Depois de chegar ao "fundo do poço" neste ano, sofrendo com a queda dos preços das commodities e a seca que afetou os resultados no campo, a indústria de máquinas e equipamentos agrícolas deve ter um 2025 mais estável.

A avaliação é da Comissão Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

"Não vai ser um ano maravilhoso, mas não vai ser uma catástrofe", definiu Pedro Estevão, presidente da comissão da Abimaq.

O dirigente apresentou, nesta sexta-feira, dia 4 de outubro, os dados referentes a 2024 e as perspectivas para o próximo ano, durante a 24ª edição do Seminário de Planejamento Estratégico Empresarial, evento da entidade que reúne anualmente as empresas do setor.

Os números deste ano foram de fato ruins. De acordo com dados apurados até setembro, o setor de máquinas e equipamentos agrícolas deve faturar R$ 56 bilhões este ano, montante que representa um recuo de 25% em relação ao ano passado, quando o segmento havia registrado um faturamento de R$ 74 bilhões - e bem abaixo dos R$ 95 bilhões vistos em 2022.

Estevão detalhou, em conversa com a reportagem do AgFeed, que o recuo já era esperado devido a mais um momento de baixa das commodities.

“A soja e o milho têm um peso muito grande na venda de máquinas. O preço (atual da soja) não é bom, estamos a 10 dólares o bushel e isso prejudica o produtor”, afirma ele.

“A seca também foi um forte agravante nessa safra, diminuindo a produtividade e a rentabilidade. Com isso, o produtor não faz o investimento”, afirma.

À frente, a perspectiva é de melhora gradual nos próximos anos, com mais estabilidade.

“Considerando que, no ano que vem, não teremos um problema climático, 2025 seria um ano ‘normal’, nem bom, nem ruim, um ano em que o pessoal vai levar os negócios em frente”, afirma.

“2024 seria o fundo do poço. O ano que vem será um pouco melhor em termos de volume e assim vai melhorando sucessivamente, até termos um ciclo de commodities melhor”, acrescenta.

Uma pesquisa feita entre as empresas do setor durante o evento indicou que, no ano que vem, as companhias devem experimentar uma alta de 8,2% no faturamento vindo das vendas de máquinas.

"No ano passado, essa pesquisa dizia que iria cair 7%. Só caiu mais por causa da seca, mas o faro do pessoal não é ruim", afirmou Estevão durante o evento. "O pessoal está um pouco mais otimista."

Mesmo que ainda existam dificuldades no campo, culturas como café e citros, além de movimentos do setor portuário e de cooperativas, devem contribuir para a expansão das vendas do setor no ano que vem, de acordo com o consultor Carlos Cogo, sócio diretor da Cogo Inteligência em Agronegócio e um dos nomes mais reconhecidos dentro do setor, que fez uma palestra durante o evento.

Ele projeta um aumento de 7% na venda de tratores e de 5% na comercialização de colheitadeiras no ano que vem.

“Mas ainda vai ser um ano para ficar abaixo da média e abaixo dos melhores anos”, afirma ele.

Cogo disse também que já está havendo “leve recuperação” na venda de máquinas e tratores.

Ele trouxe um caso concreto recente: “Estive com uma associação de revendedores de uma montadora, e eles disseram que um só revendedor teve encomenda de 650 tratores para café.”

Há 48 anos atuando nesse segmento, Estevão é um veterano de crises. Ele diz que já enfrentou outros momentos ruins de maior impacto, na década de 1980 e, mais recentemente, na safra 2005/2006.

“Esse sobe-e-desce sempre foi assim, o pessoal de máquinas agrícolas sabe que é assim”, afirma Estevão. “Nem estamos diminuindo muito a mão-de-obra, por exemplo.”

Otimismo permanece

Em conversas com representantes do setor ao longo do evento, o AgFeed ouviu queixas sobre o momento atual, especialmente sobre o custo de capital muito restritivo hoje no País, mas também a possibilidade de melhora à frente.

