À primeira vista, a agtech Sette pode parecer um fenômeno das redes sociais. Com um dia de vida, sua página no LinkedIn apresentava ontem mais de 9 mil seguidores. No Instagram, 2,6 mil.
Os números, entretanto, são resultado de uma soma. “A gente está consolidando as redes sociais”, explica ao AgFeed Mariana Bonora, agora sócia da Sette, mas que antes assinava como fundadora e CEO da startup Bart Digital. “É uma imprecisão que a gente vai corrigir”, completa Rafael Coelho, outro sócio da nova empresa, agora ex-CEO da A de Agro.
A presença digital reflete as redes ora de uma empresa, ora de outra, que foram ajustadas para nesta quarta-feira, 5 de junho, já exibirem a marca que resulta da fusão entre duas startups já com trajetórias reconhecidas no ecossistema agtech brasileiro.
Com negócios de certa forma complementares, Bart Digital – que atua na formalização de títulos e garantias agrícolas – e A de Agro – especializada no uso de inteligência artificial para monitoramento e análise de risco de propriedades rurais –, anunciaram que a partir de agora são uma única companhia.
Com mais musculatura para encarar o cada vez mais disputado universo das agfintechs, que usam a tecnologia para modernizar e conquistar espaço no mercado das finanças do agronegócio, elas afirmam que, juntas, somarão R$ 27 bilhões em títulos e garantias agrícolas movimentados, com atuação em mais de 1.200 cidades de 20 estados brasileiros.
“O mais legal é que a empresa nasceu ontem, mas já nasce com pelo menos 400 clientes atendidos atualmente”, diz Mariana.
Comercialmente, as duas empresas hoje unidas já atuavam como parceiras há cerca de dois anos, fazendo a distribuição cruzada de produtos.
A relação entre os sócios foi iniciada há mais tempo, com a apresentação feita por Francisco Jardim, sócio da SP Ventures, gestora de venture capital que é investidora comum às duas startups originais e que agora passa a ter uma participação na Sette.
“A única coisa que o Chico fez foi apresentar a gente, lá em 2017”, conta a empreendedora. “Depois disso, a gente sempre conversou sobre a sinergia entre as empresas, os produtos, os times”, acrescenta Coelho.
No final do ano passado, a conversa ganhou corpo com uma avaliação de que os negócios conjuntos vinham tendo resultados positivos e avançou para uma fusão efetiva.
“Era uma decisão que estava sendo ensaiada há algum tempo. Todo mundo pergunta como que aconteceu, qual foi a assessoria de M&A, mas não teve, foi super orgânico. A gente começou a trabalhar junto, deu super certo e vimos que o objetivo no longo prazo era o mesmo e a gente ia conseguir chegar lá muito mais rápido”, relata Mariana.
Os dois compartilham também a visão de que o mercado em que atuam deve atravessar um processo de consolidação e amadurecimento, que deve acelerar nos próximos anos, embora garantam que tanto Bart quanto A de Agro, isoladamente, já tinham negócios consolidados, com portfólios de clientes estabelecidos.
As duas empresas que formaram a Sette estão, de fato, entre as “veteranas” do jovem mercado de agfintechs e souberam se adaptar para enfrentar os períodos mais difíceis atravessados por startups, em busca, simultaneamente, de aportes e receitas enquanto validam seus modelos de negócios.
Coelho e Mariana seguiram caminhos paralelos e conseguiram criar produtos com soluções que interessaram ao mercado e a investidores. No cap table da Bart, por exemplo, figuram, além da SP Ventures, gestoras como a Bossa Nova Investimentos e a E3 Negócios, além de José Luiz Rodrigues, da JL Rodrigues Consultoria.
Já a A de Agro recebeu cheques de grupos como BTG Pactual, Suno Investimentos, Banco Alfa, DXA Invest e FitPart, gestora do family office de ex-sócios do Banco Garantia e que controlam o Grupo Santa Colomba, além de aportes individuais de nomes como Victor Knewitz, fundador da Zenvia, Celso Fugolin, CEO da Petrovina Sementes, Nuno Verças, ex-CEO do banco BNP Paribas, Ricardo Madureira, CEO da Orfeu Cafés.
