Na agricultura, desded 2017, o Patria Investimentos marcou uma posição. Somando cerca de 30 aquisições de redes regionais de revendas de insumos agrícolas e a formação de um braço industrial para a produção de defensivos, construiu uma das maiores empresas do segmento no País, a Lavoro.
Nos últimos anos, a receita tem sido repetida na pecuária, onde o Patria também já conseguiu demarcar seu território. Em mais uma de suas “teses” e investidas, fez uma série de M&As de lojas e fábricas de ração, que hoje formam a Axia Agro, já apontada como líder no varejo de produtos para o pecuarista.
A história começou em dezembro de 2021, quando a tese de revendas de insumos agropecuários (com foco na pecuária, especificamente) levou à aquisição da Agroline, empresa com forte atuação nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, e Goiás, além de Tocantins e Pará.
O negócio ficou mais encorpado em 2022, quando foi adquirida a Casa da Lavoura, que na época era a segunda maior revenda de insumos do Brasil, com atuação na região Norte, principalmente Rondônia, Amazonas e Acre.
“A nossa estratégia é adquirir plataformas regionais”, explicou Ary Rodrigues Junior, CEO da Axia Agro, em entrevista exclusiva ao AgFeed. “No caso da Agroline o foco era o Centro-Oeste e na Casa da Lavoura, a região Norte”.
O executivo contou que o plano de expansão dessas plataformas passa, agora, pela abertura de novas lojas e também está muito focado em explorar melhor a carteira de clientes. “Buscamos o cross sell, porque na nossa revenda, a ideia é se tornar um one-stop-shop para o pecuarista”, disse ele.
Ele diz que vende nutrição, insumos para pastagens, produtos para sanidade, tudo para o mesmo cliente, por isso é “uma oportunidade muito grande”.
“Nossa ideia é crescer através não só de fusões e aquisições, expansão de lojas regionalmente, mas também explorar melhor o share of wallet, a carteira dos clientes, através da positivação das categorias que nós atuamos”, reforçou.
É, na visão de Rodrigues, um negócio semelhante a Lavoro, que também tem o Patria como sócio e ações listadas em Nova York.
“Muitos dos nossos clientes atuam hoje em dia com integração da lavoura e pecuária. Por isso, também vendemos insumos para a agricultura, mas num volume e ticket bem menor do que os negócios da Lavoro, que são focados em agricultura”, explicou o CEO.
Ao mapear o segmento da pecuária, o grupo identificou que o maior gasto do pecuarista era com nutrição, cerca de 80% do custo, segundo Rodrigues.
Por isso a aquisição mais recente da Axia Agro, no final de 2022, foi a Supremax, que tinha duas fábricas de ração, uma em Ariquemes, em Rondônia, e outra em Tangará da Serra, Mato Grosso.
“Vimos que uma das nossas alavancas seria exatamente conseguir capturar esse mercado, principalmente de nutrição, que é um potencial e que está ligado diretamente à tecnificação” disse.
A crença é que, assim como na agricultura, ao longo do tempo a pecuária seguirá avançando em ganhos de produtividade e não em área, nem tamanho do rebanho. O segmento ainda é considerado bem menos tecnificado que a agricultura, lembrou o CEO da Axia, especialmente se comparado com outros países, como os Estados Unidos.
“Converter pasto degradado em agricultura é uma tendência, só que a ideia é que o consumo de proteína animal continue crescendo mundialmente. Por isso queremos apoiar essa tecnificação, aumentando a produção de carne, mas reduzindo o rebanho, exatamente o que vê nos Estados Unidos”, explicou.
Na área de nutrição, a Axia Agro buscou comprar plantas que estivessem próximas de seus clientes. Rodrigues diz que neste segmento, para ser competitivo, é preciso ter sua própria planta fabril.
Ele admite que a empresa seguirá considerando, eventualmente, novas aquisições de outras indústrias de ração regionais ou mesmo arrendamentos, mas sempre com foco na presença regional.
“É diferente da área de sanidade, por exemplo, onde você pode enviar o medicamento veterinário de São Paulo para Rondônia. No caso de nutrição, você precisa estar próximo ao teu cliente pelo fator transporte e frete”, diz ele.
Desafio da agropecuária
Assim como para as demais empresas do setor, na Axia Agro a prioridade tem sido lidar com “o atual desafio da agropecuária”, em meio a preços mais baixos de commodities e valores também bem mais baixos na arroba do boi, o que inibe o investimento por parte do pecuarista.