Na Baldan, o plano de investimentos de R$ 200 milhões de desenvolvimento de produtos e instalações para produzir pulverizadores e plantadeiras, que começou no ano passado e está previsto para ser executado ao longo de 24 meses, não foi alterado.

“A reação normal é adiar os investimentos. Mas quando você toma essa decisão, põe o seu negócio em risco. Não vamos adiar o investimento, mas vamos dosar o investimento ao longo do tempo. O presente é de ajuste”, disse Fernando Capra, CEO da companhia. “O desafio é conseguir o recurso, que está caro.”

Para ele, os investimentos não podem parar porque a indústria precisa estar preparada para um novo ciclo de bonança do agro mais à frente.

“Essa retração (de nível de faturamento) é normal. A recuperação virá mais adiante e a indústria tem de estar pronta para atender à demanda futura. Só que o nosso tempo de reação é diferente, precisamos planejar com mais antecedência. Esse é o momento de fazermos investimento, para garantirmos melhor produtividade e prontidão mais adiante”, afirmou.

Nicolas Guillou, CEO da filial da francesa Kuhn no Brasil, diz que a empresa seguiu investindo neste ano no aumento de sua rede de distribuição e em incrementos da área de pintura em sua planta localizada em São José dos Pinhais (PR) – a empresa também possui uma outra unidade industrial, em Passo Fundo (RS).

O faturamento da Kuhn, no ano passado, foi de R$ 1 bilhão. Nesse ano, deve ser mais baixo.

“O momento realmente é mais difícil em termos de mercado. Diferente da indústria de insumos, que sempre vai vender para o produtor, a nossa indústria pode sofrer com a decisão do produtor de não investir naquele ano. O preço do grão hoje é baixo, o custo de capital baixou um pouco, mas não o suficiente, a taxa de juro é alta e os bancos estão muito mais receosos em assumir risco”, afirma.

Apesar do momento ruim, Guillou diz que a empresa segue otimista com as perspectivas do mercado brasileiro no longo prazo.

“Passamos por outros ciclos difíceis em 20 anos de mercado. A própria Kuhn, com 196 anos de história, passou por crises, guerras. Mas as tendências para o Brasil são de crescimento. Nós temos certeza absoluta de que, daqui a 20 anos, a produção agrícola brasileira talvez vá dobrar ou até mais.”, afirma.

Outro veterano do setor, o empresário João Carlos Marchesan, presidente da Agrishow e integrante do conselho da Tatu Marchesan, tradicional empresa do setor de máquinas e implementos, vê o futuro menos positivo.

Ele elenca quatro fatores que pesam nos negócios e com dinâmicas específicas entre si: clima, câmbio, crédito e commodity.

“O clima poderá melhorar agora. Já o câmbio está estável, mas o dólar pode se desvalorizar perante o real. O preço das commodities não parece mudar e o crédito é raro e caro, muito caro. O custo do dinheiro está muito alto.”

Tendo em vista o impacto do cenário macro e as dúvidas sobre a safra 2024/2025 que ainda permanecem, Marchesan trabalha com um cenário de incertezas para os próximos meses.

“O primeiro trimestre do ano que vem será difícil. Só vamos ter alguma ideia depois que colher a safra que recém começou a ser plantada, em fevereiro e março.”, afirma.

“Se os preços estiverem melhores e o agricultor fizer dinheiro na colheita, ele vai plantar a segunda safra e nós vamos ver para que lado o mercado vai. Até agora é tudo uma incógnita”, emenda ele.

Quanto à Agrishow, Marchesan avalia que o evento do ano que vem terá um desempenho “muito bom”, mas prefere não cravar uma previsão de volume de intenções de negócios para a próxima edição.

Neste ano, o número foi de R$ 13,6 bilhões, crescimento de apenas 2,4% em relação a 2023.

“Ainda não posso dizer que vai ser melhor que o ano passado, mas vamos trabalhar para ser pelo menos igual.”