Após quase dois anos e oito meses do início da invasão da Ucrânia pelas tropas russas, certamente ainda estão claros na memória dos players do agronegócio brasileiro – e de muito mais gente – os impactos desse conflito sobre o setor.
Alguns estavam diretamente relacionados aos fertilizantes, seja pelo aumento do custo das matérias-primas, seja pela preocupação com o desabastecimento. Tal sensação volta a rondar o segmento por conta dos confrontos envolvendo Israel e Irã. E os sinais já aparecem nas cotações dos insumos.
Na última semana de setembro, o valor (FOB) da ureia foi cotado a US$ 350/tonelada em Nova Orleans (EUA) e a US$ 371/tonelada no Egito.
Já na primeira semana de outubro, esses preços passaram a US$ 358/tonelada e US$ 378/tonelada, respectivamente. Os dados são da consultoria StoneX.
De acordo com o analista de Inteligência de Mercado da empresa, Tomás Pernías, até o momento não há qualquer relato ou notícia de impacto na estrutura produtiva de fertilizantes no Oriente Médio.
“Isso não quer dizer que não haja um impacto na percepção dos investidores, por causa das incertezas que um conflito armado pode trazer”, disse o especialista.
O fato de aquela região responder por 39% da exportação mundial de ureia torna a percepção de risco ainda mais sensível, pois qualquer escalada no conflito pode significar um prejuízo real à produção. “E se essa escalada for muito grande, o abastecimento de fertilizantes pode ficar abalado”, afirmou Pernías.
Segundo informações da StoneX sobre exportações globais de ureia em 2022, o Catar foi responsável por 10%; Irã, 8%; Arábia Saudita, 8%; Egito, 8%; Omã, 6%; e Emirados Árabes, 3%.
O Brasil ainda é muito dependente do mercado externo para atender sua demanda de fertilizantes nitrogenados e grande parte das importações brasileiras do insumo no ano passado veio exatamente dessa parte do mundo, sendo 22% de Omã e 18,4% do Catar.
Daí a preocupação do pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – Cepea Esalq/USP, Mauro Osaki, com os desdobramentos dos ataques entre Israel e Irã.
“Caso tome dimensões regionais, envolvendo outros países ao redor do Irã, acaba gerando certo temor inclusive de deslocar navios até a região para fazer o carregamento dos fertilizantes”, disse.
Esse hipotético cenário ainda traria elevação de custos de frete e de seguro, encarecendo ainda mais a logística e o fornecimento dos fertilizantes. E, diante de qualquer restrição do acesso a esse mercado, o Brasil precisaria redirecionar sua demanda, buscando fornecedores como Rússia, Argélia, entre outras fontes.
A apreensão não se restringe aos nitrogenados. Em 2023, cerca de 8% das importações brasileiras de cloreto de potássio vieram de Israel, conforme dados da StoneX. O risco de uma escalada no conflito envolve diferentes classes de fertilizantes.
Pernías, da StoneX, observa que há outros fatores a serem levados em consideração sobre o mercado internacional. A Índia abriu recentemente uma licitação para a aquisição de fertilizantes, aumentando a demanda do insumo.
E a China, que é grande exportadora, tem uma política muito rígida para preservar seu abastecimento e controlar preços. “Se perceberem qualquer risco, vão tomar medidas para manter deu produto no mercado interno”, afirmou. “Isso já está ocorrendo.”