Quem avalia o balanço de uma empresa costuma, em geral, bater primeiro os olhos nos grandes números, para depois se dedicar aos detalhes. No caso dos resultados do segundo trimestre de 2024 da plataforma de varejo de insumos agrícolas AgroGalaxy, a própria empresa indica um roteiro diferente.
“O faturamento é muito pouco relevante nesse momento do ano”, afirma Axel Labourt, CEO da empresa, logo no início da exposição do balanço do período a um grupo de jornalistas. “É hora de olhar para o encarteiramento”.
O executivo apoia-se no ciclo do mercado em que atua, que normalmente apresenta um primeiro semestre com volumes mais baixos de vendas e uma concentração maior de receita no segundo semestre, quando os agricultores realizam a maior parte das encomendas de insumos a serem usados na safra de verão e, mais para o fim do ano, começam a se preparar para o plantio da safrinha.
Não foi diferente em 2024, com o agravante de que o cenário de menor rentabilidade e maior incerteza fez os produtores adiarem suas compras ou até mesmo reduzirem os pedidos ao mínimo essencial.
A própria AgroGalaxy optou por concentrar seus esforços em linhas mais rentáveis de produtos, diminuindo voluntariamente as vendas de itens com maiores volumes mas menores margens.
Com isso, o segundo trimestre deste ano foi ainda inferior, em receita, ao mesmo período de 2023, que já havia sido bem mais fraco que o de 2022.
O R$ 1,1 bilhão apurado agora foi 42% menor do que o faturado em 2023, enquanto o lucro bruto ajustado atingiu R$ 51 milhões neste trimestre, contra R$ 93 milhões há um ano. A margem, entretanto, caiu apenas 0,03%, ficando estável na casa de 4,8%.
“Vendemos menos, mas vendemos melhor”, resumiu Labourt.
A visita guiada por ele e pelo CFO Eron Martins aos números do balanço fazia paradas para destacar dados que, segundo eles, demonstram os efeitos de uma série de ações tomadas pela gestão da companhia desde o ano passado, quando o cenário do setor ficou mais restritivo.
A empresa literalmente encolheu desde então, com 19 lojas e cerca de 600 funcionários a menos. Contando as economias feitas com esses e outros ajustes organizacionais, houve uma redução de R$ 26 milhões nas despesas do trimestre, somando mais de R$ 180 milhões nos últimos 12 meses, quando comparados aos 12 meses anteriores – e com meta de atingir R$ 200 milhões até o fim de 2024.
Além disso, os níveis de estoques, que haviam sido reduzidos a um patamar considerado “saudável” – entre 15% e 20%, segundo Martins – foram mantidos.
Mais relevante que isso, entretanto, são os indicadores que, segundo Labourt, “indicam que o momento da virada está chegando”.
O que mais anima o CEO do AgroGalaxy é a aceleração das vendas a partir do final de maio e do início de junho, depois de meses em que os agricultores se mostravam reticentes em fazer aquisições.
Martins lembrou que, na divulgação do balanço do trimestre anterior, a avaliação do mercado era de que, naquele momento, o ritmo de aquisições de insumos estava pelo menos 20 pontos percentuais mais lento em relação ao mesmo período de 2023.
Depois disso, no mês de abril e quase todo o mês de maio, o mercado continuou represado. “Mas a partir dos últimos dias de maio e junho e já entrando no terceiro trimestre, o mercado que recuperou parte desse atraso e agora, no final de julho, já há dados estatísticos de que o mercado poderia estar a alguns pontos percentuais acima do ano passado”.
Martins disse que esse desempenho mais recente coincidiu também com o sucesso de campanhas realizadas pelo AgroGalaxy para a venda de insumos biológicos, que oferecem maiores margens, e outra para valorização do milho safrinha nas operações de barter.
Com esse impulso, diz, a empresa conseguiu originar mais de 2,5 milhões de sacas de milho, devendo superar, até o fim de agosto, a meta de 3 milhões.
“Realmente o mercado e o agricultor voltaram a comprar, naturalmente muito condicionado pela questão de que já colheu quase todo o milho da safrinha e daqui a pouco vamos ter a adubação e a semeadura nos campos para a safra de verão. A safra não tem como esperar mais, o agricultor precisa se posicionar naqueles insumos que são vitais para o plantio”.