“Estamos aproveitando pra fazer todos os ajustes esse ano, em termos de margem, competitividade, lucratividade, pra começar o ano que vem preparados para retomar o crescimento acelerado, que é a nossa tese”, afirmou Rodrigues, lembrando que em 2025 espera uma retomada do mercado, com queda dos abates de fêmeas e o retorno da arroba, “que hoje está num patamar muito desfavorável”.
O CEO da Axia diz que 2023 “foi o ano do vale do ciclo da pecuára”, por isso também muito desafiador para a empresa.
“Se você analisar historicamente, é onde você teve a maior queda da arroba, porque em 2022 ela atingiu um pico muito alto. Quem adquiriu o bezerro para engorda, para vender o boi gordo em 2023, praticamente não ganhou nada”, lembrou.
Neste cenário, a rentabilidade do pecuarista caiu e o investimento em insumos também. “Teve também outros fatores como queda no consumo de carnes e menor exportação para a China”.
Assim como nos insumos agrícolas, houve também um excesso de estoque nas indústrias. E o preço de produtos vendidos caiu, como na ração, com o milho valendo menos.
Apesar das dificuldades, Rodrigues garante que não houve queda no volume de vendas, já que foram abertas novas lojas, que acabaram compensando a menor comercialização de unidades que já estavam atuando no ano anterior.
O faturamento da Axia Agro em 2023 chegou a R$ 1,1 bilhão e conta atualmente com 60 lojas. Somente no ano passado foram abertas 20 novas lojas. São 1,4 mil funcionárias, com 700 pessoas na equipe de vendas.
“Quando se fala de lojas maduras, a queda ficou em torno de 25%, mas foi compensada pelas lojas novas, temos muitas ainda rampando”, afirmou o CEO. Ele diz que o mercado, como um todo, teve uma retração de 30%, em função da menor demanda e da queda dos preços, principalmente em ração e fertilizantes.
Com a baixa rentabilidade na pecuária e aumento da recuperações judiciais no agronegócio, outro efeito negativo para a Axia Agro foi o aumento da inadimplência, que era de 1% e chegou próximo de 4% agora.
“A RJ na pecuária não está nem de longe nos mesmos níveis do mercado agrícola, mas a inadimplência cresceu muito”, disse Rodrigues.
Neste cenário, o executivo diz que o pecuarista buscou mais parceiros para financiamento e assim fazer girar o estoque. “Isso nos demandou uma gestão de caixa muito mais criteriosa”.
Rodrigues diz que “a boa notícia” é que toda a cadeia está sensibilizada em relação ao problema, não apenas a revenda, mas também a indústria. Com isso houve uma maior disposição das empresas em facilitar os financiamentos.
Expectativa de retomada
Nos primeiros cinco meses de 2024, segundo o CEO da Axia, o mercado “está andando de lado”, já que o volume de abate de fêmeas ainda foi significativo neste período, mantendo o preço da arroba da boi.
“Mas quando você considera Rondônia, que é uma grande fatia do nosso negócio hoje, o deságio é maior. Enquanto você tem uma arroba de R$ 220 (em São Paulo, por exemplo), em Rondônia fica em R$ 180, o que deixa a situação do pecuarista ainda mais desafiadora”, ponderou.
Ainda assim, a expectativa é de retomada, segundo Rodrigues. Ele diz que já está havendo crescimento no tratamento de pastagens, além de ter registrado um aumento, em volume, de 30% no segmento de nutrição em 2023. Mas com os preços mais baixos, ele diz que em receita o resultado “ficou flat”, mesmo neste segmento.
“Esse ano nós continuamos crescendo o volume com relação a 2023, que já foi recorde em cima do ano anterior, mas com essa continuidade da queda do preço do grão, o faturamento nosso está bastante linear”, acrescentou.
Ary Rodrigues, que é formado em administração de empresas, mas atuou por duas décadas em multinacionais da indústria veterinária, diz que a mudança do ciclo da pecuária pode já começar a ocorrer ainda este ano.
“Como bateu todos os recordes históricos de abate de fêmeas, agora estamos começando a ver uma tendência de redução para o segundo semestre”.
A partir disso, lembrou, começa a haver uma queda na oferta de carne, na oferta de anmais, e poderá ter início o período de melhora no preço da arroba.
