ficam próximos do valor das concessionárias, que em alguns casos seria de R$ 0,60 por kw/hora.

“A partir da hora que você cria esse projeto, com bateria, solar, mais diesel na operação da fazenda, você permite que qualquer fazenda possa gerar sua energia própria, sem depender do investimento do governo”, disse Parada.

Os executivos estimam que o custo do novo sistema seria de cerca de R$ 6 por milímetro irrigado. Se o produtor 100% diesel, gastaria cerca de R$ 15.

As empresas fizeram um dia de campo no oeste baiano com a participação de pelo menos de 30 agricultores irrigantes.

“Tem muito produtor que acaba não seguindo pra esse lado, então simplesmente não acontece. Vimos que muitos ficaram entusiasmados ao conhecer o sistema”, disse Jacobsen.

Parada, da Bauer, lembra que o investimento em irrigação tem durabilidade de 30 anos. “Por isso é um mercado que não cai tanto quanto o maquinário, pessoal continua investindo porque retorno é alto”.

Com menor uso de diesel, a expectativa também é de ganhos ambientes. “O sistema híbrido nesta fazenda evita a emissão de mais de 970 toneladas de CO2 anuais na atmosfera”.