Outra parada relevante no roteiro de Labourt e Martins foi para detalhar justamente os números referentes aos negócios na modalidade de barter. Eles destacaram que no segundo trimestre a modalidade respondeu por 42% dos negócios da empresa, praticamente triplicando, em volume, o realizado no mesmo período de 2023 – 377 mil toneladas contra 105 mil toneladas.
“É um resultado que nos traz, além de satisfação, um sinal muito saudável do agronegócio, mostrando que o agricultor está mais inclinado a tentar segurar os custos operacionais, o que traz, não só para ele, mas também para toda a cadeia, maior certeza para receber as contas”, diz Labourt.
Nas finanças da companhia, lembra Martins, barter significa a possibilidade de trocar grãos por pacotes de insumos de maior valor e com maiores margens.
“A gente tem falado muito de margens nos últimos trimestres”, afirma Martins. Segundo ele, boa parte da queda de volumes nas vendas é resultado, justamente, da estratégia de “tirar o pé” do fertilizante para priorizar produtos com maior rentabilidade para a empresa.
Um exemplo disso, segundo ele, é que, no trimestre, os produtos das chamadas linhas de especialidades atingiram, no mix de vendas, 17% da receita do grupo, contra 12% no trimestre anterior e 9,4% no ano passado.
“Esse incremento vem justamente do fato de que nós fazemos uma venda muito consultiva, que permite ao produtor ver que a coisa funciona”.
Martins ressalta ainda que a redução de 48% nas vendas, em relação ao segundo trimestre de 2023, poderia ter sido menor não fosse o fato de R$ 90 milhões comercializados no final de junho não terem sido contabilizados no período, por conta de os produtos não terem sido efetivamente entregues até o fechamento do mês. Caso isso tivesse acontecido, a redução ficaria em 25%.
A boa notícia é que esse faturamento já encorpa, logo de início, o resultado do terceiro trimestre, que gera expectativas bastante positivas no grupo.
“O que acontece, do ponto de vista do faturamento, é que a partir do terceiro trimestre nós já vamos ver um faturamento muito maior, porque é uma questão de demanda agronômica. Esses produtos precisam ir para o campo, a gente precisa faturar, então realmente nós vamos ver isso se materializar nos resultados, diz Labourt.
“Vale a pena destacar que vai ser uma safra em que o acúmulo de negócios no final do ano vai ser grande novamente”.
Tendência de repique “nervoso”
Para o segundo semestre, os executivos acreditam que haverá oportunidades para operar com margens melhores também em função de condições específicas de mercado, tirando proveito de condições que, em outros momentos, foram negativas para o segmento.
“Aacho que vamos ter um repique muito nervoso”, diz Labourt. Com o agricultor deixando muitas compras para frente, entre sementes de soja e defensivos, ele acredita que pode haver procura de última hora por variedades com oferta mais limitada ou até mesmo de herbicidas e inseticidas para combater pragas com incidência mais alta em função de um clima mais favorável.
Momentos como esse, lembra, permitem aos distribuidores obterem negociações mais positivas. “A gente está preparado para encarar essa segunda parte do ano, em que já estamos vendo uma retomada do mercado para fazer desse 2024 um ano muito satisfatório”, diz.
No segmento de sementes de soja, Martins afirma que a empresa praticamente já atingiu suas previsões e reforça que, com a produção afetada pelo excesso de umidade em algumas regiões, deve haver problemas de disponibilidade de variedades mais demandadas.
Com isso, diz, nas últimas semanas já se notou uma procura maior por variedades com preços mais atrativos, já fazendo com que as cotações se movam para cima. “É mais um sinal de que a safra realmente começou e de que o agricultor está se posicionando muito mais ativamente”, diz.
A busca por um parceiro disposto a adquirir uma parcela da unidade de sementes da companhia prossegue. Labourt afirma que espera ter novidades a respeito até o fim do ano, mas que o processo “está evoluindo dentro do previsto”.
Ao longo dos últimos meses, a empresa investiu no aumento da capacidade de armazenamento refrigerado, que saltou de 250 mil sacas de sementes de soja para algo próximo de 600 mil saca. “É um diferencial da AgroGalaxy, reconhecido pelo mercado”, diz o CEO.
“Vamos confirmar provavelmente nos próximos meses e trimestres que na unidade de sementes de soja nós estamos evoluindo muito positivamente e, sem dúvida, vai ser uma âncora da AgroGalaxy para poder vender o resto do portfólio”.