“Nós acreditamos que essa arroba vai melhorar no ano de 2024 ainda. O ciclo vai começar a se reverter no início de 2025. Existem algumas previsões que falam que o bezerro, que hoje está em torno de R$2.000, possa chegar a R $4.000, em 2026, que vai ser o pico do próximo ciclo”, avaliou.
Aquisições em 2025
A Axia Agro deixa claro que novas aquisições estão descartadas em 2024, considerando o atual cenário de mercado, propício para que a empresa ficar mais “estruturada”, para quando vier a retomada.
A empresa diz estar investindo em tecnologias de CRM, controle de estoques e do negócios de seus clientes, para melhor acompanhar a utilização dos insumos.
“Nós já tínhamos um projeto de transformação, uma das nossas alavancas é a excelência comercial”, explicou Ary Rodrigues. Estão no foco o relacionamento com os fornecedores, melhorar a parte operacional, incluindo logística e distribuição, além de investir mais no pilar digital.
Nesse tema, Rodrigues conta que a empresa criou uma plataforma digital que está sendo amplamente usada, por enquanto, pelo time de vendas. Posteriormente, poderá ser preparada para que o próprio pecuarista possa acessar o aplicativo.
Na plataforma há protocolos de engorda, para identificar o perfil do pecuarista, se é de leite, ou de corte, e qual o nível de tecnificação. Dessa forma, há uma venda consultiva, para, por exemplo, ajudar o produtor a reduzir o período de abate e girar mais rápido o rebanho.
A estratégia digital inclui também parcerias com startups, que oferecem outras soluções, como rastreamento.
“Nós sabemos que é um mercado extremamente carente de digitalização e, com a tecnificação, você vai precisar de um acompanhamento digital das informações, você vai precisar de inteligência artificial. Desde o início, já contratamos um CDO, (Chief Digital Officer), para exatamente liderar esse trabalho”, contou Rodrigues.
Ele relata ainda que faz parte da estratégia avançar no e-commerce já que a Agroline pode ser considerada a maior neste tipo de serviço digital, porém o volume de vendas via plataforma ainda é pequeno.
Enquanto não faz aquisições, mais duas tarefas estão no radar. Uma delas é seguir ampliando a atuação das 20 lojas abertas no ano passado. A outra é identificar oportunidades para o que o CEO chamou de “parcerias na área de nutrição”, principalmente na área fabril, perto de lojas que a Axia já tem.
Como as fábricas de ração da Axia só existem hoje em Mato Grosso e Rondônia, ficaria mais difícil ser competitivo em outras regiões onde há lojas, como em Tocantins e no Pará, por exemplo. É um gap que poderá ser suprido por essas parcerias com produtores de ração.
“Tem muita oportunidade de aumentar as categorias vendidas para os clientes nestas duas regiões, esse vai ser o foco em 2024”, disse. Ainda assim, é possível que novas lojas sejam abertas este ano, segundo a empresa, que não revela onde nem quantas seriam.
“A partir de 2025, nós retomamos o projeto de aquisições também como plataformas regionais, para ter uma cobertura nacional”, admitiu o CEO.
Chance de IPO?
Como sua “par” agrícola Lavoro hoje já tem capital aberto na Nasdaq, o AgFeed perguntou ao CEO da Axia Agro se esse também poderia ser o caminho para a rede de revendas da pecuária.
“A estratégia é sempre analisar a atratividade do mercado, desenvolver as alavancas e começar as aquisições. Só lá na frente você tem a etapa de saída”, disse Ary Rodrigues, se referindo ao processo conhecido de fundos como o Pátria que apostam em determinados setores e empresas.
“Uma das alternativas (de saída) sempre vai ser o IPO. Mas isso não é para agora, isso é bem mais para frente”, admitiu o executivo.
Ele garantiu que nada está definido em relação a este assunto e que tudo vai depender de como vai se comportar o mercado e quais serão as melhores alternativas no futuro.
Na opinião de Rodrigues, nem mesmo o mercado americano estaria descartado nestas opções, lembrando que a pecuária hoje tem entre 20% e 25% da produção destinada à exportação.
“Isso tende a crescer. Esse ano estamos com recordes de exportação. Então esse mercado já tem uma relevância em nível mundial. Hoje, o Brasil é o maior exportador de carne do planeta”, lembrou.