“A gente tem uma participação muito relevante dessas pessoas, tem gente que tem uma ação e que participa como se tivesse mil ações num nível muito bom” diz Rafael Coelho.
Gestão em dupla
Mesmo com tantos investidores, Coelho afirma que os dois sócios executivos da Sette – ele e Mariana – mantêm juntos uma fatia superior a 50% de participação no negócio. Eles preferiram não abrir números nesse sentido, mas disseram que vão compartilhar a gestão da nova companhia.
“A gente discutiu bastante isso e não vai ter uma figura de co-CEO”, explica Mariana. Assim, ela cuidará mais da gestão operacional, olhando para dentro da empresa, relacionamento com clientes e mercado, enquanto o sócio ficará mais focado, no curto prazo, na relação com investidores e na captação de recursos, além da gestão estratégica.
Em um primeiro momento, a estratégia comercial da Sette será permitir que os clientes tenham acesso a todo o portfólio integrado das duas empresas originais. “O objetivo de curto prazo é explorar as sinergias e a demanda que já temos mapeada dos clientes”, diz Mariana.
Mas ela conta que já há o embrião de construção de produtos em conjunto, alguns deles já em primeira fase de desenvolvimento, para lançamento no futuro. “Eles terão uma pegada de infraestrutura tecnológica para processamento de dados do agronegócio, em que vamos trazer um conceito super novo, sem precedentes no mercado brasileiro”, diz.
A Bart, afirma, tem um volume muito grande de operações relacionadas à busca de dados sobre CPF e CNPJs e movimenta muitos documentos de forma digital, com participação relevante, por exemplo, na formalização de CPRs no Brasil.
A A de Agro, por outro lado, atua há muitos anos no processamento de dados territoriais, coletando dados de propriedades rurais utilizados em análises de crédito e socioambientais.
“Colocando isso tudo junto, a gente tem aqui uma base super poderosa de dados para trabalhar e é isso que a gente estará explorando nos próximos meses”, diz Coelho.
A intensificação das discussões em torno da fusão, no fim do ano passado, colocou um freio em outras conversas, essas com investidores em busca de novos aportes. Tanto A de Agro quanto Bart Digital mantinham movimentos para novas captações, que foram, no entanto, suspensos temporariamente.
“A gente ‘estopou’ essas conversas para apresentar já a empresa em conjunto e agora estamos retomando”, conta Mariana. Apenas uma dessas negociações, que estava mais avançada, evoluiu e deve resultar em um reforço de R$ 10 milhões no caixa da Sette.
Segundo Rafael Coelho, trata-se de uma espécie de expansão da rodada de série A, que resultou na captação de R$ 20 milhões. Dos novos recursos, 30% foram provenientes dos atuais investidores e já entraram na conta da empresa. Os outros R$ 7 milhões devem ser confirmados nos próximos três meses.
“A fusão vai abrir um espaço maior para irmos em direção a uma rodada de Serie B, mas não no curto prazo. Não queremos fazer isso rápido”, afirma. Quando esse momento chegar, a intenção deverá ser captar entre R$ 20 milhões e R$ 30 milhões.
Não há pressa, mas as novas conversas começaram já nesta primeira semana de vida nova. “Tivemos ontem a primeira reunião com um fundo, já como Sette, e hoje a gente tem mais uma”, ele revela.
“A gente vai começar agora a criar aquele famoso namoro com os fundos, mas nosso objetivo é antes chegar ao breakeven, para chegar no Series B com bastante relevância e valor de mercado”.
Com os recursos que entram esse ano e as sinergias da fusão, os sócios esperam atingir o equilíbrio das contas na Sette até o fim deste ano. “A gente já teve vários meses de lucratividade, tanto na A de Agro como na Bart. A soma das duas empresas deixa a gente bastante favorável em tudo isso”.